
O entrevistado da série “As Crises que Venci” é Paulo Geremia, sócio fundador do Galeto Di Paolo. Apesar de ser do ramo da gastronomia, um dos setores mais atingidos pela crise, ele conta como está conseguindo superar a queda de faturamento nos restaurantes apostando na reorganização do negócio.
Geremia, que começou como garçom, também foi sócio de lanchonetes e churrascaria, até abrir a primeira galeteria em 1994. Hoje, a rede que comanda tem cerca de 400 colaboradores e atua no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo.
Onde você atuava quando viveu sua primeira crise?
Eu nasci em 1961, mas a primeira crise foi a do (ex-)presidente (Fernando) Collor (de Mello), quando bloqueou o dinheiro (limitação de saques de poupanças e contas correntes, em 1990). Ficou R$ 50 (50 cruzados novos, a moeda da época) para cada cidadão. Naquele momento, sentimos que as pessoas não tinham dinheiro efetivo e eu trabalhava na churrascaria. As pessoas pararam de ir. Aí criamos mecanismos, como pagar depois, assinar nota... Foi uma crise que, de momento, parecia que seria até maior, mas depois ela foi curta. A economia andou e conseguimos dar a volta.
O setor gastronômico é um dos mais atingidos pela crise atual, mas quais outras crises você destaca?
Outra crise foi a que começou com a presidente Dilma (Rousseff), entre 2015 e 2017, em que tivemos uma queda de, aproximadamente, 20% do faturamento, com a economia com inflação e desemprego. Foi uma crise que não durou um mês, mas anos. Nós tivemos então a experiência de uma outra crise bem forte quando teve a greve dos caminhoneiros. Essa foi um susto grande. O que ocorreu é que o fornecimento, a matéria-prima começou a faltar. Aí começou o problema com os funcionários para irem trabalhar, mas o principal foi que o cliente não tinha mais como vir nos restaurantes. Foi uma diminuição muito brusca. Não estávamos prevenidos, nem nós e nem o governo. Aquele mês de maio foi o pior mês da nossa história até então. A greve foi até longa. Mas nada se compara à crise da covid-19, porque é a maior e mais longa, principalmente no segmento de gastronomia e hotelaria, e tivemos o cancelamento de feiras de negócios, eventos e festas. E a pandemia iniciou em março, e janeiro e fevereiro já eram de faturamento mais baixo, o pessoal vai para o Litoral. Nós sempre nos recuperávamos em março, abril e maio...
O ano está perdido ou ainda é possível recuperar?
O ano está em déficit na parte financeira. Eu acredito que, para recuperar, teríamos que ter mais união com governantes e com o setor de saúde para voltar à normalidade. O sistema de bandeiras do governo prejudicou. Quando paramos lá no início, era para ter o sistema de saúde preparado, mas com esse abre-e-fecha em vários lugares, é muito difícil de se administrar. Eu diria que temos uma chance de se recuperar nos próximos meses e graças à ajuda do governo federal, que foi muito generosa no sentido de folha de pagamento, suspensão de contratos, os financiamentos. É o que está nos sustentando, o que nos manteve agora em condições de reabrir. A união de governador e prefeitos para decidirem juntos, e não divergirem, ajudaria mais. Tem que voltar a malha aérea para que o turista volte a viajar, tanto para negócios quanto para turismo de passeio. Mas acreditamos que vai se recuperar nos próximos meses. Não vai ser essa crise que vai nos tirar do mercado, que vai nos derrotar. Mas agora precisa de união.
Como está sendo lidar com a crise atual, a mudança de comportamento de consumo?
A gente se preparou, já tínhamos casa que fazia telentrega e o take away. Aliás, nós éramos muito fortes nas pessoas virem buscar. A gente melhorou muito o sistema de embalagem, de segurança, para poder entregar em casa a mesma qualidade. A gente ampliou aplicativos, mas eles têm um custo um pouco alto, mas é necessário. E estamos desenvolvendo aplicativo próprio para poder atingir mais a telentrega, que é um percentual interessante, chega a aproximadamente 20%. Mesmo agora que reabrimos a casa com todos os protocolos, os cuidados, tem que passar a segurança de que não é no restaurante que vão se contaminar. Toda a equipe está treinada e preparada e temos tido bons resultados. No Rio Grande do Sul, tem vários locais que já está acima de 50% (a frequência), como a própria região da Serra, Gramado. Os expressos estão se recuperando, um segmento que temos bastante em Caxias, e que vamos expandir, porque vimos uma mudança no consumidor em desejar o feito na hora, e acreditamos que a variedade e o custo-benefício vão ter uma boa demanda.
Qual a principal lição dessas crises?
A organização, estar preparado economicamente... Mas o maior aprendizado é que devemos nos ajudar, estar unidos, saber que um depende do outro, tanto funcionário e empresário, quanto entre empresários. Não se vive isolado e não se tem condições de vencer sozinho. Nesse momento, a gente sentiu que o grupo de cada setor precisa estar unido, organizado e preparado, porque quem estava se aventurando, ou não entrou na crise organizado, ou quem estava alavancado demais terá graves problemas para se manter, porque realmente faltou, nesses meses, fluxo de caixa.