Cientistas chineses usaram uma versão adaptada de uma polêmica técnica de edição de genoma para corrigir uma mutação causadora de doenças em embriões humanos, um avanço inédito que foi recebido com cautela por outros especialistas nesta quinta-feira.
A equipe usou o chamado "editor de base" - uma adaptação da ferramenta de recorte de DNA CRISPR-Cas9 - para corrigir uma única "letra" mutada entre cerca de três bilhões na intrincada codificação do genoma humano.
Esta mutação pode fazer com que humanos nasçam com beta-talassemia, um transtorno genético do sangue potencialmente fatal.
"Este estudo demonstrou a viabilidade de curar doenças genéticas em embriões humanos com o sistema de editor de base", escreveram os pesquisadores na revista especializada Protein & Cell.
A revista provocou controvérsia em 2015, quando publicou um artigo no qual os mesmos autores relataram experiências com a CRISPR-Cas9 para modificar o gene da talassemia.
Esse artigo gerou pedidos de interrupção das experiências envolvendo a edição genética de embriões humanos.
Muitos temem que essa tecnologia possa levar ao chamado "design de bebês", ou seja, à criação de humanos com determinadas características físicas e cognitivas.
Para o novo estudo, Puping Liang, da Universidade Sun Yat-sen na China, e uma equipe usaram uma técnica baseada na CRISPR-Cas9, que permite que os cientistas removam e substituam uma cadeia defeituosa de DNA com grande precisão.
Em vez de usar a proteína Cas9 como "tesoura" para eliminar a "letra" mutada, eles usaram uma enzima para modificá-la.
- Implicações éticas -
O DNA, o manual de instruções para as células gerarem e sustentarem a vida, se parece com uma espiral em forma de zíper - sendo os dentes de cada fio "pares de bases" de "letras" codificadas que são compatíveis quimicamente umas com as outras.
A adenina se une à timina para criar o par de base A-T, enquanto a citosina se emparelha com a guanina formando o par C-G.
A talassemia pode ser causada por uma letra "A" convertida em "G" em uma localização específica do gene.
Para o estudo, a equipe mudou quimicamente o parceiro "C" do "G" mutante, para um "T".
Isso faria com que o "G" mutante se convertesse automaticamente em um "A", explicou o especialista Robin Lovell-Badge, do Instituto Francis Crick, que não esteve envolvido no estudo, através do Science Media Center.
O método eliminou a necessidade de recortar o DNA, e a equipe teve sucesso em uma de cada cinco vezes.
Eles trabalharam com embriões clonados que foram mantidos vivos por alguns dias para fins de experimentação em laboratório.
Observadores disseram que a técnica pareceu ser uma melhoria no padrão CRISPR-Cas9.
"Este estudo poderoso arroja nova luz sobre a correção precisa de genes para transtornos genéticos", comentou Helen Claire O'Neill, da University College London. "Resta saber se a eficiência (...) pode ser melhorada".
Para Darren Griffin, professor de genética da Universidade de Kent, o artigo mostrou que "as implicações éticas da manipulação de genes em embriões precisam de um exame minucioso onde a segurança seja de extrema preocupação".
Cientistas baseados nos Estados Unidos relataram, em agosto, ter usado a CRISPR-Cas9 para reparar uma mutação causadora de doenças no DNA de embriões humanos em estágio inicial.
Na semana passada, cientistas britânicos disseram que usaram a CRISPR-Cas9 para revelar o papel de um gene fundamental no desenvolvimento inicial de embriões humanos.
* AFP