Em meio à encruzilhada em que Hollywood se encontra, um filme surge como farol a iluminar o caminho a ser percorrido. É Gravidade, longa dirigido por Alfonso Cuarón que se passa quase que inteiramente no espaço e no qual praticamente não se vê ninguém a não ser os personagens de George Clooney e, sobretudo, Sandra Bullock. A estreia no circuito será nesta sexta-feira.
É um paradoxo interessante, este: as lindas imagens da Terra lá do alto dão uma ideia de grandeza, mas, ao colocar a vida em perspectiva, ressaltam sua insignificância diante do cosmo. A dramaturgia mínima se molda em torno de uma luta desesperada contra a morte quando a nave em que a dupla está é atingida por restos de um satélite. Ele é um astronauta veterano, experiente em situações de risco. Ela nunca antes havia visitado o espaço. É uma especialista em engenharia médica. Está lá para uma missão extraordinária - e precisa superar desafios para os quais nem imaginava estar preparada.
Trata-se de um filme de estúdio, mais do que de autor, ainda que esteja à vista a mão hábil de Cuarón - realizador que se destacou no México com o belíssmo E Sua Mãe Também (2001) e, em Hollywood, assinou Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban (2004), provavelmente o mais festejado longa da franquia do bruxinho. Contudo, antes que você se dê conta do sentimentalismo esquemático que marca as produções da indústria, terá ficado boquiaberto com o virtuosismo do balé de corpos para além da gravidade.
Começa com um espetacular plano-sequência de mais de 17 minutos. Depois, chamam a atenção sequências inteiras de ação, que de tão tensas fazem o espectador se segurar na cadeira, e também pequenos cortes de mestre como aquele que marca a transição de uma imagem do rosto apavorado da mulher para o seu ponto de vista, de dentro do capacete característico dos astronautas. Cabe ressaltar que tudo isso só é fruído à plenitude no Imax ou, no mínimo, no 3D - Gravidade talvez seja, entre todos os projetos de Hollywood, aquele que melhor aproveita os recursos que fazem da sessão de cinema algo único, incomparável, e que por isso estão salvando os grandes estúdios nestes tempos de download via internet e TVs de 60 polegadas.
Montanha-russa existencialista, Gravidade é a materialização de uma fórmula perfeita para resolver a equação que o cinema dos EUA tanto procura nos últimos anos: entretém o público em todos os sentidos, provocando nele as mais diversas sensações, do divertimento puro e simples àquele envolvimento que só as histórias com algum conteúdo são capazes de provocar.
Meio 2001 - Uma Odisseia no Espaço (pela valsa espacial), meio Lunar (pela reflexão sobre isolamento), o longa dirigido por Alfonso Cuarón não é exatamente uma ficção científica. Não apresenta distopias típicas do gênero e trata uma missão fora da órbita terrestre com uma ideia de realismo condizente com a evolução das pesquisas na área neste século 21. Convém, no entanto, ver o filme atento a alguns simbolismos. Não é à toa, por exemplo, que são os russos que provocam o acidente inicial e que a salvação, ao fim, pode estar ao alcance de uma estação espacial chinesa.
Seu humanismo pode ser diferente daquele de Avatar (2009), que tinha mensagens mais óbvias, mas tocava em causas mais nobres e urgentes. De todo modo, Gravidade é um avanço em relação ao filme de James Cameron apontado como marco inicial de uma nova Hollywood. Pode servir de modelo a um cinema que se pretende popular mas que não deve, como faz repetidamente, subestimar a inteligência do público.
Gravidade
(Gravity)
De Alfonso Cuarón. Com Sandra Bullock e George Clooney.
Drama, EUA, 2013. Duração: 90 minutos. Classificação: 14 anos.
Estreia nesta sexta-feira em todo o circuito, em salas com projeção 3D, convencional e Imax.
Cotação: 4 estrelas (de 5).
