As medidas de manutenção do emprego anunciadas na quinta-feira (6) durante a quarta passagem do presidente Lula pelo Rio Grande do Sul desde o início da enchente de maio deixou sensação de insatisfação em maior ou menor escala em dirigentes sindicais, patronais e de federações, sejam elas de trabalhadores ou empresariais.
O principal aspecto de insatisfação é a limitação do auxílio ao valor de dois salários-mínimos, que serão pagos pelo governo federal, em julho e agosto, para cada um dos 434 mil funcionários de empresas gaúchas que aderirem ao programa. Conforme o presidente da Força Sindical-RS, Cláudio Janta, o cenário ideal seria a reprodução do auxílio concedido durante a pandemia por covid-19. Na ocasião, recorda, o benefício consistia em arcar com 70% dos vencimentos mensais efetivos dos trabalhadores, independentemente do valor do salário.
— A situação agora é mais grave, pois, na pandemia, as empresas e as pessoas não tiveram suas infraestruturas e casas afetadas. Hoje, as pessoas perderam tudo, quem achava que não tinha nada viu que tinha tudo, perdeu tudo. Então, primeiro, o valor, volto a frisar isso, ajuda apenas pessoas em grande vulnerabilidade, mas não ajuda quem está trabalhando, não ajuda a pessoa que trabalha num mercadinho, trabalha numa loja, trabalha num aplicativo, trabalha num táxi, tem o seu negócio, sua barbearia, seu salão de beleza e perdeu tudo – comenta.
Na mesma linha, o presidente da Federasul, Rodrigo Sousa Costa, argumenta que as medidas ficam muito “aquém da magnitude da tragédia”. Para ele, a ineficácia das ações pode contribuir com uma “onda de demissões no Estado”.
— As pessoas que perderam as casas agora poderão perder os empregos, e as demissões já começaram. Essas pessoas vão usar os R $ 5,1 mil do governo para ir embora do Estado do Rio Grande do Sul com a família. Nós vamos ter um êxodo intenso nos próximos meses e precisamos deixar isso bem claro. Está muito fora. A morosidade do governo e esse conjunto de surpresas desagradáveis que a gente está recebendo estão privilegiando somente a quem as anuncia — esbraveja, ao cobrar a inclusão de pontos como a suspensão temporária e antecipação de férias.
O presidente da Federação dos Trabalhadores nas Indústrias do Calçado e do Vestuário (Fetivergs) ameniza a repercussão e, apesar de também considerá-las insuficientes, João Nadir Pires vê no fato uma sinalização positiva, e pondera que o anúncio atende a algumas reinvindicações sindicais.
— O emprego respira, mas poderia ter um fôlego maior — declara, em referência a eventual necessidade de ampliar o benefício por um período maior do que dois meses.
Por razões distintas às do presidente da Federasul, ele também assinala os riscos de uma “debandada” de profissionais gaúchos para outros Estados. Segundo ele, no setor calçadista, já há um assédio de empresas localizadas em polos produtores de Santa Catarina aos trabalhadores.
Críticas nos dois lados do balcão
Presidente do sindicato que representa os trabalhadores do comércio em Porto Alegre (Sindec-POA), Nilton Neco afirma que o pacote é “ineficaz”. E eleva o teor das críticas endereçadas ao anúncio do governo federal:
— Para o movimento sindical, soa como um "cala boca" de um governo que agora se livra de todo o peso da situação como se já tivesse feito muito para manter os empregos. O valor de dois salários-mínimos é uma ajuda paliativa e temporária que não reflete a real gravidade da situação enfrentada por nossos trabalhadores e suas famílias, inclusive sendo um valor abaixo do que muitas categorias recebem, como é o caso do comércio.
Em ponta oposta do balcão de negociações coletivas do setor, desta vez, o tom é de concordância com o presidente da Fecomércio-RS, Luiz Carlos Bohn, que acrescenta: o pacote necessita melhorar “no desenho e na abrangência”. Segundo ele, limitar às empresas localizadas em área de alagamento é “um erro que ignora os impactos sistêmicos das enchentes”.
Essa cobrança se refere ao fato de que a medida provisória publicada abra margem para que, por exemplo, empresas de uma mesma cidade recebam o benefício enquanto outras não tenham direito.
Bohn explica que existem inúmeros estabelecimentos com receitas severamente prejudicadas por impactos derivados da chuva, sem necessariamente terem sido alagadas. Além disso, critica o dirigente, o período de início do benefício, fixado apenas para julho, pode ser “muito tardio”.
— As empresas estão em emergência. Por fim, seu prazo de vigência, de apenas dois meses, é completamente insuficiente quando confrontado com o tamanho das perdas — complementa.