Um levante contra o Talibã, iniciado recentemente nesta aldeia no sul do Afeganistão, hoje já se espalhou por dezenas de cidades, segundo moradores e autoridades afegãs e americanas, na mais importante virada popular contra os insurgentes islamistas nos últimos anos.
Desde o início de fevereiro, quando aldeões se juntaram às forças policiais para começar a expulsar os combatentes talibãs desta região rica em vinhedos e pomares no sul da cidade de Kandahar, centenas de moradores se uniram para apoiar o governo. Quase 100 anciões das aldeias prometeram, numa reunião pública na segunda-feira, manter o Talibã afastado conforme chega a nova temporada de combate - e bandeiras afegãs estão hasteadas nos telhados das aldeias, segundo moradores.
Nos últimos 18 meses, levantes isolados contra o Talibã foram relatados em diversas partes do Afeganistão. Mas a revolta no distrito de Panjwai é considerada importante por ser a primeira no sul do Afeganistão, no coração espiritual do movimento Talibã, onde a influência do grupo vinha resistindo apesar de repetidas operações de forças dos Estados Unidos e da OTAN.
Embora ninguém esteja afirmando que o Talibã está expulso para sempre deste distrito - os insurgentes prometeram um retorno vingativo e recentemente mataram dois homens na região -, o levante de Panjwai deu um exemplo do que pode ser conquistado quando o ressentimento local pelos militantes é acompanhado de um apoio confiável do governo.
Essas são boas notícias numa época pessimista, com o Talibã fazendo incursões em outros locais do país onde as tropas americanas estão em retirada.
Em entrevistas, aldeões e autoridades locais afirmaram que, embora o levante tenha surgido do ódio dos aldeões pela brutalidade talibã, ele foi possível devido ao crescente poder das forças de segurança afegãs e a uma força policial particularmente ativa na região.
O novo chefe da polícia no distrito de Panjwai, Sultan Mohammad, é de Zangabad, o nome da área ao redor, e sua nomeação em janeiro galvanizou o apoio local ao governo.
"Tem sido uma longa jornada. Mas para resumir, as pessoas chegaram ao seu limite e se cansaram do Talibã", declarou o Major General Robert B. Abrams, comandante dos Estados Unidos no sul, numa coletiva de imprensa com repórteres do Pentágono recentemente. Ele disse que, até agora, o Talibã só não foi expulso de quatro aldeias do distrito.
Forças americanas e afegãs conduziram uma campanha extenuante nos distritos de Kandahar desde o pico de 2010, quando milhares de tropas adicionais dos Estados Unidos foram enviadas ao Saul do Afeganistão.
Embora o Talibã tenha sido derrotado em áreas cruciais naquele ano, eles mantiveram controle da parte sul de Panjwai, nos aglomerados de aldeias de Zangabad e Sperwan, e permearam a região com bombas improvisadas e locais de emboscadas.
A fagulha veio no início de fevereiro, quando o comandante do Talibã na região, o mulá Noor Mahmad, de 35 anos, entrou nesta aldeia para prender homens. Ele bateu na casa de Hajji Abdul Wudood e exigiu a entrega de dois filhos, acusados de espionagem para o governo.
"Eles queriam massacrar meus filhos", afirmou Wudood numa entrevista no mês passado em sua casa. "Eles queriam levá-los ao deserto, onde possuem um tribunal e uma base."
Wudood, de 60 anos e ex-combatente mujahedin contra os soviéticos na década de 1980, já havia aguentado o suficiente. Ele e seus oito filhos decidiram resistir.
Vários aldeões que haviam perdido parentes para o Talibã se juntaram a eles. A aldeia já começara a ferver: três dias antes, o mesmo comandante talibã havia espancado agricultores que limpavam o canal de irrigação local.
Wudood buscou ajuda com o chefe de polícia do distrito, Sultan Mohammad, um velho colega mujahedin e parente por casamento. Juntos, eles criaram um plano para emboscar os talibãs.
Em 6 de fevereiro, eles atacaram uma base talibã numa aldeia vizinha. Setenta aldeões desarmados acompanharam a polícia, orientando-os pelos campos minados e agindo como vigias. Após um breve tiroteio, a polícia expulsou o Talibã, matando três homens e perseguindo os restantes pelo deserto.
Líderes locais em Kandahar expressam orgulho pelo sucesso do levante até agora, mas advertem que, se o governo não prosseguir com o maior apoio policial, o Talibã poderá voltar com mais força.
"Tudo depende do que o governo fará com essas pessoas", argumentou Hajji Agha Lalai, membro do conselho da província de Kandahar. "Se eles as apoiarem e equiparem, teremos uma revolução."
Líderes talibãs ficaram furiosos por perder Panjwai e vêm planejando sua volta ao distrito em reuniões na cidade paquistanesa de Quetta, segundo policiais e funcionários da inteligência.
Um comandante talibã, que falou sob condição de anonimato em entrevista por telefone, admitiu a perda de Panjwai, mas disse que o movimento está começando a infiltrar mais combatentes no sul do Afeganistão - junto aos trabalhadores que chegam para a colheita de papoula para ópio.
Recentemente, dois operários de uma construtora foram sequestrados e mortos em Panjwai. Seus corpos foram encontrados em aldeias diferentes perto do deserto onde ainda atuam combatentes do Talibã, segundo autoridades policiais.
Wudood disse ter recebido avisos de que o Talibã teria encomendado seu assassinato, mas se manteve desafiador.
"Desta vez não estou sozinho", afirmou ele. "Há milhares de nós em Zangabada e Sperwan. Eles não podem eliminar a todos. Somos os verdadeiros donos desta terra, os homens que nos atacam estão vindo de fora. Não temos medo. Vamos defender nossa terra."
The New York Times
Aldeias começam a combater Talibã no Afeganistão
Virada popular já é a mais importante contra os insurgentes islamistas nos últimos anos
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