Revolta foi o sentimento compartilhado por proprietários de veículos diante da notícia de que o IPVA de 2020 terá de ser pago à vista e sem descontos. Nesta segunda-feira (4), o governo do Estado anunciou a impossibilidade de parcelamento e o fim do abatimento por antecipação.
Para os servidores estaduais, a indignação foi ainda maior. Com o salário de outubro pendente e o pagamento do 13º incerto, eles questionam qual a estratégia do governo em proibir o parcelamento de um dos tributos que mais pesam no orçamento de fim de ano.
— Poderiam perguntar ao secretário (da Fazenda) como ele quer que paguemos o IPVA em cota única com o atraso e os parcelamentos da folha de pagamento. Que tristeza! — protestou a servidora aposentada Yara Baumgarten, 66 anos.
Assim como Yara, trabalhadores estão recorrendo ao papel e à caneta para recalcular como dar conta das despesas diante do novo método de cobrança.
Poderiam perguntar ao secretário como ele quer que paguemos o IPVA em cota única com o atraso e os parcelamentos da folha de pagamento. Que tristeza!
Pagamento era antecipado para garantir desconto
Aposentada desde 2016, a professora da rede estadual Luiza Helena de Campos, 59 anos, acostumou-se a quitar antecipado o IPVA do seu Fox para garantir desconto. No ano passado, até incentivou familiares a adotarem a mesma postura.
Luiza pediu antecipação do 13º no Banrisul para quitar o IPVA e o seguro do carro. Segundo ela, a dedução no tributo fazia diferença. Nos últimos quatro anos, o parcelamento do seu salário de R$ 3,2 mil fez com que consumisse parte da poupança e recorresse à ajuda de familiares.
— O governo havia dito que pagaria em dia (os salários). Não fez isso e ainda lançou essa bomba — reclama a aposentada.
O governo havia dito que pagaria em dia (os salários). Não fez isso e ainda lançou essa bomba.
Impacto será nas compras de fim de ano
Uma das maneiras encontradas pela aposentada Yara Baumgarten, 66 anos, para colocar o orçamento doméstico em ordem foi o parcelamento de despesas fixas. De outubro a janeiro, por exemplo, a ex-servidora da Caixa Econômica Estadual costuma dividir o valor do seguro do carro. Depois, de janeiro a março, o IPVA e, em seguida, o Imposto de Renda.
Neste ano, o improviso encontrado pela servidora para conviver com o depósito fracionado do seu salário líquido de R$ 3,5 mil se tornou inviável.
— É revoltante o governo dizer que a mudança é inexpressiva porque apenas 5% da população parcela o IPVA. Dentro desses 5%, certamente estão funcionários do Executivo que recebem parcelado – afirma Yara.
A aposentada ainda não sabe qual estratégia usará para cumprir o compromisso, mas tem certeza de que o principal impacto será nos gastos de fim de ano.
Aposentado poderá atrasar um dos IPVAs
Morador da área rural de Novo Hamburgo, o mecânico industrial Gilnei Kehl, 54 anos, depende dos seus veículos para qualquer necessidade. A área comercial mais próxima, Lomba Grande, fica a 12 quilômetros de onde mora.
Sei que o governo está no aperto, mas a culpa não é minha. Ninguém pergunta se estou no aperto também
Kehl projeta que, em 2020, dificilmente conseguirá pagar os IPVAs da Zafira e da moto que tem na garagem. Um dos dois tributos, que estava habituado a parcelar, deverá ficar atrasado.
Ele é responsável pela única renda da casa. Vive de bicos de consertos em maquinário e de uma aposentadoria de R$ 1,1 mil do INSS.
— Sei que o governo está no aperto, mas a culpa não é minha. Ninguém pergunta se estou no aperto também — diz.
Trabalho em aplicativo comprometido
O motorista Edisson Castilhos, 52 anos, recorreu aos aplicativos em 2017, quando foi recomendado por um primo. Pediu demissão do trabalho de porteiro em um condomínio e colocou o seu Celta para a rua.
Dois anos depois, está arrependido. E a mudança no pagamento do IPVA contribuiu para isso.
Castilhos acha que há gente demais atuando nos aplicativos e que as despesas com o veículo — em muitos momentos, imprevistas – não compensam as 12 horas diárias na direção.
— Preferia estar na portaria – desabafa.
Por causa do salário imprevisível, pediu dinheiro emprestado no ano passado para pagar o IPVA. Como de costume, quitou na data-limite de vencimento, porque "nunca sobra dinheiro". Agora, foi surpreendido pela mudança e desconhece como pagará os R$ 700 de IPVA dentro de dois meses.