É difícil apontar um setor econômico que não esteja sofrendo com a pandemia do novo coronavírus. No que diz respeito aos serviços domésticos, um dos efeitos mais prejudiciais foi o esvaziamento da renda: no país, 39% das diaristas foram dispensadas nas primeiras semanas da pandemia e não receberam pagamento, assim como 13% das empregadas mensalistas, segundo pesquisa do Instituto Locomotiva.
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A realidade vivida por grande parte da categoria hoje pode ser sentida pela diarista Adriana Moreira da Costa, de 44 anos. O caderno onde ela anota as despesas da casa revela uma crescente preocupação: como ela descreve, é menos dinheiro que entra, mas as contas a pagar continuam. Mãe de Julia, de nove anos, Adriana viu as faxinas uma vez fixas sumirem da agenda, o que tem refletido drasticamente no orçamento da família. Ela precisa comprar medicamentos contínuos para a filha que não consegue obter pelo SUS, além de sustentar as duas e pagar as contas ao fim de todo mês, como o aluguel.
Há cerca de dois anos, Adriana deixou o emprego fixo numa empresa para ser autônoma. A decisão veio em razão da dificuldade de pagar por um local onde pudesse deixar a filha no turno contrário da escola:
— Eu estava pagando para trabalhar — lembra.
Com a autonomia, vêm os desafios e a perda de garantia dos benefícios, mas a diarista seguiu depositando o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) por conta. Antes da pandemia, ela trabalhava na casa e no estabelecimento comercial de uma família. Com o fechamento das lojas em Caxias, decretado em 20 de março, Adriana se viu sem trabalho. Para segurar as pontas, realiza a troca diária de curativos de uma idosa, serviço que já prestava antes da pandemia. Teve acesso às duas parcelas do auxílio emergencial e a uma cesta básica distribuída na escola de Julia. Ainda assim, sem as faxinas, são R$ 200 que ela deixa de faturar por semana. Enquanto sofre com as contas, observa que o preço dos produtos têm aumentado:
— Tive que pedir para uma amiga me ajudar com a lista do mercado. Eu falei: "devolvo o dinheiro depois". Tu faz das tripas coração, porque é pela tua filha e tu tem que fazer.
Só em maio Adriana voltou a trabalhar, semanas após a reabertura do comércio, autorizada em 17 de abril. A faxina, no entanto, foi contratada apenas para o estabelecimento comercial dos patrões. Ela adotou o uso contínuo de máscara e cuidados reforçados de higiene. Ao voltar do trabalho, não entrava em casa com os calçados, lavava as mãos, trocava as roupas e tomava banho, preocupada, principalmente, com a segurança da filha, que sofre de asma. Para as limpezas, se deslocava a pé. Quando a Serra entrou na bandeira vermelha, conforme o modelo de distanciamento estabelecido pelo Governo do Estado, Adriana ficou novamente sem as faxinas. Mesmo preocupada, diz entender o lado dos empregadores:
— Pra eles também é complicado. Não vão chamar, porque estão apertados e não vão ter dinheiro. Tá difícil sobreviver.
Embora a situação esteja cada vez mais desafiadora, Adriana vê uma luz no fim do túnel. Com a volta da bandeira laranja em Caxias do Sul, a loja onde ela trabalhava conseguiu chamá-la novamente. Ainda assim, a situação deve demorar a normalizar, e uma limpeza só não consegue cobrir o prejuízo que Adriana vinha tendo até então.