Nem o melhor roteirista poderia imaginar um final como este. Quiseram os deuses do futebol que a terceira passagem do Grêmio pela Série B acabasse exatamente no mesmo palco onde terminou a segunda: em Recife, contra o Náutico. Desta vez, porém, num cenário muito longe da angústia vivida em 2005, na famosa Batalha dos Aflitos.
Outra grande diferença é que, por não ter tido um fim apoteótico, com pênaltis e expulsões, a travessia gremista pareceu mais desgastante, como se a tortura tivesse sido parcelada em 36 rodadas - e ainda faltam mais duas para cumprir tabela e encerrar oficialmente o calendário. Enfim, o Tricolor alcançou o objetivo da temporada.
Talvez com menos pompas do que se imaginava e bem menos sofrimento do que outrora. Contudo, onze meses depois de amargar a queda, o clube gaúcho retorna à elite do futebol nacional, desejando ter comprado um bilhete sem viagem de volta.
Fotos de Lucas Uebel/ Grêmio/ divulgação
Apesar de dispensas e contratações, Tricolor manteve Departamento de Futebol e comissão técnica de 2021
Manutenção Tricolor
A terceira passagem do Grêmio pela Série B começou diferente da cartilha vivida pela maioria dos clubes brasileiros rebaixados. Além de ter caído para a Segunda Divisão com pagamentos em dia e uma folha salarial beirando os R$ 15 milhões mensais, o Tricolor não promoveu uma reformulação no ambiente interno. Com mais um ano de mandato, o presidente Romildo Bolzan Júnior manteve a estrutura do departamento de futebol que havia encerrado 2021, sob a gestão de Denis Abrahão, Sérgio Vazques e Diego Cerri. Consequentemente, foi dada ao técnico Vagner Mancini e grande parte do elenco a oportunidade de recuperar suas imagens. A estratégia duraria pouco mais de dois meses.
Fotos de Marco Favero/ BD, Jefferson Botega/ BD/ Agência RBS e Lucas Uebel/ Grêmio/ divulgação
Antes mesmo do fim do Gauchão, a primeira troca de técnico no ano, com Roger Machado assumindo para a conquista do penta do estadual
Troca de comando
Ainda em fevereiro, após muita pressão vinda das arquibancadas e de redes sociais, foram anunciadas as rescisões do treinador e também do meia-atacante Douglas Costa, que passou de repatriação comemorada a "persona non grata" na Arena. A promessa de revitalização também chegou acompanhada de Roger Machado que, apesar da eliminação precoce na Copa do Brasil para o Mirassol, então time da Série C, logo em sua segunda partida, conseguiu engatar a primeira marcha. Com um futebol pragmático, um tripé de volantes no meio-campo, um zagueiro improvisado na lateral direita e muita bola aérea, o Tricolor venceu um Gre-Nal por 3 a 0 em pleno Beira-Rio, conquistou o título do Gauchão sobre o Ypiranga, de Erechim, e se formatou para a largada do campeonato.
Fotos de André Ávila/ BD e Mateus Bruxel/ BD/ Agência RBS, e Lucas Uebel/ Grêmio/ divulgação
Demorou três rodadas para, enfim, vir a primeira vitória na Série B, que teve largada com dois empates
Início turbulento
O início da Série B foi trôpego, empatando com a Ponte Preta, em Campinas, e perdendo para a Chapecoense, em casa. A vitória foi dar as caras somente na terceira rodada, sobre o Guarani, mas o avião gremista enfim decolou. Especialmente com atletas que já estavam no grupo e alguns da base. Dos reforços que desembarcaram, a maioria sequer assumiu a titularidade. Ainda assim, mesmo colecionando atuações decepcionantes, principalmente como visitante, adotando um trio de zaga em algumas ocasiões, o time enfileirou 17 jogos de invencibilidade - sendo destes, nove empates - e demarcou território no G-4 da competição. Entretanto, não houve calmaria plena, nem mesmo após a conquista da Recopa Gaúcha, com goleada sobre o Glória, em Vacaria. Até mesmo as eleições partidárias causaram turbulências, obrigando o presidente a manifestar publicamente que não seria candidato ao governo do Estado.
Nova troca na reta final da competição
Em busca de estabilidade, a diretoria visitou o passado para recontratar Thaciano, Guilherme e Lucas Leiva na janela de transferências do meio de ano. Mas as lembranças de conquistas recentes fizeram com que Renato Portaluppi tivesse seu nome evocado a cada fim de jogo. Até que, no primeiro dia de setembro, após uma sequência de três derrotas e um empate, foi feita a dissolução do comando do vestiário, mudando departamento de futebol e comissão técnica. Faltando 11 rodadas para o fim, Romildo trouxe de volta o maior ídolo gremista para comandar o time. E deixou vago o cargo de vice-presidente de futebol. O Tricolor chegou a ensaiar apresentações de muito brio, mas ainda precárias do ponto de vista técnico. Foi desta forma, em um misto de alívio e constrangimento, que o Grêmio deu adeus ao martírio da Série B.
Fotos de Lauro Alves/ BD, Jefferson Botega/ BD/ Agência RBS, e Lucas Uebel/ Grêmio/ divulgação
Os últimos jogos tiveram o comando de Renato Portaluppi, que retornou com a missão de resgatar a parceria clube-torcida
"Esse objetivo de colocar o clube na Série A me trouxe de volta. Estou aqui e vamos trabalhar bastante. Nosso torcedor sofreu bastante. Vamos dar de presente de Natal o retorno à Série A."
Entrevista de apresentação de Renato Portaluppi, no dia 5 de setembro de 2022