
Dia e noite. Primavera, verão, outono e inverno. Nova, crescente, cheia e minguante. Nascimento, crescimento, apogeu e finitude. Aceitemos ou não, a vida se manifesta em ciclos contínuos. O que fazer senão viver o escuro para melhor usufruir do claro ou entender todo fim como um recomeço? São mistérios primordiais, que remontam a quando o milagre da vida se esboçou nas águas. E é em Câncer, o primeiro signo de água, associado à fonte matriz, que essa natureza cíclica da existência se desenha, sob as nuances emocionais do seu astro regente, a mutável Lua, senhora das marés.
Para além das fases de seu movimento, a Lua tem outro fascínio: um lado oculto, sempre invisível aos olhos terráqueos. Só vemos uma mesma face lunar porque nosso satélite tem uma rotação sincronizada, ou seja, o tempo para girar em torno de si mesmo é igual ao tempo do giro ao redor da Terra, cerca de 28 dias. E o que haverá nesse lado oculto da Lua? Na real, há apenas mais crateras, picos e vales, mas, simbolicamente, ele sugere uma dimensão mais secreta, e até insondável, dos cancerianos.
“Mistério sempre há de pintar por aí”, já cantou Gilberto Gil. Assim como o caranguejo mítico passeia por distintos mundos, entre a terra e a água do mangue, o canceriano transita entre a matéria e os sonhos, entre o fora e o dentro da carapaça. Quando se percebe frágil, os instintos imperam, acionando mecanismos de defesa. Aí pode ser difícil controlar o impulso inconsciente para sair de cena e introverter-se. E sabe-se lá quando sua aquosa e fértil imaginação vai elevá-lo a picos de confiança e abertura ou atirá-lo em vales profundos de medos e preocupações.
É a Lua em nós, com suas marés. Se a vida é assim, convém respeitar o tempo de cada ciclo. E viver cada emoção, seja ficando na sua, quieto, ou pedindo um abraço, um colo, quando alguma carência se instalar. Desvendar as emoções é avivar a alma. É aceitar o mistério interior, mas levar para lá a consciência, para não se afogar na onda cega dos instintos.
Outra vez Gil: “Se eu sou algo incompreensível / Meu Deus é mais”. Afinal, ser enigmático tem um certo charme, não?