Como dar a destinação correta para o lixo

A limpeza de uma cidade também depende de sua população, pois são os cidadãos que iniciam o processo de destinação correta dos resíduos — recicláveis e orgânicos. Você está fazendo sua parte?

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REPORTAGEM

Bruna Vargas

EDIÇÃO

Eduardo Rosa
Rodrigo Müzell

DESIGN | ILUSTRAÇÃO

Edu Oliveira
Leonardo Azevedo

PROGRAMAÇÃO

Hermes Wiederkehr

Poucas políticas públicas exigem tanta cooperação dos cidadãos para serem efetivas quanto a limpeza urbana. Se ao poder público cabe o fornecimento dos serviços de coleta e uma destinação adequada aos resíduos produzidos pela população, somente uma participação direta das pessoas no momento de descartar o seu lixo pode garantir o bom funcionamento do processo.

A participação popular na gestão do lixo está prevista na lei: a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) institui a chamada responsabilidade compartilhada dos geradores de resíduos. Significa dizer que fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes, cidadãos e titulares de serviços de manejo dos resíduos sólidos urbanos são responsáveis pelo destino dos resíduos e embalagens pós-consumo.

— É uma relação conflituosa: as pessoas querem se ver livres do seu lixo, tirar o problema de perto. É preciso mudar a cultura de que o lixo não é problema seu. Todo mundo tem responsabilidade — destaca o doutor em ecologia e professor da Unisinos Jackson Müller.

A situação da Capital não é das piores. Segundo o Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana (ISLU), indicador que avalia a adesão de mais de 3,5 mil municípios à PNRS, Porto Alegre é a segunda capital do país que mais se aproxima daquilo que é estabelecido pela legislação federal: alcança 0,717 de 1 em uma análise de fatores que incluem o engajamento do município, a suistentabilidade financeira do sistema de coleta, a recuperação dos resíduos coletados e o impacto ambiental gerado pelo que é descartado de forma errada. Apesar de ter ficado apenas atrás do Rio de Janeiro entre as capitais, ainda há muito a melhorar: pelo menos R$ 9,3 milhões são gastos todos os anos para encaminhar ao aterro sanitário resíduos que poderiam ter sido reciclados.

Desde 2014, a legislação municipal prevê punição para quem joga lixo no chão ou o coloca em local inevido. Quem emporcalha a cidade pode receber uma multa que vai de R$ 361,26 a R$ 5.780,16. Desde que a lei começou a ser aplicada até abril deste ano, as infrações somam quase R$ 3,6 milhões. Desse montante, porém, pouco mais de R$ 770 mil chegaram aos cofres públicos. A própria aplicação da lei, de caráter didático, é dificultada por falta de estrutura: o Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU) conta com apenas 20 fiscais para atuar em toda a Capital.

Aprimorar o sistema e ter uma cidade mais limpa depende, e muito, de gestos simples: colocar o lixo em seu devido lugar e respeitar os horários e locais prestabelecidos pela prefeitura para efetuar os descartes pode contribuir não só com a melhora do aspecto geral da cidade como na identificação das falhas a serem sanadas pelo poder público. Além disso, racionalizar o consumo, pensando duas vezes antes de adquirir um produto ou optando por versões mais sustentáveis — como refis ou biodegradáveis — é atitude sempre bem-vinda para diminuir a geração de lixo.

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COMO DESCARTAR O LIXO ORGÂNICO

Resíduos orgânicos representam a maior parte do lixo produzido em Porto Alegre: 1.540 das 1.865 toneladas recolhidas pela coletas domiciliar e seletiva — mais de 80% do total — é de origem animal ou vegetal, como restos de alimentos, ou os chamados rejeitos (como papéis sujos ou engordurados e outros materiais que não podem ser reaproveitados). Por esse motivo, é na coleta desse tipo de resíduo onde são investidos os maiores esforços do poder público. Atualmente, a Capital conta com 2,4 mil contêineres, 3 mil lixeiras de rua — outras 2 mil aguardam instalação — e um serviço diário de recolhimento de lixo que contempla todas as vias da cidade.

Esse tipo de descarte é aparenemente mais simples, mas também o que mais custa aos cofres municipais. Somente para levar os resíduos recolhidos para o aterro de Minas do Leão, a mais de 90 quilômetros da Capital, o governo gasta em torno de R$ 115 por tonelada. Além disso, a falta de atenção ao descarte acarreta problemas: a mistura de lixo seco com o orgânico é frequente, e atrai catadores irregulares. Em busca dos resíduos recicláveis, muitas vezes, eles retiram parte do lixo de dentro do contêiner, sujando as vias onde há coleta automática.

— Teoricamente, nossa operação está bem constituída. Mas não acontece se a população não colaborar. Os catadores irregulares só entram nos contêineres porque sabem que as pessoas descartam errado. Se o lixo fosse segregado do jeito certo na origem, isso seria evitado — avalia Patrícia Russo, coordenadora de Gestão e Educação Ambiental do DMLU.

Conforme o DMLU, o principal desafio em relação à coleta de lixo orgânico é o gereneciamento de resíduos nas localidades onde ainda não há a coleta automática. Nesses locais, a comunidade deixa os sacos em pontos perto do horário prestabelecido para a passagem do caminhão de recolhimento. Ocorre que há moradores que efetuam o descarte fora do horário, muito antes da passagem da coleta, gerando focos de lixo.

— Temos uma dificuldade com as pessoas no sentido de compreenderem a logística: os caminhões têm uma rota controlada por GPS. Falhas na operação existem, é um serviço terceirizado, mas as adequações são feitas através do 156 — diz Patrícia.

Respeitar o horário da coleta, nesses casos, é a principal medida a ser cumprida para qualificar o serviço na cidade — é possível consultar os dias e horários da passagem do caminhão de coleta no seu endereço clicando neste link. Há, no entanto, comunidades que buscaram mecanismos para organizar o descarte e evitar o acúmulo de resíduos nas vias, como a instalação de lixeiras comunitárias.

Resíduos vegetais produzidos por Vivian Schäfer e pela família são recolhidos toda semana por uma empresa
Resíduos orgânicos transformados em adubo

Descartar os resíduos no lugar certo não é suficiente para a produtora audiovisual Vivian Schäfer. Moradora do bairro Menino Deus, ela buscava uma forma de reduzir o impacto de sua família na cidade quando descobriu os serviços da Re-Ciclo, empresa que utiliza resíduos orgânicos para a produção de adubo.

— Sempre gostei de coisas relacionadas à sustentabilidade. Tenho um sítio onde fazemos compostagem, mas não vou com tanta frequência para levar os resíduos que produzimos aqui, então foi uma grande alternativa — comemora.

Há cerca de dois anos, todas as cascas de alimentos, borra de café, erva-mate e outros resíduos vegetais produzidos por Vivian, pelo marido e pelo filho são armazenados em um baldinho e recolhidos uma vez por semana pela equipe da empresa, que leva o material para um sítio em Gravataí, onde, mais do que zerado, o "lixo" é reproveitado em forma de fertilizante. Após o processo de compostagem, feito no local, parte do adubo é utilizada na propriedade, enquanto outra parte é distribuída a clientes da empresa.

Atualmente, 160 famílias e 20 empresas da Capital adotam esse tipo de descarte. Fundada pela engenheira ambiental Natália Pietzsch e pelos sócios Filipe Ávila Soares e Thiago Rocha, a Re-Ciclo sobra uma taxa mensal a partir de R$ 45 para recolher o lixo orgânico das famílias toda semana — também é possível entregá-lo em pontos físicos. A cada mês, são distribuídas sacolas biodegradáveis e um mimo aos clientes: mudas de plantas, adubo e outros presentes relacionados à sustentabilidade estão entre os presentes.

A iniciativa partiu de uma inquietação pessoal de Natália: depois de, no mestrado, estudar o assunto lixo zero, pasosu a observar com olhar mais crítico para o tratamento dado ao lixo em Porto Alegre — que encaminha os resíduos orgânicos para o Aterro de Minas do Leão, a mais de 90 quilômetros da Capital.

— Restos de comida, grama, podas são recursos que a gente consegue transformar em adubo para produzir mais alimento. Pensei em buscar uma solução independente do governo, porque já imagina que iria demorar alguns anos para que houvesse essa consciência. E, às vezes, as pessoas não têm espaço ou tempo para ter uma composteira — conta.

Desde que iniciou os trabalhos, em 2016, até julho deste ano, a Re-Ciclo já coletou mais de 70 toneladas de resíduos orgânicos que seriam aterrados para serem compostados e transformados em fertilizantes. Além do serviço de coleta, a empresa produz e comercializa composteiras para quem quer fazer o processo em casa.

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COMO DESCARTAR O LIXO RECICLÁVEL

Consumir é gerar lixo. Embora produzidos em menor proporção que os orgânicos, resíduos como papéis de bala, pneus furados e latas de refrigerante, entre milhares de outros produtos e embalagens, são os que podem acarretar maiores problemas para o ambiente: alguns dos materiais levam centenas ou milhares de anos para se decompor, provocando um rastro de poluição incalculável, com consequências para as próximas gerações.

O reaproveitamento por meio da reciclagem é uma das alternativas mais difundidas para lidar com o problema. Além de gerar emprego e renda, a chamada logística reversa (quando um resíduos volta para a indústria e reingressa no ciclo produtivo), permite controlar a produção de mais produtos de difícil decomposição. Ocorre que esse processo é, necessariamente, uma via de mão dupla: para que um produto seja reaproveitado, é necessário que o consumidor efetue o descarte adequado.

Em Porto Alegre, a coleta seletiva é a responsável por encaminhar os resíduos recicláveis a uma das 17 usinas de triagem da cidade, onde são separados por tipo e recebem a destinação correta. Apesar do pioneirismo — a Capital foi uma das primeiras a adotar o sistema, 28 anos atrás — , os números mostram que ainda falta comprometimento da população com o descarte correto: todos os dias, 260 toneladas de resíduos que poderiam ter sido reciclados vão parar no aterro de Minas do Leão — no total, o município encaminha diariamente 1,8 mil toneladas de resíduos para o local. O custo dessa destinação incorreta é de aproximadamente, R$ 775 mil por mês, ou 9,3 milhões por ano que deixam de ser investidos na cidade — com esse valor, é possível bancar, por exemplo, a capina de quase 15 mil quilômetros de vias.

— As pessoas precisam ter consciência de que, no momento que estão comprando um produto, estão comprando também a embalagem, e tem responsabilidade sobre ela. O que vai para o aterro perde a chance de ser reciclado — Afirma Patrícia Russo, coordenadora de Gestão e Educação Ambiental do DMLU.

A lógica é relativamente simples: tudo o que não é de origem animal ou vegetal ou não estiver contaminado (como papel higiênico e guardanapos usados), tem potencial para ser reaproveitado. Basta retirar o excesso de resíduos — nos casos das embalagens de alimentos — e separá-los para serem entregues à coleta seletiva, que tem dia certo para ocorrer. Consulte os horários da coleta seletiva no seu endereço no buscador abaixo.

Consulte os horários da coleta seletiva no seu endereço

Endereço incorreto ou não encontrado.

Rua encontrada

Já os resíduos recicláveis produzidos na rua exigem um pouco mais de esforço do cidadão em Porto Alegre. Isso porque as 3 mil lixeiras que existem nas vias — outras 2 mil aguardam por instalação — servem apenas para o descarte de orgânicos. Nesses casos, há duas opções: levar o lixo para casa ou buscar um estabelecimento com um lugar adequado para esse tipo de descarte.

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COMO DESCARTAR OS RESÍDUOS ESPECIAIS

A cadeia do lixo é mais complexa do que apenas lixo orgânico e lixo reciclável. Existe uma série outros tipos de resíduos que, por terem características específicas — além de alto potencial poluente — precisam receber um destino diferente dos demais. Os chamados resíduos especiais englobam eletrônicos, seringas, gesso, medicamentos, pneus, pilhas e baterias, óleo de fritura e lâmpadas fluorescentes.

O descarte desse tipo de item pode se feito em unidades específicas do DMLU ou em dezenas de pontos de coletas espalhados pela cidade (que podem ser conferidos no mapa abaixo), entre eles ferragens, supermercados, farmácias e postos de saúde. Já os resíduos da construção civil são de responsabilidade do proprietário, que deve acionar uma empresa habilitada para retirá-los ou agendar uma coleta especial do DMLU por meio do 156. Nesses casos, um técnico da prefeitura fará uma visita para avaliar o material a ser retirado — o órgão recolhe caliça, restos de podas, terra, madeira, móveis, entulhos e animais mortos. O custo é de R$ 20 por metro cúbico.

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O BOM EXEMPLO

Condomínio no bairro Petrópolis aperfeiçoou a separação do lixo

Tudo começou com um puxão de orelha: no ano passado, um funcionário do Departamento Municipal de limpeza Urbana (DMLU) alertou um funcionário de um condomínio no bairro Petrópolis para que os moradores separassem o vidro dos demais resíduos, o que não vinha sendo feito, e oferecia riscos aos garis. A síndica Cristiane da Silva Santos prontamente providenciou a instalação de um contêiner a mais na "sala do lixo", aonde já eram armazenados secos e orgânicos até o dia da coleta. Aos poucos, no entanto, a separação de lixo foi ganhando mais atenção nas reuniões de condomínio.

— Cerca de um mês e meio atrás, uma moradora que é bióloga trouxe a ideia de fazermos a separação de outros produtos. Aí resolvemos tentar — conta Cristiane.

Aos três contêineres já instalados no local somaram-se lixeiras menores, destinadas a receber medicamentos, pilhas e eletrônicos. Alguns moradores ficaram responsáveis por levá-los até o destino correto quando os recipientes ficam cheios — à exceção dos eletrônicos, que são recolhidos por uma empresa contratada — , e o condomínio está orçando parcerias para o recolhimento dos resíduos no local.

Apesar das múltiplas opções, ainda são identificados problemas no descarte. Segundo Cristiane, não raro moradores misturam os lixos que são descartados nos contêineres. Embalada pela iniciativa sugerida pela moradora, a síndica resolveu tentar inspirar os condôminos, colocando dicas práticas sobre separação de lixo nos elevadores.

— Começamos uma campanha, e agora, de tempos em tempos, vamos colocar informações sobre como se descarta, o que se lava ou não, dando detalhes. É o que temos feito dentro das nossas possibilidades — conta.