Redação Donna
Há mais de 50 anos, os pais receberam um recado da literatura. Com a publicação do polêmico romance Lolita, do russo Vladimir Nabokov, famílias perceberam que o namoro entre adolescentes e adultos é possível, mas poucas vezes saudável.
À medida em que os ares contemporâneos surgiram, os adolescentes passaram a interpretar papéis cada vez mais adultos na vida real. E, mais uma vez, a arte distribuiu advertências – muitas implícitas – em obras como os filmes A Menina do Lado (1987), Beleza Americana (1999), Aos Treze (2003) e no próprio Lolita (em 1962 e em 1997). Há poucas semanas, foi um fato da realidade que assustou pais e mães: Eloá, 15 anos, seqüestrada pelo ex-namorado e, posteriormente, morta, começou a namorar Lindemberg aos 12 anos. Na época, ele tinha 20 anos.
Por mais que o visual das meninas entre 12 e 18 anos utilize mais elementos da sensualidade e o amadurecimento mais rápido em relação aos meninos induza a pensar que elas estão cada vez mais adultas, permitir o namoro com pessoas mais velhas é abrir passagem para os riscos, alertam especialistas. Devido à diferença de idade, o momento evolutivo de cada um dos parceiros é diferente, o que pode trazer mudanças no convívio familiar e no círculo de amizades, além do desejo de a adolescente querer antecipar a vida de adulto, experimentando o sexo, o álcool e as drogas, alerta o médico Ronald Pagnoncelli de Souza, autor do livro Para Entender o Adolescente.
– Uma jovem de 18 anos namorando um adulto de 25 anos é diferente de uma adolescente de 12 com um adulto de 25 anos. Certamente, o adulto terá uma enorme influência sobre a adolescente e domínio da situação – afirma Souza.
Lidar com a ansiedade precoce dos adolescentes de querer assumir uma grande paixão é um desafio que deve ser trabalhado desde cedo pelos pais. Para o médico psicanalista José Outeiral, a conversa franca e a imposição de limites desde a infância, sem o uso da violência e explicando os motivos com clareza, podem ajudar os filhos a entenderem que o namoro com um adulto ainda não é considerado apropriado.
– Na hora de explicar os motivos, é possível que o filho não aceite e se mostre irritado e provocativo. Mas, mais tarde, ele reconhecerá que o limite foi um gesto de carinho. Dizer sempre “sim” pode significar abandono e desleixo – explica Outeiral.
Se a resistência se confirmar, existe um outro (bom) argumento dos especialistas: o namoro entre adolescentes da mesma faixa etária pode ser permitido. Mas desde que os limites permeiem a relação.
Em busca da identidade e da paixão
No corpo, uma revolução de hormônios traz mudanças. No comportamento, surge a necessidade de ser adulto e a vontade intempestiva de encontrar uma grande paixão.
Na puberdade, as meninas, que até ontem eram crianças, ficam cada vez mais interessadas em entrar para o mundo dos adultos. Vestem-se com roupas da moda, participam de festas, não esquecem a maquiagem e, claro, como se sentem mulheres, querem encontrar o amor da vida delas. Os meninos também estão em busca de uma identidade, mas são, geralmente, mais infantis e têm o corpo menos desenvolvido que as gurias da mesma idade. E é a diferença entre eles o que justificaria, na opinião delas, a busca por guris mais velhos.
– A vida adulta é uma incógnita nesta fase. Os adolescentes não sabem o que fazer, então seguem algumas pistas de como é o mundo dos adultos: começam a beber, a sair, querem se apaixonar e se desvincular dos pais – explica a psicóloga clínica Márcia Tomasi.
Quando viver a adolescência resulta na relação amorosa com uma pessoa mais velha, como o apresentado em filmes como Lolita e Beleza Americana, se reedita uma situação do complexo de Édipo, que é a paixão que a criança tem por um dos pais, explica o médico psicanalista José Outeiral. Se esta fase ocorre muitas vezes, o adolescente, geralmente, busca fora da família o “objeto edípico” para namorar – o que resulta na paixão de estudantes por professores, por exemplo.
– Para fugir do incesto com os pais, os adolescentes transferem a paixão para outros adultos. Os pais devem se preocupar e ficar atentos quando a diferença de idade é muito significativa – diz Outeiral.
A intensidade da adolescência, mesclada com as descobertas da paixão e a idéia de ter um amor de verdade, pode trazer também a gravidez indesejada, o ciúme – um dos motivadores do seqüestro de Eloá, no mês passado, e dos atos de violência que a menina sofria – e até a pedofilia. Como os sentimentos desta faixa etária têm a ver com paixão, perde-se o juízo de realidade, e as emoções intensas tomam conta da vida, afirma Outeiral.
– É comum o surgimento do ciúme patológico e a necessidade de controlar a vida do outro porque as emoções amorosas são muito fortes neste período – diz o médico.