Chico Buarque não cantará mais os versos de Com Açúcar, Com Afeto. Uma das canções mais famosas do repertório do cantor e célebre na voz de Nara Leão, a música de 1967 tornou-se alvo de críticas, que consideram que ela retrata as mulheres de uma forma submissa.
A letra narra o drama de uma mulher que sofre com o comportamento boêmio e desrespeitoso do marido, mas, ainda que insatisfeita, acaba voltando aos braços dele ao fim de cada dia. "Quando a noite enfim lhe cansa / Você vem feito criança / Pra chorar o meu perdão, qual o quê / Diz pra eu não ficar sentida / Diz que vai mudar de vida / Pra agradar meu coração / E ao lhe ver assim cansado / Maltrapilho e maltratado / Como vou me aborrecer? / Qual o quê / Logo vou esquentar seu prato / Dou um beijo em seu retrato / E abro os meus braços pra você", diz um trecho.
A decisão de não mais cantar a canção polêmica foi revelada por Chico no terceiro episódio da série documental O Canto Livre de Nara Leão, do Globoplay. Na produção, o músico explica que a composição foi feita atendendo a pedidos de Nara, que estava em busca de uma canção "tipo Amélia", mas concorda que a letra está desatualizada.
— Ela me pediu a música, ela me encomendou essa música, ela falou: "Eu quero agora uma música de mulher sofredora". E deu exemplos de canções do Assis Valente, Ary Barroso, aqueles sambas da antiga, em que os maridos saíam para a gandaia e as mulheres ficavam em casa sofrendo, tipo Amélia, aquela coisa. Ela encomendou e eu fiz — disse Chico, comentando sobre as críticas à canção:
— As feministas têm razão, vou sempre dar razão às feministas, mas elas precisam compreender que naquela época não existia, não passava pela cabeça da gente que isso era uma opressão, que a mulher não precisa ser tratada assim. Elas têm razão. Eu não vou cantar Com Açúcar, Com Afeto mais e, se a Nara estivesse aqui, ela não cantaria, certamente.