Dizem que matemática é ciência exata. Que 100 dividido por seis é 16,6666666667%, não importa o país, a altitude, a situação. É a frieza do número. Mas, neste domingo (3), aprendi que 100 dividido por seis pode ser 100 mesmo. Para isso, basta envolver o coração. Essa descoberta foi feita lá em casa, na zona norte de Porto Alegre, durante a final do Campeonato Brasileiro de Judô por equipes. Explico.
A decisão envolvia a Sogipa e o Reação, do Rio. A Tai venceu o confronto dela, botando o placar em 2 a 1 para nós. Tai é como chamamos, lá em casa, a quem o mundo do esporte chama de Aléxia Castilhos (tem também a variação Dindinha, como fala o Mathias, meu filho de quatro anos que já se aventura nos tatames). Quem não tem uma atleta desse nível na família talvez não entenda o peso que sai das costas quando ela vence.
Quando a Tai ganhou a luta, pensei que nossa aflição, em parte, estava resolvida. Ledo engano. O Reação, de fato, reagiu. A decisão ficou empatada em 3 a 3. A definição da principal competição de judô do país por equipes seria em uma luta extra, com categoria sorteada no telão da Arena UniBH, em Minas Gerais.
Para quem não está familiarizado, o sorteio é assim: as seis categorias aparecem no telão e uma delas fica destacada para ser o desempate. O nervosismo voltou imediatamente. Tinha certeza de que a minha irmã seria a sorteada. Podem perguntar para a nossa mãe, a Cristiane, que sofria ao meu lado enquanto o ventilador parecia um secador de cabelo no calor de domingo.
Para aliviar a ansiedade, recorri à matemática. Dividi 100 por seis (sim, precisei da calculadora) para saber a probabilidade de ela retornar para decidir o título. A resposta, nos olhos, foi de 16,6666666667%. No coração, se manteve em 100%.
— Categoria menos 70 feminino — disse o locutor da Arena em Belo Horizonte.
— P* que pa*. É a Tai — disse, em Porto Alegre.
Dito e feito. E não leve a mal. Não desconfio da capacidade da Tai, que já reverteu dificuldades na vida com a mesma facilidade que reverte golpes nos tatames. Mas é que um medo inafiançável passou pela minha cabeça. E se ela perdesse? Logo ela, que venceu todas as suas lutas por equipes e foi decisiva para colocar a Sogipa na final pela primeira vez! Seria a vilã do filme.
— Não fala comigo – disse a Tai quando os seus colegas foram incentivá-la, com medo de que o estímulo se transformasse em mais nervosismo.
A luta começou. Quem marcasse a primeira pontuação levaria o título para casa. Dava para sentir o nervosismo da Tai a 1706,4 quilômetros de distância. Com 18 segundos, punição por shido para ela. Parecia, mesmo, que não iria dar. Só que, não se esqueça, a minha irmã está acostumada a reverter expectativas e golpes. Com 1min49seg, no contra-ataque, marcou o ippon derradeiro. Em BH, explosão gaúcha. Em Porto Alegre, por pouco o ventilador não voou pela janela, tamanha a festa. Às 16h10min, fim da aflição.
A Sogipa, um dos clubes mais tradicionais do mundo no judô, finalmente conquistava o Grand Prix por equipes. E foi a Dindinha quem definiu o último capítulo dessa história de filme.