Principal ligação da Região Metropolitana e da Serra com o porto de Rio Grande, o trecho sul da BR-116, de Guaíba a Pelotas, deveria ser um aliado para o comércio exterior. Mas, sobrecarregada, a rodovia cumpre apenas em parte o seu papel. Sem conseguir dar conta do fluxo de caminhões, deixa o transporte de mercadorias mais lento, tira competitividade da produção gaúcha e gera perdas bilionárias.
Iniciada em 2012, a duplicação da rodovia está orçada em R$ 1,936 bilhão. Ao longo dos 234,9 quilômetros do trecho, que está com obras praticamente estagnadas desde o ano passado e sem previsão de conclusão, circula parte da safra de grãos, além de produtos do polo industrial da Serra, como móveis, autopeças e madeira. Levantamento do Terminal de Contêineres (Tecon), empresa que movimenta 98% da carga no porto de Rio Grande, aponta que três em cada quatro contêineres que chegam ou saem do embarcadouro trafegam pela BR-116 – circulação equivalente a 1.125 caminhões por dia.
– Se olharmos o mapa do Rio Grande do Sul, toda a carga de contêineres está no Norte e no Nordeste. De Santa Cruz do Sul, por exemplo, pode-se utilizar a Estrada da Produção (a BR-386) para chegar ao porto, mas de Caxias do Sul, inevitavelmente, tem de se descer pela BR-116. Uma estrada nessas condições é um desrespeito ao exportador, que é quem paga a conta – diz o diretor-presidente da Tecon Rio Grande, Paulo Bertinetti.
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Estimativa do movimento Agenda 2020 aponta perda de R$ 1,85 milhão por dia para a economia gaúcha. Em um ano, equivaleria a R$ 675,25 milhões. E em dois anos e 11 meses, seria o investimento para duplicar a via.
– Esta obra está atrasada 23 anos. As condições de uma rodovia desse porte afetam os 497 municípios e toda a economia. Trata-se de uma obra de Estado, e não de uma microrregião – defende o coordenador do Fórum de Infraestrutura da Agenda 2020, Paulo Menzel.
Para evitar as filas de caminhões típicas de rodovias de pista simples, empresas têm buscado alternativas. Uma teve início em outubro do ano passado, quando começou a operar um serviço de balsa entre o polo petroquímico de Triunfo, na Região Carbonífera, e o porto de Rio Grande.
– A BR-116 é vital para o Estado, para a produção, para a economia e para gerar mais impostos para o governo. De que adianta ter um porto e não ter uma boa estrada para escoar a produção? – questiona o presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas e Logística no Estado do Rio Grande do Sul (Setcergs), Afrânio Rogério Kieling.
De Caxias do Sul, a Randon sofre os efeitos da BR-116 nos dois sentidos – nos componentes importados, que chegam à Serra via porto, e nos produtos exportados pelo terminal.
– Se a estrada estivesse duplicada, provavelmente haveria menos acidentes e condições melhores para transitar em velocidade maior, chegando antes no destino final e dando condição melhor de eficiência de transporte – diz o diretor-presidente da empresa, David Randon.
Situação similar para a Multimóveis, de Bento Gonçalves que escoa cerca de 90% de suas exportações, a grande maioria para a América do Sul, pelo porto de Rio Grande.
– Sem a duplicação, os custos acabam encarecendo em razão do tempo de transporte que impacta a competitividade do produto – afirma Maristela Cusin Longhi, sócia-diretora da Multimóveis.
No sentido oposto, os entraves são semelhantes. Produtores e empresas da Zona Sul enfrentam dificuldades para enviar os produtos para as demais regiões do país. A indústria de alimentos Josapar, com sede em Pelotas, carrega em torno de 9 mil toneladas por mês via BR-116 para distribuição às regiões Sul, Sudeste e Norte do país – o que representa 40% de sua produção total. O maior prejuízo, segundo o gerente de logística, Roberto Vargas, está no encarecimento do frete:
– Onde há uma pista simples, com bloqueios, dificuldades de ultrapassagem e alto consumo de combustíveis, o preço do frete aumenta muito. Por isso, temos um transporte caro e baixa oferta, e isso faz com que, para várias regiões que distribuíamos via meio rodoviário, vamos migrando cada vez mais para a cabotagem e usando a saída para Rio Grande. Há três anos, toda a distribuição para o Rio de Janeiro era rodoviária. Hoje, é toda marítima.