Os referendos a favor do direito ao aborto, organizados de modo paralelo às eleições presidenciais dos Estados Unidos, venceram na noite de terça-feira (5) em vários estados como Arizona e Missouri, mas não na Flórida, o terceiro mais populoso do país.
O resultado na Flórida constitui o primeiro fracasso em um escrutínio direto sobre o aborto nos Estados Unidos desde que a Suprema Corte anulou a proteção federal do direito em 2022.
A questão foi colocada no centro da campanha eleitoral por Kamala Harris, que se apresentou como defensora dos direitos das mulheres contra Donald Trump. O ex-presidente republicano nomeou vários juízes conservadores para a Suprema Corte antes da decisão histórica em 2022.
O Partido Democrata apostava que esses referendos mobilizariam o seu eleitorado e o motivariam a votar.
No Arizona, um estado-chave para o resultado presidencial, os eleitores votaram pela alteração da Constituição estadual para restaurar a possibilidade de realizar um aborto até a viabilidade do feto - cerca de 24 semanas de gravidez - em vez das 15 atuais.
Em Missouri, a mudança será ainda mais marcante: o estado tinha uma das proibições ao aborto mais rigorosas do país, sem exceções em casos de estupro ou incesto. Os eleitores de Missouri aprovaram uma emenda à sua Constituição para autorizar a interrupção voluntária da gravidez até que o feto seja viável.
Na Flórida, a emenda também visava restaurar a possibilidade do aborto até que o feto seja viável, embora o limite neste estado seja atualmente de seis semanas, quando muitas mulheres sequer sabem que estão grávidas.
Nesse estado, que votou esmagadoramente em Trump para presidente, a medida precisava receber 60% de apoio para ser adotada, limite máximo dos estados que submeteram o aborto à consulta.
- "Vivendo com medo" -
Segundo a imprensa, 57% dos eleitores da Flórida votaram a favor da medida.
"A maioria dos eleitores da Flórida deixou muito claro que quer recuperar os seus direitos reprodutivos. Mas devido ao alto limite de 60% e à campanha de desinformação do estado, devem continuar vivendo com medo, incerteza" e com médicos "que se recusam a atender", lamentou Nancy Northup, presidente do Centro de Direitos Reprodutivos.
Por outro lado, a ginecologista Christina Pena, de Miami, comemorou a rejeição de uma medida que "teria sido desastrosa para mulheres e médicos", segundo um comunicado de uma associação antiaborto.
Os defensores da emenda esperavam que a Flórida, cercada por estados muito restritivos na questão do aborto, pudesse se tornar um refúgio para as mulheres no sudeste do país.
Durante mais de dois anos, o direito ao aborto sempre venceu nas urnas, mesmo em estados conservadores como Kansas ou Kentucky.
Quase todos os referendos realizados na terça-feira sobre o assunto procuravam reverter restrições ou proibições adotadas desde 2022, ou consagrar o direito ao aborto em estados onde ainda é legal.
Colorado, Nova York e Maryland estão nesta segunda categoria, e os referendos realizados lá foram vitoriosos, segundo a imprensa local.
Após a decisão da Suprema Corte em 2022, os estados são os encarregados de legislar sobre o tema e, desde então, quase 20 introduziram restrições parciais ou totais.
Ao longo de sua campanha, Kamala Harris denunciou as situações trágicas em que algumas mulheres se encontraram devido a proibições ou restrições.
Muitas foram forçadas a viajar para outros estados para abortar. Os médicos têm medo de intervir em casos de abortos espontâneos ou outros problemas, sob pena de serem acusados de realizar um aborto ilegal.
* AFP