Ao examinar seu portfólio de retratos, a fotógrafa Tatieli Sperry sentiu falta de pessoas negras. Então foi conversar com amigas negras e escutou relatos que confirmavam um anseio por mais representatividade nesse sentido. Foi assim, respondendo a um questionamento próprio e ao mesmo tempo atenta ao lugar de fala de quem vivencia a problemática racial, que a artista formatou o projeto Pele. A ideia foi reunir um grupo de mulheres negras e exaltar sua natural potência estética.
— Acabei trazendo essa coisa do retrato feminino, que tem esse olhar mais sensível, mais carinhoso, mas as fotos vêm com muita força. Queria realmente destacar a força da mulher negra — diz Tatieli.
A fotógrafa optou por uma cartela de cores que transita entre o verde e o marrom. A maquiagem das modelos, assinada por Márcia Padilha, tem um clima mais clean e suave, valorizando a naturalidade dos rostos. As roupas, que parecem buscar uma ligação com a terra e com a ancestralidade, foram costuradas pela própria fotógrafa.
Pele contou com a participação fundamental das modelos Sabrina Moreira, Bruna Orlandi, Thayse Cabral, Cass e Haylim Marques. O grupo vivenciou unido todos os processos transformadores do projeto. Agora, a intenção é que as fotos possam ser também objeto de transformação quem transita pelas ruas de Caxias.
— A ideia de um ensaio só com mulheres pretas para uma exposição urbana é extremamente necessária numa cidade como a nossa, que tem o racismo infelizmente em evidência. Esse ensaio traz representatividade quando eu penso em outras mulheres pretas passando pelas ruas de Caxias e se vendo em nós, vendo como esse ensaio retrata mulheres pretas unidas num abraço e, principalmente, olhar para as fotos e se imaginar em lugares de destaque, ocupando lugares que são nossos por direito — aponta Bruna Orlandi, 22 anos, estudante de Medicina Veterinária que foi uma das retratadas no ensaio.
Pele também integrou outras mulheres, como a assistente de fotografia Jessica Melinda e a designer Paulinha Suzuki. O projeto teve financiamento da lei Aldir Blanc. Para ver mais fotos, acesse o perfil de Instagram @eusperry.
A rua abraça a arte
Sendo a busca pela representatividade um dos aspectos mais importantes do projeto, Tatieli Sperry optou por expor as fotos da série Pele na rua, ambiente mais democrático possível. As obras estão coladas no formato de lambe-lambes em muros, paradas de ônibus, tapumes e outros pontos da área central de Caxias.
— Mesmo tendo espaços para exposições de trabalhos artísticos em Caxias, muitas pessoas acabam não indo. Existe um grupo gigantesco de pessoas que não recebe essa informação visual artística. Fazer o lambe é ir até as pessoas, democratizar a arte — justifica Tatieli.
A opção por expor na rua também acabou se alinhando ao momento atual da pandemia, quando as pessoas estão frequentando menos ainda as galerias de arte. Nos próximos dias, a fotógrafa instalará novas "partes” da exposição em outros lugares da cidade.