O que cinco segundos representam na vida de alguém? Para Jaqueline Weber, o breve intervalo de tempo poderá significar uma vaga na equipe brasileira de atletismo em Tóquio 2020. Prestes a completar 23 anos, a gaúcha nascida em Teutônia e radicada em Santa Cruz do Sul desponta numa prova que já deu até medalha de ouro para o Brasil.
Mas não é Joaquim Cruz, campeão olímpico dos 800m em Los Angeles 1984, a maior inspiração para a loira de 1m70cm e 54kg. O modelo de Jaqueline caminha ao lado dela dia após dia há dois anos: seu treinador e namorado, o ex-fundista Fabiano Peçanha, 35 anos, que competiu na mesma especialidade nos Jogos de Pequim em 2008 e de Londres em 2012.
O casal enfrenta um dos maiores obstáculos dos esportes em geral no Brasil: a falta de incentivo. Descoberta em competições escolares, Jaqueline participava de um projeto da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) que foi extinto em 2015. Foi então que Fabiano capitaneou a criação da Associação Medalha de Ouro (AMO), com a qual conseguiu manter uma parceria com a universidade – a atleta preservou uma bolsa parcial de estudos na faculdade de Educação Física e continua treinando em instalações do campus.
Sem patrocínios suficientes para cobrir com regularidade despesas básicas de um atleta de alto rendimento, Jaqueline tem de se virar para competir fora do Estado e do país. As dificuldades começam já na preparação: a fundista é forçada a submeter-se a uma rotina de treinamentos itinerantes. Ora corre na pista de brita da Unisc, ora faz atividades no Parque Municipal de Santa Cruz, sede da Oktoberfest. Quando precisa simular tempos em condições mais próximas de uma corrida, costuma percorrer 60 quilômetros até Lajeado para treinar na pista sintética da Universidade do Vale do Taquari (Univates).
Para as viagens de avião, não raro Fabiano tem de recorrer a milhas de amigos. Todo o esforço e os sacrifícios têm um sentido para Jaqueline: baixar em cinco segundos sua melhor marca nos 800m (2min6s41), percorrer a distância na casa de 2m1s e, assim, conseguir um índice para a Olimpíada (com base no tempo exigido para os Jogos do Rio, em 2016).
Campeã juvenil nos 1.500m – outra prova olímpica – em 2014, Jaqueline comemora a largada de 2018. Em fevereiro, passou três semanas na altitude de 2,6 mil metros de Paipa, na Colômbia, para uma espécie de pré-temporada. Em sua primeira competição do calendário, o GP de Atletismo do Uruguai, em Montevidéu, na primeira quinzena de março, assumiu a liderança do ranking brasileiro nos 800m e nos 1.500m. O tempo registrado nesta última prova não empolgou a atleta. Com 4m28s09, ainda está mais de 20 segundos acima de uma marca olímpica. Mas o desempenho nos 800m – cravou 2min67 – anima a gaúcha:
– Nunca corri tão forte em um início de temporada. Os treinos na Colômbia foram muito importantes.
Nos primeiros dias de abril, a atleta irá a Santiago, no Chile, para outro GP. Se até o final do mês se mantiver entre as duas mais bem colocadas no ranking brasileiro, garantirá vaga na equipe brasileira dos Jogos Sul-Americanos de Cochabamba (BOL), que será realizado de 26 de maio a 8 de junho.
– A ideia é baixar três segundos já neste ano. Por isso preciso de provas fortes nesta temporada. Os treinos indicam que essa meta é possível – afirma.
Para Fabiano Peçanha, que já disputou uma semifinal olímpica dos 800m em 2012, a atleta tem potencial para Tóquio:
– A Jaqueline tem uma determinação impressionante. A resiliência é uma das palavras mais importantes para uma atleta. Pode apanhar, pode cair. Mas tem de levantar e ir para a luta de novo. Ela treina com uma vontade muito grande, não é qualquer dorzinha que vai tirá-la do treino. Aliás, não foge dos treinos, às vezes eu tenho de dizer para ela parar. E muitas vezes fica braba, aí tenho de explicar que o descanso também é importante.
Mas enquanto não baixar aqueles cinco segundos, Jaqueline não vai descansar.