O Antonio Prata escreveu sobre seu sentimento ao ouvir, dentro de um avião, a aeromoça perguntar se havia um médico entre os passageiros. No fim, a emergência não era tanta, era só alguém passando mal, prontamente atendido e recuperado. Mas o Antonio ficou pensando: quando, numa situação parecida, ele ouviria uma aeromoça dizer "Atenção, senhores passageiros, caso haja um escritor a bordo, favor se apresentar a um dos nossos comissários"? Ele se apresentaria, resolveria o problema de uma hipotética senhora gorducha ansiosa com as sacudidas do avião, talvez contasse uma história ou duas para acalmá-la, e voltaria para seu assento, sob os olhares de admiração de todos. Como um médico.
*
Pois é, Antonio. Numa emergência, cronistas não servem para nada. Jamais ouviremos alguém dizer "Um cronista, pelo amor de Deus, um cronista!". Não temos remédios para os males do mundo, não salvamos vidas. Num naufrágio, pela ordem de importância, seríamos os últimos a sair ou afundaríamos junto com a banda. Quando nos olham com admiração, vai ver é comiseração, pela nossa insignificância.
– Há um escritor a bordo?
– Eu!
– O que o senhor escreve?
– Crônicas.
– Precisamos de um escritor de verdade!
*
Existem várias histórias sobre o mesmo tema.
Num teatro lotado, ouve-se uma voz de senhora.
– Há um médico na plateia?
– Eu – apresenta-se alguém.
E a senhora:
– Esta é a minha filha Sara, dezenove anos, cozinha bem...
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– Há um médico na plateia?
Silêncio.
– Há um enfermeiro na plateia?
Silêncio.
– Há um estudante de Medicina na plateia?
Silêncio.
– Há um charlatão na plateia?