Por Cristina Ranzolin, apresentadora e editora Jornal do Almoço
"29 de outubro de 2020!
— Oi, Mãe, porque tu tá demorando tanto?
— Oi, Filha, estou fazendo mais alguns exames.
— Mais exames? Por quê?
— É, acharam uma manchinha, estou esperando para coletar a biópsia...
— Biópsia? Isso mesmo? Como assim?
Poucos dias depois recebemos a confirmação, minha Mãe era vítima de câncer de mama, meu chão caiu, quimioterapia, cirurgia, radio, imuno, o que era tudo isso? O 'isso' estava prestes a entrar pra nossa rotina familiar e eu me perguntava: por que com a minha Mãe? "
Foi assim que minha filha começou seu discurso ao deixar a presidência da Liga Feminina de Combate ao Câncer depois de três anos de intensos trabalhos nesta entidade, que há mais de 70 anos ajuda mulheres carentes na prevenção e tratamento da doença que entra como um furacão na vida de quase 74 mil famílias brasileiras todos os anos. É tradição na nossa família ajudar a Liga, minha avó, minha mãe e eu mesma nos engajamos nesta causa. Curioso que minha filha foi eleita para liderar o grupo jovem um mês depois do meu diagnóstico.
Em um ano foram 18 quimioterapias, 15 radioterapias, 18 imunoterapias e uma cirurgia. Estou curada!
Relembro as palavras dela nesse discurso, que me emocionou, e terminava com uma declaração de amor, para mostrar como a notícia é impactante para uma família.
O dia 29 de outubro vai ficar sempre marcado nas nossas vidas. Mas não só por ter sido o dia que recebemos o diagnóstico, e sim porque felizmente no dia 29 de outubro do ano seguinte eu fazia a última imunoterapia que encerrava o meu tratamento. Em um ano foram 18 quimioterapias, 15 radioterapias, 18 imunoterapias e uma cirurgia. Estou curada! Agora tomo apenas um remédio diário como preventivo, que preciso tomar por cinco anos, falta um e meio, e sigo fazendo regularmente minhas revisões e exames.
Agradeço todos os dias por ter tido um atendimento rápido e eficiente com médicos especialistas e especiais, que além de me tratarem com precisão me trataram com muita dedicação, e a familiares, amigos e desconhecidos que me apoiaram com muito amor nesta grande jornada que durou exatamente um ano.
Mas não me conformo que isso ainda seja realidade para poucas mulheres. Mesmo sentindo um nódulo no seio muitas demoram para ter o diagnóstico e, quando ele vem, enfrentam uma batalha para conseguir tratamento que quase sempre chega tarde demais, 18 mil brasileiras morrem a cada ano por câncer de mama.
O Brasil tem leis que asseguram exames e a tratamentos rápidos e eficazes, mas não são cumpridas. O tratamento é caro, pode chegar perto de R$ 1 milhão dependendo do caso e com tantos diagnósticos positivos haja dinheiro.
O jeito é investir em prevenção.
O autoexame, mesmo que as vezes já detecte um tumor grande demais, é bem importante. Mas mais importante são os exames de imagens como mamografia, ecografia mamária ou em alguns casos ressonância magnética de mamas. De novo trago aqui a lei que determina que mulheres de 50 a 69 anos tem que fazer esses exames pelo SUS. Se isso fosse cumprido já ajudaria, mas é preciso mais, porque sabemos que a cada ano o diagnóstico positivo bate mais cedo a porta de jovens mulheres. Os exames tem que começar bem antes.
Outubro está chegando ao fim, precisamos pintar todos os meses de rosa pra lembrar que a prevenção tem que ser feita em qualquer mês do ano
Precisamos cobrar nossas autoridades, porque o câncer traz sofrimento para todos: paciente, família e o próprio governo que precisa financiar tratamentos caros. Mas precisamos também focar na conscientização.
Durante a caminhada do Outubro Rosa, do Imama, conversei com o secretário municipal da saúde, Fernando Ritter, ele me disse que Porto Alegre tem exames à disposição. Complica no mês de outubro e nos dois seguintes porque a procura aumenta muito, mas a partir do início do ano a procura é bem pequena e sobram exames.
Outubro está chegando ao fim, precisamos pintar todos os meses de rosa pra lembrar que a prevenção tem que ser feita em qualquer mês do ano. Isso vai fazer com que menos mulheres venham a ser diagnosticadas com tumores graves e menos filhas tenham que perder seu chão com a notícia que ninguém quer receber.