A concorrência com a bola é desigual no Brasil. Para atrair o interesse das crianças, muitas vezes só mesmo o acaso pode dar o empurrão necessário a outras modalidades esportivas. Foi o que aconteceu com Luis Guilherme Porto, 20 anos. Quando ele tinha seis anos, Deise Maria decidiu que o filho deveria praticar esportes. Luis queria jogar futebol. Mudou de ideia ao ser levado pela mãe à escolinha do Centro Estadual de Treinamento Esportivo (Cete), em Porto Alegre. Ao ver crianças da sua idade saltando e fazendo piruetas no ar, o guri ficou encantado. A ginástica artística brasileira ganhava, naquele momento, um de seus mais promissores talentos.
Não demorou para André Cupertino, o técnico do Cete à época, perceber que o guri reunia algumas das principais características de um ginasta, como apurada coordenação motora e flexibilidade de sobra. Sem nunca ter treinado, Luis Porto já conseguia reproduzir movimentos comuns. Outra virtude também influenciou Cupertino a convidar o prodígio, em apenas um mês, a treinar no Grêmio Náutico União, um dos maiores clubes da Capital:
– Ele sempre chamou atenção pela dedicação, pela vontade de aprender. Para ser ginasta, não basta só o talento.
A força de vontade do menino nascido em Guaporé e que veio com a família para Porto Alegre antes de completar um ano foi colocada à prova desde cedo. Luis quase perde a conta das lesões graves. Uma delas, uma fratura no braço esquerdo provocada ao prender o protetor do punho na barra fixa enquanto girava o corpo no ar, quase o fez abandonar a promissora carreira ainda aos 13 anos. Foi preciso fixar um pino no osso quebrado e imobilizar o braço por cinco meses.
Em 2017, Luis também ficou afastado em grande parte da temporada para tratar lesões. O apoio em casa foi fundamental.
– Várias vezes pensei em desistir. Mas meus pais sempre me incentivaram a continuar, lembraram todo o caminho que tinha trilhado até então – diz Luis.
A persistência foi recompensada. Em outubro, já recuperado, disputou o Brasileiro de especialistas na Arena Carioca 3, no Parque Olímpico do Rio. Na prova de salto, um dos aparelhos de sua preferência, empatou na primeira colocação com Arthur Zanetti, ouro nas argolas nos Jogos de Londres 2012. Ao seu lado no pódio, estava outro medalhista olímpico, Arthur Nory, bronze no solo no Rio 2016. O resultado injetou confiança no gaúcho:
– Ali me dei conta de que tinha potencial para me tornar um ginasta de ponta. Já tinha sido campeão em 2016, mas o Diego (Hypólito, prata no solo no Rio), o Nory e o Zanetti não estavam na competição. Desta vez, todos eles estavam presentes. No pódio, eu mal acreditava que estava no meio desses caras. E dividindo o primeiro lugar com o Zanetti.
Em novembro, viajou para Cochabamba para disputar o Sul-Americano. A princípio, competiria em quatro aparelhos: solo, salto, cavalo com alça e paralelas. Chegando à Bolívia, foi escalado a disputar argolas e barra, provas em que tem mais dificuldades. Topou o desafio “porque queria mostrar serviço para a comissão técnica” da seleção brasileira. Objetivo traçado, objetivo alcançado: foi campeão do solo e do salto, ficou em terceiro lugar no cavalo e em quarto no individual geral.
Em janeiro, durante um treino com atletas da seleção no Rio, foi comunicado pelo técnico Marcos Goto de que faria parte da equipe que disputará competições internacionais na temporada. Em fevereiro, pela primeira vez participou uma etapa da Copa do Mundo de ginástica artística, em Melbourne, na Austrália. Na estreia, já conseguiu avançar à final do salto – terminou em quinto lugar na prova.
Para 2018, a meta de Luis Porto é garantir uma vaga na equipe que disputará o Mundial de Doha, de 25 de novembro a 3 de dezembro. A competição do Catar é estratégica, pois já valerá vagas para os Jogos de Tóquio. Ao mirar 2020, os olhos do garoto brilham.
– Olimpíada é um sonho desde o momento que entrei para a ginástica. O meu grande objetivo é ser campeão olímpico.
Na avaliação de um colega que já chegou lá, o gaúcho de 1m63cm e 61kg está no caminho certo.
– Luis é um garoto bem esforçado, tem muita disciplina. Ele faz (exercícios de alto grau de) dificuldade. E o melhor de tudo, faz dificuldade com postura. Isso faz com que ele consiga tirar notas (altas) nas competições. É um atleta de se admirar, que vai ajudar muita a seleção e tem todas as características para conseguir bons resultados – acredita Zanetti, o campeão olímpico que não faz muito tempo dividiu o lugar mais alto do pódio com a mais nova promessa da ginástica brasileira.