As crianças nas escolas são definitivamente dignas de dó; especialmente quando aviões a jato passam zunindo acima de suas cabeças, algo que acontece a cada minuto por aqui.
Por isso, o Aeroporto Heathrow irá gastar 1,8 milhão de libras para construir "superdomos", especialmente projetados para zonas sensíveis a terremotos na Ásia e na África, em 21 escolas britânicas com o objetivo de proteger as crianças do barulho do terceiro aeroporto mais movimentado do mundo.
Quatro domos desse tipo, feito de paredes de gesso e sacos de terra, já estão em uso na Escola Maternal e Infantil Hounslow Heath, por onde os aviões que estão aterrissando passam a menos de 180 metros e, nos horários de pico, chegam e saem a cada 60 segundos, esquadrinhando o céu.
Os domos se parecem com casas de hobbit, mas a coordenadora da escola, Kathryn Harper-Quinn, afirmou que eles facilitam muito a concentração dos alunos, especialmente daqueles cuja língua materna não é o inglês.
- É preciso prestar atenção no professor, mas se você precisa voltar a se concentrar cada vez que passa um avião, você começa a perder energia - , afirmou.
Com os domos, afirmou Caroline Macgill, outra professora, a escola é capaz de realizar o dobro de aulas ao ar livre e os alunos - 580 crianças com idades entre três e sete anos - estão apresentando melhores resultados.
Rinal Kaur Gaba, de seis anos, afirmou que o barulho às vezes era tão grande que - no parquinho, quando quero conversar com meus amigos, só consigo ouvi-los nas cabanas -
Os domos, que diminuem em 19 decibéis o volume dos ruídos externos, são apenas o exemplo mais recente dos absurdos e das complexidades em torno do longo debate sobre a expansão do Heathrow, que precisa desesperadamente de uma nova pista para se adaptar a demanda crescente para manter Londres competitiva em relação a outros centros urbanos da Europa, como Paris; Frankfurt, na Alemanha; e Amsterdã - ao menos é isso o que diz a Heathrow Airport Holdings, dona do aeroporto.
Porém, existe uma resistência enorme por parte dos bairros da região, que cresceram desde que o aeroporto foi inaugurado em 1929 nos campos e pomares da aldeia de Heathrow. O aeroporto se tornou exclusivamente civil somente após o fim da guerra, em 1946. Obviamente, o argumento principal é o barulho, mas também a segurança, os danos ambientais, as pegadas de carbono e o direito do governo de desapropriar os terrenos que seriam necessários para a construção de uma terceira pista.
Não surpreende, portanto, que o próprio bairro de Hounslow seja contra a terceira pista, citando o barulho e as preocupações ambientais em um panfleto produzido para discutir a respeito. Ainda assim, com tantos de seus habitantes trabalhando no Heathrow, ninguém quer que o aeroporto feche as portas. No entanto, não fazer nada parece ser uma opção ruim em um país que tenta competir no mercado global.
A briga em torno do Heathrow afetou diversos governos. Ainda assim, mais uma comissão deve surgir até o fim do ano com um "relatório interino" pedido pelo atual governo de coalizão, que interrompeu os planos de expansão do Heathrow, aprovados originalmente em 2010. Os atrasos também têm sido terrivelmente frustrantes para os maiores envolvidos do ponto de vista comercial, como a British Airways, que utiliza o Heathrow como sede e critica suas taxas; sem contar a expansão de outras companhias aéreas, como a Air France e a Emirates.
Algumas alternativas foram propostas recentemente pelo prefeito de Londres, Boris Johnson, que sugeriu o fechamento do Heathrow, transformando o terreno em um bairro com 300.000 novas casas (em vista da falta de moradias acessíveis dentro e fora da capital) e a construção de um novo aeroporto com diversas pistas em uma terra recuperada no estuário do Tâmisa.
Em novembro, um consórcio criado pelo prefeito revelou planos extravagantes para a construção de um aeroporto com seis pistas, que faria as aeronaves sobrevoarem o estuário, ao invés de áreas predominantemente residenciais, conectado a Londres por meio de uma nova ferrovia de alta velocidade e por melhorias na malha viária.
A localização sugerida fica no meio do estuário do Tâmisa, cerca de 80 quilômetros a leste do centro de Londres; e poderia não somente receber mais aeronaves, mas operar 24 horas por dia. Os responsáveis pelo projeto afirmam que um aeroporto desse tipo poderia ser construído em sete anos e receber 172 milhões de passageiros ao ano. O Heathrow lida com 71,6 milhões de passageiros, 31,8 por cento dos passageiros de todos os aeroportos britânicos.
Gatwick, que fica a 48,3 quilômetros ao sul de Londres e deseja construir uma segunda pista, recebe metade dos passageiros do Heathrow, seguido dos aeroportos de Manchester, Stansted e Luton. Contudo, existem problemas significativos envolvidos na expansão de qualquer outro aeroporto próximo a Londres e o debate questiona se o aumento da competitividade entre o Heathrow, o Gatwick e o Stansted poderia trazer benefícios aos passageiros.
Embora um aeroporto no estuário pareça atraente, o problema - como sempre - é o dinheiro. O custo da última proposta gira em torno dos 47,4 bilhões de libras, mas ninguém sabe quanto realmente custaria, levando-se em conta a nova malha viária, ao passo que uma expansão do Heathrow é impedida pelo barulho e por questões políticas. (Estimativas de custo para a construção da terceira pista geram em torno de 14 a 18 bilhões de libras.)
Em vista das incertezas, grandes companhias aéreas preferem permanecer no Heathrow, incluindo a British Airways, a Oneworld e suas maiores rivais na Star Alliance, entre as quais a United e a Lufthansa, além do SkyTeam, que inclui a Delta Air Lines e a Air France.
O estudo mais recente está sendo realizado pela Comissão de Aeroportos, que também deseja expandir o Gatwick para criar um segundo centro aeroviário. Em um discurso feito em outubro, o diretor da comissão, o economista Howard Davies, apoiou a necessidade da construção de mais pistas no sudeste da Inglaterra e sugeriu que tanto o Gatwick, quanto o Heathrow, acrescentassem uma nova pista, citando o crescimento das linhas aéreas de baixo custo ao longo da última década. Caso apenas uma nova pista seja construída, Gatwick quer que ela seja construída lá.
Até o fim deste ano, a comissão deve recomendar a melhoria imediata das infraestruturas que existem atualmente ao longo dos próximos cinco anos e, a partir do verão de 2015, deve entregar o relatório final com suas recomendações de longo prazo - certamente após a próxima eleição geral.
Outros países resolveram melhor esse problema. Em Paris, o Aeroporto Charles de Gaulle, o segundo mais movimento da Europa, está longe de ser bem visto, mas agora ele conta com quatro pistas e um número cada vez maior de terminais; já o aeroporto de Frankfurt, o terceiro maior da Europa, também possui quatro pistas. O Schiphol, em Amsterdã, conta com seis. Mas até mesmo a Alemanha, com sua suposta eficiência, fez uma bagunça vergonhosa, repleta de acidentes e atrasos, para a construção de um novo aeroporto em Berlim.
Na escola Hounslow Heath, Harper-Quinn afirmou que a ideia das cabanas de hobbits sugiram após um encontro rápido com Julian Faulkner, um dos fundadores da Small Earth, que construiu um vilarejo com cabanas parecidas no Nepal. Na escola, até mesmo as galinhas das crianças vivem em um domo que diminui o volume dos ruídos.
Um dos alunos, Hamze Ali, de 6 anos, afirmou que os aviões o incomodavam.
- Quando você está falando com alguém e o avião passa, você esquece o que estava falando e a outra pessoa vai embora. Isso me deixa confuso e triste -
Macgill, a professora, concordou.
- Você começa a contar uma história maravilhosa para seus alunos e, então, tem que parar por alguns segundos até que o barulho acabe -
Apesar da oposição, parece provável que uma terceira pista seja construída no Heathrow, todos reconhecem, mas isso não será de grande serventia para as crianças e as galinhas da Hounslow Heath.
Barulho
Aeroporto irá construir paredes de gesso em escola de Londres
Objetivo é impedir que o barulho da passagem dos aviões disperse a atenção dos alunos
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