Ele atendeu o telefone da Cooperativa de Catadores de Materiais Recicláveis de Assis, cidade do interior de São Paulo com cerca de 100 mil habitantes, dizendo que precisava dar uma "refrescada na cabeça". Depois de uma campanha entregando santinhos de mão em mão e andando pelas ruas em cima de uma moto, carregando uma caixa de som que pedia voto para os moradores, o catador de materiais recicláveis Nilson Antonio da Silva, 63 anos, o Nilson Pavão, chegou lá: foi eleito com 1.275 votos, o terceiro vereador mais votado da cidade.
Objetivo alcançado, Nilson agora sente o peso do cargo.
– É muita pressão. Gente pedindo emprego pra mim. Eu não tenho emprego pra dar pra ninguém – desabafa o catador, um pouco irritado com as entrevistas que teve de dar desde que foi eleito.
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Antes de recolher material para reciclagem, Nilson dirigiu caminhão de laranjas e trabalhou em uma fábrica de parafusos em São Bernardo do Campo,na mesma época em que Lula conquistava fama como líder sindical.
De volta a Assis, virou catador de papelão, profissão que sustenta há 20 anos. Ele é conhecido na cidade como o "Nilson do Cachorro", apelido dado após os moradores o verem primeiro acompanhado do vira-lata Neguinho, que faleceu, e agora do também vira-lata Pretinho. Ambos os animais ficavam em cima dos papelões enquanto Nilson puxava o carrinho. E foi com o discurso da luta pelos bichos que acredita ter conquistado a confiança da população.
Filiado ao PMDB há cerca de um ano, precisou dar um trato na aparência antes de entrar na disputa: cortou barba e bigode, seguindo orientação do partido, e fez uma campanha praticamente sem apoio financeiro. Recebeu apenas 27 mil santinhos da coligação que o elegeu.
– Eu ganhei a política na humildade. Sou uma pessoa trabalhadora, catador de papelão. Sou muito querido aqui em Assis – repete.
A renda que Nilson passará a ganhar como vereador foi ressaltada no noticiário: R$4.200,00 frente os atuais R$1.500 que recebe ajuntando material na rua e entregando à cooperativa. Mas ele garante que não foi pelo salário que brigou por um cargo na Câmara. Pelo contrário, diz que vai criar um projeto reduzindo os rendimentos dos vereadores.
A imagem de homem do povo, com ensino fundamental e discurso longe do português perfeito, incomodou alguns moradores de Assis. Comentários na internet diziam que Nilson, se eleito, viraria "massa de manobra" na Câmara. Ele nega que vá se dobrar aos interesses.
– Eu vou fazer a minha parte. Quero assinar os projetos a favor do povo. E não vou deixar ninguém passar por cima de mim – avisa.
Até o final do ano, Nilson vai tentar tirar uma folga na casa do irmão em Andradina, há 300 quilômetros de Assis. O tão sonhado "refresco" para a cabeça antes de assumir o cargo.