A vereadora Iasmin Roloff Rutz (PT), de Canguçu, na região sul do Estado, foi alvo de comentários constrangedores no plenário ao ser eleita para compor a nova diretoria da Câmara Municipal. Três parlamentares votaram na jovem de 24 anos com a justificativa de "embelezar a mesa". A sessão ocorreu na última quarta-feira (22) e contou com a presença dos 15 vereadores da casa – Iasmin é a única mulher entre os parlamentares.
– Na hora, fiquei muito abalada. No momento que votaram em mim pela aparência, tornaram invisível o trabalho que fiz em um ano de mandato – desabafa Iasmin, que é agricultora e a primeira da família a ingressar na política. – Precisamos mostrar que isso não é certo, nós mulheres estamos aqui para trabalhar e para mostrar o nosso potencial. Não para sermos comparadas, colocadas numa questão de competitividade pela beleza. É uma falta de respeito não só comigo, mas com as mulheres no geral. Não fui eleita pela minha aparência, mas pela capacidade, pelo o que eu acredito, o que as pessoas pensam a meu respeito.
Na última sessão ordinária do ano, estava prevista a votação da nova mesa diretora, e Iasmin concorria à presidência da Câmara. Já no início dos votos, o vereador Francisco Romeu da Silva Vilela (PP) diz "nós votamos em dama, a vereadora Iasmim", anunciando a escolha de sua bancada – ao fundo, é possível ouvir outro homem dizendo "vamos embelezar essa mesa". Depois, Arion Braga (PP) vota também na "vereadora Iasmim, para embelezar essa mesa aí e ter um 'tchan' feminino, tem todo o nosso apoio".
A votação segue, e Iasmin perde a eleição para o candidato Marcelo Maron (PTB). Mas a parlamentar acaba sendo escolhida para um cargo ao qual não se candidatou: a maioria da base governista decide votar na vereadora para ser a segunda vice-presidente sob o pretexto de "ter mais mulheres" na mesa, segundo o atual presidente, o vereador Leandro Ehlert (MDB). Na sequência, Oraci Teixeira (PSB) reforça seu voto para "embelezar a mesa", assim como Silvio Neutzling (MDB).
Iasmin se mostra desconfortável com a situação e pede a palavra para solicitar que os votos sejam pela "capacidade intelectual e não pela beleza". A partir daí, há uma longa discussão entre os vereadores, já que Iasmin não havia aceitado previamente a concorrer ao cargo de segunda vice.
– Vi essa justificativa de "ter mais mulheres na mesa" como uma forma chula de sair de bonzinho da situação. Se fosse a questão de ter representatividade, teriam votado em mim para o cargo que eu estava candidata, a presidência. Não foi nada acertado, nada combinado, me senti muito mal. Além de ser sozinha enquanto mulher, enquanto jovem, não me senti compreendida. Me elegeram para um cargo que eu não era candidata, nem eu votei em mim – explica a vereadora.
Iasmin conta que, desde que foi eleita no ano passado, cansou de ouvir piadinhas e apelidos machistas nos bastidores – ela é a quarta mulher da história da cidade a assumir o cargo, quebrando um jejum de quase duas décadas de representatividade feminina na Câmara. "Vereadorazinha", "a nossa guriazinha" e "lá vem a bonitinha" eram algumas expressões recorrentes ditas por colegas. No início do ano, Iasmin subiu na tribuna e avisou que se sentia desrespeitada:
– Deu uma cessada nos comentários, percebi uma conscientização. É meu primeiro ano de mandato e, por mais que tenha obstáculos, precisamos enxergar que as coisas positivas acontecem porque nós mulheres estamos ocupando esses espaços. Tivemos mais projetos de leis voltados para mulheres neste ano, o que não acontecia há tempos.
Procurado pela reportagem , o vereador Arion Braga (PP), que foi o primeiro a usar o termo "embelezar a mesa" no plenário, explicou que tem o "maior respeito e admiração" por Iasmin, embora classifique a repercussão do ocorrido como "promoção pessoal" e "vitimização".
– Tenho o maior respeito, e qualquer palavra que possa ter usado ou por algum colega eu não vejo como desrespeito, elogio ou como "deslumbrar" ela pela beleza ou questão física. Todo mundo, desde que estou lá, trata com respeito, e é assim que tem que ser, essa é a minha posição. Acho que isso está se tornando muito mais uma questão pessoal, de promoção, tanto por parte da imprensa quanto por parte dela. Acho que temos coisas muito mais importantes para mostrar aqui no nosso município – defendeu Braga.
O vereador Oraci Teixeira entrou em contato com a reportagem para esclarecer a sua versão sobre o episódio. O parlamentar reiterou que votou em Iasmin por sua "capacidade e competência", embora acredite que a vereadora esteja "querendo se promover":
– O meu voto foi por saber que ela tem responsabilidade para exercer a função. A vereadora Iasmin disse que não sabia da votação, mas ela sabia. Acho que foi um vereador que estava junto com ela na oposição que puxou isso aí (a expressão "embelezar a mesa"), acho que quem ela deveria criticar é ele. Falei pelo impulso desse outro vereador, que falou aquilo ali, sabendo que não ia ter voto para botá-la na mesa como presidente, e depois a gente usou o argumento dele. Não tenho nada contra a vereadora, inclusive é uma excelente pessoa, de família conhecida da gente. Não tenho nada a falar sobre isso, meu voto foi por ela ter capacidade e competência.
Quem é Iasmin Roloff Rutz
Com 928 votos, Iasmin foi eleita aos 23 anos para seu primeiro mandato na Câmara de Canguçu em 2020. A jovem é formada em Agroecologia e vem de uma família de agricultores – foi durante o curso que seu interesse pela política começou. Conversando com um grupo de amigos, tomou coragem para lançar sua candidatura com base em três pilares: defesa da agricultura familiar, promoção dos direitos das mulheres e valorização da juventude. Ela é a única mulher, a mais jovem vereadora em exercício e também a única representante do PT.
– Achei que não podia ficar de braços cruzados. Venho de uma família que já passou por muita coisa, somos muito unidos e isso me dá a base para suportar tudo isso que estou vivendo. Não esperava nada de ninguém, me joguei mesmo, de cabeça na política – diz a vereadora.