Uma base pensada para a pele negra. O turbante que revela sua identidade. Ou um vestido que comunica um pouco de sua história. Na moda ou na beleza, mulheres transformam roupas, acessórios e itens de maquiagem em instrumentos para falar sobre suas origens. Na semana da Consciência Negra, Donna conta a história de cinco estilistas e empresárias que celebram a cultura afro em suas criações.
Clau Stampas
Historiadora de formação, Claudia Campos sempre quis compartilhar a cultura afrobrasileira com seus alunos. Por 13 anos, fez isso em sala de aula, mas as dificuldades do mercado a desestimularam. Decidida a mudar de carreira, ela começou a cursar Design de Moda. Foi na universidade que se apaixonou pelo design de superfícies e surgiu a ideia: por que não criar suas próprias estampas?
Primeiro, vieram os turbantes. Depois, as saias godês e evasês ganharam a etiqueta Clau Stampas. Logo, a designer passou a vender suas criações em feiras, como o Brick de Desapegos, na Capital.
Todo o processo de confecção passa pelas mãos dela: do desenho da estampa à modelagem. Hoje, Claudia conta também com o auxílio de cooperativas de costura locais, por conta do aumento da demanda. Tudo, claro, preservando seu propósito:
– Conto uma história através das minhas estampas, a partir de temas da cultura afrobrasileira. É um processo bem autoral – explica.
No ano passado, a marca ganhou uma loja física: os clientes podem conhecer as novidades da Clau Stampas no Coletivo Casa de Joana, no Centro Histórico. Por lá, empreendedores negros de diferentes ramos dividem o mesmo espaço colaborativo.
– Mais do que uma loja, é uma experiência de troca de conhecimento – conta.
A moda autoral de Claudia também tem no DNA a sustentabilidade: a marca investe em tecidos sustentáveis e no reaproveitamento de materiais. Também é possível fazer peças sob medida – a grade vai até o manequim 52.
Divas Bllack
Apaixonada pela área da beleza, Rosane de Castro Terragno, 46 anos, soube exatamente que negócio deveria abrir quando decidiu empreender: uma loja de maquiagem. Na hora de atender às clientes, fazia questão de testar os produtos em cada uma, do batom ao pó. Foi então que percebeu: era frequente que mulheres negras não encontrassem uma base adequada ao seu tom de pele:
– Fazia questão de dizer: “Vou achar uma base do teu tom”.
Foi então que veio o estalo: e se ela criasse a sua própria marca? Inspirada em grifes estrangeiras, que nasceram com foco na pele negra, Rosane lançou a Divas Bllack. Foram quase dois anos de pesquisa, testes em laboratório e consultorias para chegar ao resultado que sempre sonhou. Hoje, a grife idealizada pela empresária conta com seis tons de base (incluindo opções para as peles mais retintas), além de 25 pigmentos, paleta de sombras, iluminador, pó e batons. E já conquistou adeptas como as atrizes Taís Araujo e Jeniffer Nascimento.
Mas Rosane quer mais. Depois de criar seu e-commerce e nacionalizar a marca, que tem centro de distribuição em São Paulo, ela planeja lançar uma linha de skincare que atenda às necessidades específicas da pele negra.
Roci Moda & Acessórios
Não é à toa que a marca de Rocilene Ferreira de Aquino leva seu apelido. Criada em 2016, a Roci Moda & Acessórios retrata a busca da empresária pela própria identidade – que, hoje, é traduzida também no vestir.
Desde a infância, Rocilene, hoje com 44 anos, vivia um dilema com o próprio cabelo – história que se repete com muitas mulheres negras:
– Passava pente quente, henê. Era refém da química e, depois, do megahair – recorda.
Seu processo de aceitação teve a influência direta de outras crespas e cacheadas que seguia nas redes sociais. Aos poucos, começou a ganhar coragem para usar brincos grandes, que ressaltassem o visual (agora) natural. Depois, vieram os turbantes. Tudo encomendado pela internet, porque, por aqui, conta Rocilene, não era fácil encontrar. Logo, seu estilo virou profissão: motivada pelos pedidos de conhecidas, que queriam comprar as mesmas peças que Roci usava, ela passou a revender os itens que garimpava por aí.
Hoje, a loja de Rocilene é uma “representação afro”: na marca, ela reúne peças de estilistas negros do país e também cria os próprios modelos.
– Minha roupa fala sobre minha origem. Estou afirmando para o mundo a minha identidade. Roupa é um ato político. É um resgate da nossa ancestralidade. É isso que busco quando encontro uma nova marca para representar – explica.
Dandara Moda e Arte
Desenhar sempre foi o hobby de Dandara da Cruz Ennes. Por isso, quando ela enfrentou dificuldades para arrumar emprego após a formatura em Administração não restaram dúvidas: era hora de apostar em seu talento no traço para empreender. Em 2015, a jovem lançou a Dandara Moda e Arte, marca que começou focada em camisetas artesanais e, hoje, agrega também a produção de acessórios em MDF e feitos a partir de retalhos de tecido e papelão.
– Gosto de desenhar personagens negros, também me inspiro nas religiões de matriz africana. É muito legal ver as crianças comentando que os desenhos se parecem com elas. Quero gerar representatividade e autoestima – explica Dandara, hoje com 30 anos.
As primeiras quatro peças que ela produziu fizeram sucesso nas redes sociais. Tanto é que uma mulher desconhecida convidou Dandara para participar de uma feira em Caxias do Sul e expor seu trabalho. Esse retorno positivo foi decisivo para a empreendedora de Gravataí seguir firme com a marca, assim como o apoio dos pais, Margô e Adriano. A mãe tem um ateliê de costura especializado em roupas para religião afro, e o pai sempre teve participação ativa no movimento negro.
Com a suspensão de eventos em razão da pandemia, Dandara passou a vender apenas pela internet nos últimos meses. Ela também atende com hora marcada no ateliê em sua casa.
•@dandaramodaearte
• Ateliê em Gravataí, atendimento com hora marcada (51) 98560-0899
Desvendando Estilos
Para a professora Lisiane Niedsberg, a Desvendando Estilos não é apenas uma grife: é um projeto que une educação e moda. A marca é comandada pela docente de 39 anos e conhecida por investir em tecidos de origem africana, com cortes e estampas que enchem os olhos.
– Toda vez que meus alunos têm contato com os tecidos, eles querem saber mais, é a história do povo negro que está ali. Se torna uma forma de pensar a representatividade – avalia Lisiane.
O nome da marca lançada em 2018 não é por acaso. Faz referência ao projeto Desvendando, realizado de forma independente pela professora com crianças da rede pública há sete anos. O foco é incentivar a leitura, a educação para a diversidade e reforçar uma visão de mundo antirracista. Já a grife nasceu como um dos caminhos para custear o projeto social, complementar a renda e ser um espaço para a professora investir na paixão pela moda. E a marca tem um quê carioca: nasceu, de fato, enquanto a docente morava no Rio de Janeiro.
– Lá o tecido africano é mais barato. Comecei a produzir umas peças para mim, e as pessoas gostaram. Daí, foi indo – explica Lisiane, que voltou a morar no Estado no ano passado.
A venda das peças ocorrem online, em feiras e eventos. Devido à pandemia, Lisiane retomou a produção apenas em setembro, mas já está comercializando normalmente.
• @desvendando.estilos
• (051) 99463-5709