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Acompanhe os bastidores da ação que durou 31 horas na serra gaúcha
Entenda a cronologia dos fatos do assalto que aterrorizou Cotiporã
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> A libertação dos reféns na Serra
> A ação dos bandidos em Cotiporã
Em VÍDEO, repórter Humberto Trezzi relata o terror em Cotiporã:
VÍDEO mostra parte da ação de bandidos em fábrica de joias de Cotiporã
Um dia, entre os anos de 2009 e 2010, um encontro entre dois chefes de quadrilhas durante o banho de sol no pátio da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) mudou a história do crime no Rio Grande do Sul.
É o que a polícia acaba de descobrir, ao identificar suspeitos de participar do mais impactante assalto realizado em 2012 em território gaúcho, o roubo a uma fábrica de joias em Cotiporã, no qual foram feitos 30 reféns e morreram três bandidos em tiroteio com a Brigada Militar.
O pátio da Pasc reuniu, de um lado, Luciano da Silveira, o Puro Osso, 34 anos, chefe de uma quadrilha perigosa e especializada no roubo e furto de veículos, com sede em Sapucaia do Sul, na Região Metropolitana. Do outro, Elisandro Rodrigo Falcão, 31 anos, descrito pela polícia como um homem altamente audacioso por ter implantado o método de explodir e roubar caixas eletrônicos na Serra, ao estilo do cangaço, que domina militarmente uma pequena cidade antes de atacar. O bando dele se escondia nos arredores de Caxias do Sul.
É possível que o know-how do ataque a caixas eletrônicos tenha partido do grupo de Puro Osso. Ele foi preso em 2002 por arrancar os terminais bancários com correntes e rebocá-los numa van. O mesmo método seria usado, cinco anos depois, pelo bando de Falcão em Caxias do Sul - que foi denominado, por isso, Quadrilha da Van.
Puro Osso e Falcão, mesmo em bandos diferentes, acabaram se encontrando em pelo menos duas penitenciárias: a Pasc, de Charqueadas, e de passagem pelo Presídio Central de Porto Alegre. Ficaram na mesma ala da Pasc, confirma a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). Mais do que isso: outros assaltantes vinculados às duas quadrilhas também "puxaram cana" juntos.
- Todo o pessoal da Quadrilha da Van fez rebeliões na Penitenciária Industrial de Caxias (PIC) e foi transferido para a Pasc. Dali, passaram pelo Presídio Central. Ficaram juntos com o bando do Puro Osso nesses locais - confirma um agente do serviço reservado da BM (P2) que trabalha em Bento Gonçalves e investiga as duas quadrilhas.
Esse policial participou do tiroteio que resultou na morte de Falcão e dois outros bandidos em Cotiporã, no domingo.
União resultou em onda de violência
A aliança entre os dois quadrilheiros resultou em uma onda jamais vista de ataques com dinamite a caixas eletrônicos na Região Metropolitana e na Serra. E na subida dos índices de roubo e furto de veículos.
Elisandro Rodrigo Falcão fugiu da cadeia em Caxias do Sul em julho. Luciano da Silveira, o Puro Osso, no final de dezembro, de São Leopoldo. No domingo passado, os dois se envolveram no mesmo ataque, ápice da empresa criminosa de ambos: comandaram o assalto à fábrica de joias em Cotiporã, na Serra. Falcão morreu e Puro Osso fugiu. Na ocasião, outros dois bandidos morreram e dois brigadianos ficaram feridos.
Testemunhas reconheceram três bandidos fugitivos como sendo os mesmos que escaparam com Puro Osso dia 29 de dezembro de um albergue em São Leopoldo. A BM cercou a região com 150 homens, cães farejadores, avião e barcos. Quatro bandidos conseguiram furar o bloqueio e fugiram. Eles foram resgatados por um Tiida vermelho, com placas de Sapucaia do Sul, em São Vendelino, na Serra, encontrado ontem em uma lavagem de carros em Sapucaia do Sul. O carro está sendo periciado em busca de pistas deixadas pelos criminosos. Dois homens que estavam no local foram levados ao Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), onde prestaram depoimento e foram liberados.
- O veículo foi apreendido e estamos investigando se existe ligação dele com os quadrilheiros de Sapucaia do Sul - informou o delegado Juliano Ferreira, da Delegacia de Roubos, ligada ao Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic).
Ferreira está em Cotiporã em busca de um dos bandidos, que ainda estaria escondido na mata da região.
Bandidos atacam em dois Estados
A Polícia Federal investiga as quadrilhas de assaltantes que invadem e dominam pequenas cidades - o chamado Novo Cangaço - por dois motivos. Um deles é que os bandidos têm atacado bancos federais. A outra razão é que alguns criminosos agem em Estados do Sul, formando uma espécie de consórcio. Atacam em Santa Catarina, fogem para o Rio Grande do Sul, e vice-versa.
O próprio Elisandro Falcão, morto no tiroteio em Cotiporã, é suspeito de ter liderado um assalto em Praia Grande (SC) em 2011, do ataque a um carro-forte em Dona Francisca (próximo a Joinville, Santa Catarina) em outubro passado e também do assalto com explosão de caixas eletrônicos em Sombrio (SC), em novembro. Outro que começou carreira no crime em Santa Catarina é Puro Osso, natural de Criciúma.
A P2 (serviço reservado da BM) tem o nome de outro quadrilheiro que atuaria com Falcão nos dois Estados. É Edison Rodrigues, foragido, com mandado de prisão por assalto expedido pela 3ª Vara Criminal de Chapecó (SC). Ele já esteve preso por roubo com explosivos, furto com explosivos, estelionato e receptação de material roubado. Em novembro, foi visto em Caxias do Sul.
- É possível que ele estivesse no ataque em Cotiporã, pois era do bando de Falcão - pondera um PM do serviço reservado.
O paradeiro de Puro Osso é ignorado. Mas os agentes da Delegacia de Roubos seguem os rastros deixados pelo veículo apreendido ontem em Sapucaia do Sul, na esperança de chegar ao esconderijo dos criminosos na Região Metropolitana.
O comércio de carros legais é uma das maneiras usadas por Puro Osso para lavar dinheiro. O delegado Luís Fernando Martins, que trabalhava no Vale do Sinos em 2006, descobriu que, mesmo cumprindo pena na Pasc, Puro Osso negociava a venda de dinamite e alugava armas de grosso calibre para bandidos. Foram apreendidas 120 bananas de dinamite na casa de uma parente dele.
- Lembro que ele tinha uma máquina de clonar celulares, que ele vendia para os outros presos - comentou Martins.
Nascido em Criciúma (SC), Puro Osso tem, segundo apuração da polícia, ligações com traficantes de cocaína que compram a droga em grandes quantidades no Paraguai e na Bolívia e a distribuem para os traficantes varejistas na Região Metropolitana.