Quando eu era jovem, bem jovem, escrevia em qualquer lugar. Era uma chama constante, uma urgência, quase que um chamado; toda vez que vinha uma ideia eu não hesitava em sentar onde quer que estivesse e sacar um dos meus caderninhos, sempre comigo, os meus caderninhos que hoje vivem guardados nas gavetas da sala. Escrevia sentada no meio fio, nos bares (muito nos bares), nas festas, na chuva, onde quer que fosse. Escrevia horrores e depois passava a limpo no meu computador velho. Assim escrevi meus primeiros livros. Era a única coisa que importava.
Corta pra hoje, 15, 20 anos depois. Escritora, sete livros, dois no forno, antes dos 40 direi: “Já tenho mais de 10 livros publicados” e suspirarei (já suspiro) sentindo saudades de quando era jovem e cheia de gana, pois hoje o barulho da rua me incomoda, pessoas falando tiram meu foco, música me atrapalha, qualquer coisa é distração. O telefone, o gato, o cachorro, o Facebook, eu mesma, a louça, as contas, o buço, as unhas, aquele livro, a vida.
A vida que eu sempre quis é a que eu tenho. Em casa há um escritório, na estante tenho os livros, no quarto tenho uma cama confortável e no meu peito carrego uma crise. Era isso que eu queria, agora já não sei mais. Era isso que eu queria? A vida está confortável, e a inquietação dança no meu peito. Eu também quero dançar, penso enquanto lembro da minha barra de pole dance na sala. Minha paixão virou trabalho e deixou de ser paixão por hora.
Encontrei outra paixão. Não que escrever tenha perdido o sentido, mas os prazos fazem com que a gana fique um tanto carcomida. Ora, me estapeio, sou uma privilegiada, vivo do que gosto, do que sempre quis, enquanto minha cabeça dói e me sinto capinando num campo árido tentando encontrar um broto de vontade de seguir como está, como estou, como estamos. Comento com amigos, comento com família, todos já passaram por isso. Sinto alívio momentâneo. O aperto volta, a mudez diante das páginas em branco segue. Meus primeiros bloqueios criativos chegaram e trouxeram reforços. Não sai. Minhas ideias estão enfezadas. Queria férias. Não tenho férias. Nunca tive férias, minha cabeça sempre esteve no modo registrar. Queria férias. Queria sumir. Não quero mais repetir as coisas que eu já disse, as coisas que precisam ser ditas, mas precisam ser ditas. Repito. Reviro os olhos. A alma revira junto.
Olho minha conta bancária. Vale a pena isso tudo? “É TPM”, tento me convencer. Pode ser. É a crise dos 40, pode ser. Tomara que seja os dois e que ambos passem logo.
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