
Uma semana após ser flagrada por câmeras de televisão chamando o goleiro do Santos Aranha de macaco, durante partida válida pela Copa do Brasil na Arena, a gremista Patricia Moreira da Silva, 23 anos, falou publicamente pela primeira vez sobre o episódio e pediu desculpas pela injúria racial. Acompanhada de seu advogado, Alexandre Rossato, em um hotel no Centro Histórico da Capital, ela demonstrou arrependimento. Muito emocionada, Patrícia deu uma declaração de apenas dois minutos (veja abaixo).
- Perdão de coração, eu não sou racista. Aquela palavra macaco não foi racismo, foi no calor do jogo. O Grêmio estava perdendo, o Grêmio é minha paixão. Eu largava tudo para ir ao jogo do Grêmio. Peço desculpas ao Grêmio, à nação tricolor, eu não queria prejudicar o Grêmio. Eu amo o Grêmio. Desculpas, perdão, perdão, perdão mesmo - disse ela, aos prantos.
"Macaco, no contexto do jogo de futebol, não se torna racista", diz advogado
Fragilizada pela grande repercussão dos últimos dias, que culminou com a exclusão do Grêmio da Copa do Brasil, Patricia retirou-se do hotel rapidamente e coube a seu advogado responder às perguntas de jornalistas. Ele explicou que a gremista "perdeu todo o contexto da vida" e já foi julgada socialmente. Ele espera que o caso se transforme em um marco contra o racismo.
- A manifestação tem o objetivo de mostrar o arrependimento e o erro cometido. Vai ser claramente demonstrado que não há racismo da parte dela. Macaco, no contexto dentro do jogo de futebol, não se torna racista, ainda mais com a intenção que existiu. Isso se torna um xingamento no mundo do futebol - argumentou Alexandre Rossato.
- A Patrícia perdeu a vida dela. Esse caso vai ser um marco para efetivamente terminar com o racismo. Estaremos sendo hipócritas se punirmos tão somente a Patrícia por esse ato. Ela foi julgada socialmente, independente do inquérito policial. Infelizmente, ela já está julgada - completou o advogado.
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"Ouvi dizerem macaco, negro, sujo", relata testemunha
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Além disso, ele revelou que Patrícia Moreira da Silva pretende se encontrar com o goleiro Aranha para pedir desculpas ao atleta do Santos. Porém, isso depende da vontade do jogador. Patrícia pode ser indiciada por injúria racial - crime afiançável, com pena de um a três anos de reclusão.
Assista ao vídeo do polêmico ato racista:
Inquérito policial deve indiciar suspeitos
Na última quinta-feira, Patricia prestou depoimento por mais de uma hora na 4ª DP. Ela confirmou ter usado a palavra macaco, mas garantiu que não tinha intenção de ofender o goleiro santista. De acordo com a Polícia Civil, os suspeitos identificados nas imagens devem ser indiciados. Ainda não há confirmação de quantos deles.
- Ela disse que foi no embalo da torcida, que costuma usar essa expressão nos cânticos - contou o delegado Cleber Ferreira, diretor da delegacia regional de Porto Alegre.
Patricia também relatou ameaças sofridas desde então. Em entrevista concedida a ZH, um dos irmãos dela, morador de Alvorada, na Região Metropolitana, disse que a jovem foi ameaçada de morte e estupro por mensagens no Whatsapp.
- Ela terá de se mudar, não tem mais condições de continuar no mesmo lugar (um bairro popular da zona norte de Porto Alegre). Queremos dizer ao Brasil que a Patricia não é racista, ela agiu errado, mas tem muitos amigos negros, somos pessoas humildes, não merecemos todo esse linchamento que está ocorrendo.
Um dia depois do episódio na Arena, a casa de Patricia foi apedrejada por um vizinho. Desde que foi vista chamando Aranha de macaco em imagens do canal ESPN, ela não retornou à residência por medo de represálias. Nesse tempo, ficou refugiada na casa de familiares.
As hostilidades, que motivaram a gremista a excluir seus perfis nas redes sociais devido a um "linchamento" público, não ficaram restritas apenas a Patricia. Uma das filhas do irmão dela, que é adolescente e colorada, chegou a faltar a escola temendo ser agredida.
"Macaco, negro, sujo"
Além de Patricia, o taxista Filipe Guilhon, 27 anos, que trabalhou como organizador na Arena no jogo Grêmio e Santos, prestou depoimento ontem. Ele ficou no setor da Geral e ajudou os policiais a identificar algumas pessoas que aparecem em imagens feitas no estádio no dia da partida. Segundo ele, um grupo pequeno de torcedores teria gritado diversos xingamentos racistas ao goleiro santista:
- Ouvi dizerem macaco, negro, sujo, mas não identifiquei de quem veio - disse o taxista, esclarecendo que o setor de onde partiram os gritos não era o mesmo onde estava Patricia.
Filipe foi agredido por torcedores que, irritados, tentaram invadir o gramado. Ele afirmou não ter prestado queixa sobre as agressões, que teriam sido motivadas pela irritação de alguns gremistas com a postura do goleiro do Santos.
As investigações seguem nesta sexta-feira, com os depoimentos do torcedor Bruno Pisoni Garcia e o empresário Clairton S. dos Santos, dono do Bar do Ito, frequentado por integrantes da Geral. Eles foram intimados após o depoimento de Rodrigo Rysdyk, o Alemão, líder da organizada.
VÍDEO: veja como foi a saída de Patrícia da delegacia: