Mais do que um drama pós-apocalíptico, O Céu da Meia-Noite é um filme político. Com estreia nesta quarta-feira (23) na Netflix, o longa-metragem dirigido, produzido e estrelado por George Clooney aparenta ser apenas uma história sobre um cientista solitário lidando com o fim dos tempos. Mas a adaptação do romance Good Morning, Midnight, de 2016, de Lily Brooks-Dalton, consegue se encaixar em discussões a respeito da forma como a sociedade encara o coronavírus.
— Depois que terminamos de filmar, a pandemia veio, e ficou claro que a história realmente estava se desenvolvendo. Era nossa necessidade desesperada de estar em casa, de estar perto das pessoas que amamos e de nos comunicarmos com as pessoas que amamos — explicou Clooney, em coletiva de imprensa mundial, no início de dezembro, da qual GZH participou.
A solidão deste momento é ilustrada pela figura de Augustine Lofthouse (Clooney), astrônomo que decide viver isolado em um observatório no Círculo Polar Ártico. No início do filme, ambientado em 2049, as pessoas estão deixando a Terra, assolada por um mal desconhecido e mortal, rumo a lugares habitáveis no espaço sideral. Lofthouse, com uma doença terminal, opta por ficar sozinho e encarar as consequências.
Ao mesmo tempo, uma espaçonave acaba de deixar uma lua de Júpiter, após anos de expedição, para retornar à Terra. A tripulação com cinco astronautas (vividos por Felicity Jones, David Oyelowo, Kyle Chandler, Demián Bechír e Tiffany Boone) não faz ideia do caos no planeta, pois a comunicação foi perdida. Mas Lofthouse consegue contato com a missão e pede que eles desistam do retorno.
Segundo Clooney, a exploração de outras galáxias, calcada na evolução da ciência, encaixa-se também com o contexto mundial e político a respeito das vacinas contra a covid-19:
— Temos visto toda a raiva e o ódio despertando no mundo, a negação da ciência, e se continuarmos assim por, sei lá, 30 anos, não é difícil que a gente estrague tudo. O filme fala sobre isso nas entrelinhas.
Redenção
Quando parece que o cientista está completamente só, eis que uma garotinha surge no observatório. Deixada para trás na evacuação às pressas, Iris (Caoilinn Springall) é muda e acaba estabelecendo com Lofthouse um laço afetivo naquele cenário incerto. Iris ajuda o cientista a repensar o sentido da vida.
— O que estamos fazendo aqui? Por que estamos aqui? O que nós valorizamos? Curiosamente, essas são as questões que nos perguntamos nesta época estranha em que nos encontramos. É um drama de relacionamento muito íntimo sobre tentar criar uma conexão, sobre família e sobre ser pai — destacou Felicity Jones.
A personagem da atriz está grávida no meio da missão espacial, assim como Felicity à época. Ela soube disso depois de três semanas de filmagens e recorda que, mesmo com medo de ser cortada do elenco, sabia que precisava dar a notícia ao diretor.
— Ela me disse: “Tenho uma novidade, estou grávida”. Fiquei espantado! Foi então que veio uma ideia: pessoas ficam grávidas — recordou Clooney, aos risos.
O contorno da subtrama por conta da gravidez da atriz reforça a mensagem do filme. As gravações se estenderam até o início de 2020, quando a pandemia ainda estava no início.
— É um filme sobre redenção. De repente, veio uma personagem protegida pela equipe. Ficou infinitamente mais esperançoso. A redenção é algo que nos dá esperança. Todos nós nos sentimos responsáveis — finalizou Clooney.