Eliane Marques
Em A Morte e o Cavaleiro do Rei, de Wole Soyinka, o personagem Elesin Oba deverá realizar suicídio ritual segundo a tradição iorubana que o constitui. O rei morreu, e ele, seu cavaleiro, deverá guiá-lo até o mundo dos ancestrais. Ainda no tempo-lugar da vida, o mercado, Elesin conversa com a gente que por ali se prepara para o término do dia. Sua boca fala do que mastigou. Se entre os iorubás corre o provérbio segundo o qual a boca nunca diz que já comeu o bastante, a boca de Elesin, subversora da ordem, diz que mastigou de tudo, quando o mundo foi um alguidar de mel e quando não o foi. Onde houve pouco, a boca se virou com pouco; onde houve muito, se refestelou. Suas mãos (as da boca) e as do rei mergulhavam juntas nas baixelas com carnes tão suculentas que os dentes as acusavam de descaso. O cavaleiro e seu rei comiam as mais seletas safras de inhames. O rei lia desejo nos olhos de seu cavaleiro sem saber que o desejo também viria do futuro.
- Mais sobre:
- caderno doc