Se a música é uma das grandes paixões do brasileiro, a novela não fica atrás. Quando os dois se unem, é inevitável que o resultado seja explosivo. De Lulu Santos a Papas da Língua, passando por Guilherme Arantes, Djavan e o gringo B.J. Thomas, não foram poucos os artistas que tiveram suas carreiras alavancadas substancialmente graças às tramas românticas e de mistério transmitidas pela Globo à noite.
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Autor do livro Teletema - A História da Música Popular Através da Teledramaturgia Brasileira, o paulista Guilherme Bryan diz que é "raro" um artista ou movimento musical que tenha alcançado sucesso nacional sem ser representado na trilha sonora de uma novela. Ele lembra que nos anos 1970 e 1980, quando a TV era o móvel mais importante de uma casa, ter seu nome na contracapa dos discos de trilha era quase um "passaporte para o sucesso":
- Imagina só: com uma música na novela, você conseguia tocar na casa de praticamente todos os brasileiros diariamente. Ainda hoje, a regra vale. As trilhas são fundamentais para que o artista aconteça, de fato, e tenha alcance nacional - diz Bryan, usando como exemplo a paraense Gaby Amarantos (que explodiu com Ex Mai Love, de Cheias de Charme) e Calcinha Preta (que emplacou Você Não Vale Nada em Caminho das Índias).
Artistas que hoje são lendas nacionais começaram suas carreiras com influência importantíssima das telenovelas. Lulu Santos e Djavan são os exemplos mais importantes (ou você sabia que Lulu começou sua carreira com o nome de Luiz Maurício, na trilha de Plumas & Paetês?), mas gente como Caetano Veloso e Gilberto Gil viu o número de shows e de fãs aumentar quando suas músicas - Sampa, do primeiro, foi trilha de Salário Mínimo (1978), da TV Tupi, e Realce, do segundo, tocou em Água Viva (1980), da Globo.
- Os anos 1970 e 1980 são o auge. Todos os grandes nomes da MPB, tanto os medalhões quanto os mais populares, tiveram muita música em novela. Isso era um passaporte para o sucesso - avalia Bryan.
Conheça a história de 10 artistas que começaram a fazer sucesso graças às novelas:
1. Já ouviu falar em Luiz Maurício?
Depois de tocar com Lobão e Ritchie na banda Vímana, o guitarrista Luiz Maurício se desentendeu com os companheiros, deixou o grupo e assumiu o posto de curador da gravadora Som Livre para trilhas de novela. Em 1980, sugeriu o sucesso Menino do Rio para a abertura de Água Viva. Pouco tempo depois, ainda como contratado da gravadora, conseguiu emplacar uma música própria no repertório de Plumas & Paetês: Melô do Amor. Luiz Maurício, anos depois, se lançaria na carreira solo com outro nome: Lulu Santos.
2. Ednardo e o seu pavão mysteriozo
Ninguém conhecia o cearense Ednardo até 1976, quando sua composição Pavão Mysteriozo entrou na trilha de Saramandaia, grande sucesso de audiência. A música havia sido gravada dois anos antes, mas chegado a poucas pessoas. Depois de emplacar na TV, Ednardo se viu alçado ao posto de estrela. Depois, passou.
3. A estreia de Guilherme Arantes
Um dos grandes cantores brasileiros do final dos anos 1970 e início dos 1980 estreou com trilha de novela. Em 1976, seu primeiro single, Meu Mundo e Nada Mais, tocou no sucesso Anjo Mau, e facilitou muito o começo de carreira do cantor. Até hoje, a música é um dos pontos altos do seu show.
4. O sucesso do gringo desconhecido
B.J. Thomas nunca foi um astro. Nos Estados Unidos, não chegou a fazer grande sucesso. Porém, no Brasil, entrava na casa dos telespectadores todos os dias com Rock and Roll Lullaby, que fazia parte da trilha internacional de Selva de Pedra (1972). Thomas acabou fazendo muito sucesso num país totalmente distante do seu, o que o levou a vir seguidamente ao Brasil fazer shows. Achou um mercado e acabou gravando até bossa nova.
5. Hermes Aquino, a nuvem e o sucesso passageiro
O rio-grandino Hermes Aquino é um dos maiores one hit wonders brasileiros. Com Nuvem Passageira, sucesso estrondoso de 1976, ele foi um dos artistas mais tocados no Brasil. O sucesso - que nunca avançou mais do que isso - se deu por conta de uma novela: O Casarão, da qual a música era trilha.
6. Rosana e a sorte das deusas
Uma música que virou chacota alguns anos depois e transformou sua intérprete em ícone trash só existe por causa das novelas. Amor e Poder, de Rosana, foi trilha da personagem Jocasta, em Mandala (1987), e acabou sendo um dos maiores sucessos daquele ano - levando Rosana ao posto de diva pop brasileira dos anos 1980. A música é uma versão de The Power of Love, da cantora americana Jennifer Rush, com letra de Cláudio Rabello. Rabello havia ido para a Grécia e se inspirou na mitologia do país para compor uma letra sobre a tal deusa. Deu sorte de a novela abordar um tema parecido e a trilha anterior não ter agradado o autor Dias Gomes - tudo se encaixou.
7. Djavan, o alagoano que surgiu em novelas
Se Djavan hoje é um dos maiores cantores do Brasil, muito ele deve à sua ida ao Rio de Janeiro. Na cidade carioca, conheceu João Mello, produtor da Som Livre, e começou a gravar músicas de compositores famosos para novelas da Globo. Foi o caso de Alegre Menina, de Jorge Amado e Dorival Caymmi, que entrou na trilha de Gabriela. A partir daí, todo mundo conhece a história.
8. Gaby Amarantos, o tecnobrega em rede nacional
Gaby Amarantos pode ser considerada a Ivete Sangalo do Pará. Mas o final "do Pará" só é verdadeiro até Ex Mai Love, trilha tecnobrega da novela Cheias de Charme (2012). Depois disso, a popstar que enchia shows em Belém virou gigante no Brasil inteiro e, hoje, já pode ser comparada à colega baiana.
9. Calcinha Preta e uma história parecida
Fenômeno parecido com o de Gaby Amarantos, a banda de forró Calcinha Preta sempre foi enorme no Sergipe, desde 1995, quando surgiram. Mas quando Você Não Vale Nada, Mas eu Gosto de Você virou tema de Norminha (Dira Paes) em Caminho das Índias (2009), os sergipanos viraram figurinha carimbada em prêmios de melhores do ano e em festivais por todo o Brasil.
10. Papas da Língua e o sucesso tardio
Praticamente todos os gaúchos já conheciam Eu Sei, sucesso do Papas da Língua, desde 2000, quando a música foi lançada. Só que, seis anos depois, a música acabou virando trilha de Páginas da Vida (2006) e virou um dos grandes sucessos daquele ano. A banda ganhou o Brasil, tocou em programas dominicais e passou a fazer shows por todo o país. O curioso é que a escolha pela música foi um acaso: o jornalista gaúcho Juarez Fonseca conta que Jayme Monjardim, diretor da trama, veio ao Rio Grande do Sul um pouco antes de começar a trabalhar na novela e ouviu a música. Gostou e resolveu incluí-la no repertório. Deu certo.