As investigações sobre malfeitos que a Odebrecht tornou produto de exportação têm prazo para ser submetidas a uma varredura continental: 30 de julho. É a data em que vence acordo celebrado entre o Ministério Público Federal brasileiro e os delatores que tiveram atuações irregulares em países latino-americanos. As tratativas procuram estabelecer uma "carência" para que a Odebrecht pavimente um caminho de colaboração com as autoridades locais.
– Quando as delações foram homologadas no final de janeiro pelo Supremo Tribunal Federal, ficou estabelecida essa carência para passarmos nomes e provas (a autoridades de nações vizinhas). A empresa tem tempo para regularizar seus problemas e colaborar. No final de julho, enviaremos – diz o procurador Antônio Carlos Welter.
Entidades reclamam de demora. Martha Roldós, da Fundação Mil Hojas, relata que “jornalistas independentes” veem com apreensão o comportamento do procurador-geral da República brasileiro, Rodrigo Janot, que enviou ofício aos Ministérios Públicos da América Latina. Janot pediu que o STF mantenha as provas sob reserva, enviando-as às autoridades que fizeram pedidos de cooperação internacional.
– Isso pode servir para as autoridades equatorianas seguirem se escusando com o discurso da soberania, impedindo que se conheçam os implicados, garantindo-lhes a impunidade – diz ela, mostrando-se preocupada com a troca do procurador-geral no seu país, onde saiu Galo Chiriboga e entrou Carlos Baca Mancheno, que, segundo ela, "era assessor e homem leal do presidente Rafael Correa (agora ex, sucedido pelo aliado Lenín Moreno)", o que leva os equatorianos a não terem "muita esperança".
Pudera. Em nota, Correa chegou a dizer: "Não aceitaremos, sem provas, versões de diretores de empresa que se declarou culpada de atos de corrupção e que, para atenuá-los, negocia sua responsabilidade com a Justiça americana pagando multas bilionárias".
Welter diz que as negociações para o repasse de informações tendem a ser adiantadas em países com perfil mais aberto e democrático. Ressalva que, apesar do “período de carência” estabelecido pelo Ministério Público brasileiro, informações já públicas, veiculadas pela imprensa brasileira, poderiam servir de subsídios. Peru, Colômbia e Argentina seriam lugares onde há mais receptividade e investigações em andamento.
Welter diz que a cobrança para liberação de documentos e delações aumentou depois que os Estados Unidos desrespeitaram a carência brasileira de seis meses e vazaram algumas informações no ano passado. E revela: já há negociações preliminares para liberação de documentos a pelo menos três países.
No Equador, o ex-ministro da Energia Alecksey Mosquera e um empresário já foram detidos em investigação sobre subornos de US$ 33,5 milhões pagos pela empreiteira brasileira a funcionários do Executivo. Quando assumiu, há menos de um mês, Baca Mancheno pôs as punições como uma das suas prioridades, restando saber se tal afirmação terá consequências práticas. Na Argentina, onde a empreiteira distribuiu US$ 35 milhões em propinas, foi aprovado projeto que amplia a figura do “arrependido”, estendendo-o a casos de corrupção e associação ilícita, com reduções de penas. Aquilo que no Brasil é conhecido como delação premiada podia ser aplicado apenas a tráfico de pessoas, sequestros, lavagem de dinheiro, terrorismo e narcotráfico.
A Odebrecht teria pago US$ 3,5 bilhões (R$ 11,3 bilhões) em subornos envolvendo nove países latino-americanos, além do Brasil. Desde então, países como Peru e Panamá limitaram contratos para obras públicas, e a República Dominicana já se adiantou e formalizou acordo de leniência com a empresa. Na segunda-feira, 14 pessoas foram alvo de pedido de prisão preventiva da procuradoria dominicana, entre eles o ministro da Indústria e Comércio, Juan Montás Domingues, o senador Julio César Valentin e o ex-ministro de Obras Públicas Victor Días Rúa.