Há poucas dúvidas de que o Brasil precisa de uma reforma na Previdência, mas a dureza de algumas regras anunciadas ontem impressionou até seus defensores mais animados. Renato Fragelli, professor da FGV, costuma rebater críticas à fixação da idade mínima argumentando que os pobres já enfrentam essa exigência no Brasil. Pondera que, por ter uma vida profissional menos estável, com períodos de desemprego, enfrentam mais problemas em somar o tempo de contribuição e, portanto, acabam obtendo o benefício pela via da idade, que hoje já existe, embora não seja a única opção.
Na avaliação de Fragelli, o projeto apresentado pelo governo é fundamental para afastar o país do abismo do endividamento, porque a Previdência é, de longe, a maior fonte de despesa pública. Admite, porém, a possibilidade de que algumas das regras mais duras sejam "bodes" – a figura que, em um quadro desconfortável, incomoda tanto que, quando retirada, dá sensação de alívio. Entre os potenciais "bodes" identificados por Fragelli estão a exigência de 49 anos de contribuição para atingir o teto do benefício e os limites da transição.
– Deve ser um dos "bodes", porque é, de fato, muito dura. O que a proposta prevê é que, aos 65 anos, o aposentado tenha direito a 51% do benefício máximo, mais 1% por ano de contribuição. Os parlamentares provavelmente vão tentar elevar o ponto de partida, para algo mais próximo de 60% – prevê Fragelli.
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Outra regra com potencial de alteração no Congresso, pondera o especialista, é a que estabelece os pontos de corte para a transição – 50 anos para homens, 45 para as mulheres. Neste caso, a tentativa deverá ser "esticar" a idade limite para se credenciar ao "pedágio". Para Fragelli, nenhuma dessas duas alterações, se bem calibradas, compromete irremediavelmente a a reforma. O mais importante, para o especialista, é não haver tolerância quanto ao estabelecimento da idade mínima, tendência internacional diante do envelhecimento da população:
– No Brasil, temos um regime previdenciário para os ricos e outro, mais injusto, para os pobres. Equalizar as condições é essencial, além de encaminhar solução para a principal fonte de desajuste fiscal no Brasil, que passa por uma situação fiscal dramática, com risco de superendividamento.