Entre os Censos de 2010 e 2022, o Rio Grande do Sul passou de 721,9 mil para 1 milhão de casais que moram juntos e não têm filhos. Ou seja, o Estado registrou uma taxa de crescimento de 40,9% de lares com essa característica. Essa era a configuração de 23,89% (1.017.321) dos domicílios gaúchos em 2022.
O crescimento evidenciado pelos números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) também é percebido em círculos sociais. Conforme a empresária de Porto Alegre, Alexandra Zanela, 43 anos, o assunto sempre surge nas rodas de conversa de mulheres empreendedoras e o posicionamento delas tem mudado ao longo dos anos.
— Nesses últimos 10, 12 anos, eu tenho sentido uma mudança muito grande. Muitas mulheres me procuram para trocar ideia, para falar: “só agora eu estou admitindo, inclusive pra mim mesma, que eu não quero ter filhos”, que “eu vou priorizar minha carreira”, ou que “eu quero ter coisas diferentes”. Então, eu tenho sentido que as mulheres estão mais seguras para falar, para se posicionar — relata a diretora de relacionamento da Padrinho Conteúdo e Assessoria.
Ela e Sérgio Canarin, 44 anos, fazem parte dos 20,71% (115.691) dos lares da capital gaúcha de casais sem filhos. Eles estão juntos há 13 anos e a decisão de ter ou não filhos foi um assunto abordado desde o início do relacionamento deles. Conforme a empresária, ela já tinha essa certeza desde a adolescência e as conversas com o companheiro e a família dele foram tranquilas.
— Eles foram muito, muito, muito gentis e atenciosos comigo. E eu digo que eu sou uma privilegiada por conta disso nas duas famílias. Mas ainda é comum ouvir, não no meu núcleo mais próximo, mas de tias e conhecidos de que eu não gosto de crianças e às vezes me olham como uma irresponsável — conta Alexandra.
Para evitar comentários parecidos, ela utilizava o fato de ter endometriose, condição que dificulta a gravidez, como uma "bengala" para justificar a sua decisão. Com o passar dos anos e o aumento do debate sobre o tema na sociedade, Alexandra passou a se sentir mais confortável para assumir a sua decisão sem precisar usar a doença como uma justificativa.
De acordo com os dados apresentados pelo IBGE, apenas em três das 497 cidades do RS a porcentagem era menor do que 20%. Chuí, com 19,51% (466), Bagé, com 19,49% (8.835), e Alvorada, com 19,45% (13.392). Já a maior foi registrada em Barra do Rio Azul, onde 245 dos 620 lares, ou 39,52%, eram de casais sem filhos.
Cenário nacional
A forte presença de domicílios nessa composição não é novidade no Estado. No Censo 2010, o RS possuía a maior porcentagem, de 20,03% (721.908), entre os Estados brasileiros. Em 2022 passou a ocupar a segunda posição, sendo superado por Santa Catarina, por apenas 0,95 pontos percentuais. No Estado vizinho, 24,84% (697.396) dos lares são de casais sem filhos.
Outro dado que reforça que no RS a discussão de ter ou não filhos já existia há mais tempo são as taxas de crescimento registradas em cada Estado. Mesmo sendo o segundo com a maior porcentagem de lares com essa composição, se comparado com os outros, o Estado gaúcho não teve uma significativa taxa de crescimento, à frente apenas do Rio de Janeiro, que registrou 38,65%.
Em Roraima, por exemplo, a taxa foi de 90,44%, a maior do país. Os números demonstram que o Rio Grande do Sul já tinha uma forte presença de casais sem filhos, pois mesmo com a baixa taxa de crescimento, se manteve entre os Estados com as maiores porcentagens.