A revista satírica francesa de esquerda Charlie Hebdo, alvo nesta quarta-feira de um atentado devastador com armas automáticas, reivindicava seu lado provocante e era alvo constante de ameaças desde que publicou em 2006 uma série de charges de Maomé que indignaram o mundo islâmico.
Após a publicação das controversas caricaturas do profeta, inicialmente divulgadas pela revista dinamarquesa Jyllands-Posten, a redação da Charlie Hebdo vivia em estado de alerta.
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- Havia ameaças permanentes desde a publicação das caricaturas de Maomé -declarou o advogado da revista, Richard Malka, após o ataque desta quarta-feira por desconhecidos que abriram fogo com armas automáticas e que custou a vida de várias das figuras mais famosas da redação, incluindo Cabu, Charb, Wolinski e Tignous.
- Vivíamos há oito anos sob ameaças, estávamos protegidos, mas não há nada que possa ser feito contra bárbaros que invadem com kalashnikovs. É uma revista que apenas defendeu a liberdade de expressão, ou simplesmente a liberdade - acrescentou o advogado.
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A última edição da revista, lançada nesta quarta-feira, inclui na capa uma caricatura do escritor Michel Houellebecq, autor do polêmico livro Submissão publicado neste mesmo dia e que imagina uma França islamizada.
"Em 2015 perco meus dentes, em 2022 faço o Ramadã" afirma a caricatura do escritor na capa da Charlie Hebdo, cujos números se esgotaram nas bancas logo depois do atentado que deixou a França em estado de comoção. Outro desenho mostra o cartunista dizendo: "Em 2036, o Estado Islâmico entrará na Europa".
Após a divulgação em 2011 de uma edição que fazia piada com a sharia, ou lei islâmica, um atentado com coquetéis molotov incendiou parte da sede da revista no distrito 11 do leste de Paris.
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Ameaça permanente
Apesar disso, a Charlie Hebdo permaneceu fiel a sua linha de conduta e dizia não ser inimiga do Islã.
- Há provocação, como fazemos todas as semanas, mas não mais contra o Islã do que com outros temas - afirmou em 2012, após o atentado incendiário, seu diretor de publicação, Charb, que morreu no ataque desta quarta-feira.
Após o primeiro atentado de 2011, Charb e outros membros da redação viviam sob proteção policial e sua sede ficava sob custódia da polícia francesa.
- Prevíamos o pior, e o ministério do Interior havia avaliado as ameaças a tal nível que vivíamos sob proteção permanente, mas não foi suficiente - disse o advogado Richard Malka.
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O equivalente na França à revista argentina Humor ou à espanhola El Jueves, a Charlie Hebdo foi fundada em 1970, quando substituiu Hara Kiri, semanário que reivindicava seu tom "estúpido e malvado", fundado por Cavanna - que morreu no ano passado - e Georges Bernier.
A linha inicial era anticlerical e denunciava a ordem burguesa, mas buscava, principalmente, fazer seus leitores rirem com um humor corrosivo implacável.
Em 1970, misturando o drama de uma discoteca em que 146 pessoas morreram com o falecimento de Charles De Gaulle, a revista intitulou "Baile trágico em Colombey (a localidade onde o general morreu): um morto". O governo proibiu imediatamente a difusão da Hara Kiri.
Vídeo mostra terroristas executando policial na saída da sede:
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