No momento em que o ex-primeiro ministro italiano Silvio Berlusconi - famoso pelos escândalos sexuais com adolescentes e prostitutas - entrava na seção eleitoral para votar em Milão, em fevereiro, no auge do inverno europeu, Inna Shevchenko, Oksana Shachko e Elvire Duval-Sharle infiltravam-se no local misturadas à confusão de imprensa e curiosos. Aguardaram o momento em que Berlusconi estava a poucos metros de distância e, em um só golpe, retiraram seus suéteres, gritaram e exibiram os torsos nus pintados com o slogan "Chega de Silvio". Imediatamente, dezenas de policiais impediram que o trio barulhento se aproximasse mais do Il Cavaliere, arrastando as mulheres para fora enquanto elas esperneavam e berravam.Uma foi atirada em uma poça d'água, segurada pelos cabelos, outra resistiu a coices a ser empurrada para uma viatura. Aquele era o segundo grande "ataque" naquele mês do grupo Femen. Dias antes, as mesmas ativistas, em um grupo maior, haviam provocado furor na Catedral de Notre Dame, em Paris, entoando, seminuas, "Chega de Papa".
Em 8 de abril, o feito foi ainda mais ousado. A ucraniana Alexandra Shevchenko, 25 anos, escureceu os longos cabelos loiros e despistou o aparato de segurança russo e alemão, ficando cara a cara com seu alvo, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, que era ciceroneado pela chanceler Angela Merkel em uma visita à feira industrial de Hannover. Ao ver a manifestante de peito aberto e punhos em riste, Putin apenas sorriu e, depois, para a ira do movimento, teceu um comentário:
- Gostei.
Nos últimos meses, o Femen vem reposicionando e reforçando sua atuação. Além do escritório em Kiev, onde se organizam desde 2008, criaram representações na França e na Alemanha e passaram a estampar notícias com protestos cada vez mais ousados - até saíram seminuas com bigodes de Hitler para associar a indústria do sexo ao nazismo -, sempre com a marca registrada, o topless.
Inna deixou a Ucrânia e se mudou para Paris depois de ter, em 17 agosto de 2012, derrubado com uma serra elétrica uma cruz no centro da capital de seu país em apoio às integrantes presas da banda russa Pussy Riot. Diz ter sido perseguida pelo Serviço de Segurança da Ucrânia depois daquilo e fugiu para a França despistando a vigilância. Lá, instalou uma filial maior que a matriz e que se transformou na sede do coletivo. Alexandra migrou para a Alemanha em janeiro e recruta ativistas pelos país.
Para fazer parte do Femen, as aspirantes aprendem a jamais rir em um protesto, a fugir de poses sensuais, a resistir à polícia, a gritar palavras de ordem ritmadas e estridentes e, o principal, a se mostrar furiosas.
A indignação do Femen começou com Anna Hutsol, Inna e Alexandra, ainda estudantes, em Khmelnytskyi, a oeste de Kiev, indignadas com a associação da beleza eslava ao turismo sexual - fenômeno que desabrochou com o fim da União Soviética. Despois, tornaram-se radicais contra, grosso modo, tudo que limite as liberdades femininas. "Somos contra o patriarcalismo na política, na religião, no sexo", definem.
Quatro pessoas dedicam-se só ao Femen. Vivem da venda de suvenires e de doações. Nos planos de expansão, sonham em se consolidar como organização de grande porte, mas sem vinculação "com a política suja", dizem. Segundo as fundadoras, contam com 300 ativistas e um número indefinido de pessoas que vestem a camiseta mas não tiram a roupa em público.
Núcleo brasileiro perde aval externo
Assim como atraem uma legião de fãs, especialmente pelas redes sociais, as ações do Femen - cuja tática é definida como "sextremismo" e que rejeita o feminismo "clássico" - despertam uma enxurrada de críticas. "A imagem das feministas como velhas senhoras, apartadas do resto do mundo, é um clichê antifeminista. É uma pena ver que é usado por ativistas que pretendem estar renovando o feminismo" - escreveu o autor Claude Guillon, citado pelo Le Monde diplomatique.
No Brasil, o grupo treinou a paulista Sara Winter, mas a parceria acaba de ser rompida. Sara usa os mesmos símbolos do Femen - a coroa de flores na cabeça, por exemplo - e diz liderar 14 ativistas. Segundo Alexandra, no entanto, o Femen Brazil, com página no Facebook, não é mais reconhecido por elas como parte da organização internacional, após desentendimento com Sara. As ucranianas, no entanto, prometem: os brasileiros ouvirão falar muito do Femen na Copa do Mundo de 2014.