Disposto a ampliar a oferta de etanol no país, o governo anunciou nesta terça-feira corte de impostos e linhas de crédito mais atraentes para os produtores. Mas os efeitos podem não chegar ao bolso do motorista.
Assim que entrar em vigor, em 1º de maio, a eliminação de PIS e Cofins irá reduzir o custo do etanol em R$ 0,12 para o produtor. Entretanto, nem governo, nem indústria garantem que este desconto será repassado ao consumidor.
- O objetivo principal dessa redução é viabilizar condições para que o setor faça mais investimentos. Não quer dizer necessariamente que o produtor vai repassar para o preço - afirmou o ministro da Fazenda, Guido Mantega, em discurso alinhado ao da presidente Dilma Rousseff, que disse não ser possível prever como o mercado reagirá às medidas.
Além de tentar estimular o uso da cana-de-açúcar para fabricar o combustível, o governo quer garantir oferta do etanol para o aumento de 20% para 25% na composição da gasolina, mudança que também passa a valer a partir de 1º de maio.
Argumentando operar no prejuízo nos últimos anos, produtores admitem que parte do desconto pode ficar no bolso do produtor, e outra parte pode ser absorvido na cadeia de distribuição. Para a presidente da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica), Elizabeth Farina, os benefícios serão repartidos entre distribuidor, produtor e consumidor.
Elizabeth aponta que o preço da gasolina se manteve estável por um longo período no Brasil, enquanto o setor sucroalcooleiro foi afetado por custos agrícolas em alta e enfrentou problemas climáticos, resultando na queda de produção. Com o anúncio das medidas, a dirigente espera "retomar a competitividade" do etanol.
Analista de etanol da Tendências Consultoria, Amaryllis Romano considera o pacote positivo por devolver as margens de lucro aos usineiros, o que poderá levar os canavieiros a ampliar a zona de cultivo e estimular o investimento na produção. A especialista aponta o pacote como um marco na mudança na relação entre governo e produtores.
- A produção de álcool vinha se voltando à fabricação de açúcar nos últimos anos, mas estes estímulos podem marcar uma mudança na percepção dos canavieiros, ampliando a oferta - afirma.
Para especialista, ações têm impacto de curto prazo
O sócio-diretor da consultoria Canaplan, Luiz Carlos Corrêa Carvalho, avalia as medidas como úteis só no curto prazo, incapazes de devolver a confiança para os usineiros invistirem na ampliação de seus canaviais:
- A tentativa pode até funcionar neste ano, pois o preço do açúcar está menos atraente, mas os investimentos apenas voltarão quando os produtores tiverem convicção de que o governo não irá mais congelar o preço da gasolina, tornando menos atraente o etanol nas bombas.
Frete e ICMS dificultam queda no Estado
O corte do PIS e da Cofins e a gradativa queda no valor do etanol projetada pelo governo federal, em razão do aumento de produção, não devem chegar tão cedo às bombas no Rio Grande do Sul, avalia o presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Combustíveis e Lubrificantes no Estado (Sulpetro), Adão Oliveira. Os motivos são o aumento do custo do frete neste ano e a busca dos produtores pela recuperação das margens.
- É cedo para ter certeza, mas este corte de impostos deverá se perder pela cadeia. Se houver queda no custo para o varejo, será de poucos centavos - afirma Oliveira.
Além do custo do frete, que no caso do Rio Grande do Sul é mais representativo em razão da distância dos polos produtores, a alíquota de ICMS cobrada no Estado, de 25%, impede que os preços do combustível renovável seja competitivo com o da gasolina. A última vez que valeu a pena ao motorista gaúcho abastecer com álcool foi há quase três anos, quando correspondia a menos de 70% do valor da gasolina, um ponto de equilíbrio considerando a diferença de rendimento de ambos combustíveis.
Um longo caminho
Para o pacote do setor sucroalcooleiro resultar em redução do preço ao consumidor, há muitos obstáculos:
As medidas
Com a finalidade de diminuir a carga tributária do setor, produtores terão direito de crédito de PIS e Cofins, o que equivalerá a zerar as alíquotas desses tributos.
Foram liberadas linhas de crédito para produção e estocagem no valor de R$ 6 bilhões.
Foi reduzida, de 9,5% para 5,5%, a taxa de juro anual do Pró-Renova, linha de financiamento voltada à renovação dos canaviais. Os recursos chegam a R$ 4 bilhões.
Os nós
Recuperação do negócio
Nos últimos quatro anos, o setor alcooleiro teria acumulado prejuízos em razão do aumento do custo de produção, não absorvido pela demanda do consumidor. Apenas o açúcar teria gerado lucro à indústria e ao produtor. É possível que o incentivo seja contabilizado como margem de lucro.
Custo do frete
O frete tem subido neste ano, em razão de novas regras que reduziram a jornada de trabalho dos caminhoneiros e à alta demanda por transporte para escoar a safra. Como o Rio Grande do Sul traz de fora o etanol que consome, o peso do frete é significativo.
Atração do açúcar
O preço do açúcar vem caindo ao longo do ano, o que deve levar muitos produtores a direcionar sua produção para fabricação de etanol. Com o aumento da oferta de matéria-prima, o preço pode cair nas bombas. A questão é como estará o preço do açúcar até o final do ano.
ICMS estadual alto
O governo gaúcho cobra uma das mais altas alíquotas de ICMS sobre o etanol do país, de 25%. Para que o preço do combustível seja atrativo, produtores pedem a redução desse percentual.
Incentivo à gasolina
Apesar da pressão da Petrobras, o governo federal tem segurando altas mais expressivas no preço da gasolina, para evitar pressão inflacionária. Dessa forma, o etanol não é atrativo para o motorista e acaba esquecido. Em consequência, menos produtores optam por direcionar a cana para a produção de álcool.
Uma meta ainda distante
Redução do preço do etanol ao consumidor, elevando o consumo e os incentivos para aumentar a produção na próxima safra.
*Com agências de notícias