Juliana Bublitz

Juliana Bublitz

Jornalista, mestre em Desenvolvimento Regional e doutora em História Social, ingressou no Grupo RBS em 1999. Participou de coberturas marcantes como repórter de GZH, ZH e Rádio Gaúcha.

Autocuidado
Opinião

"Ser livre e gentil comigo mesma": as resoluções de Ano-Novo de Virginia Woolf

Metas pessoais registradas nove décadas atrás pela escritora soam atuais e fazem sentido em pleno século 21

Juliana Bublitz

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Reprodução / Wikipedia/ Biblioteca da Universidade de Harvard
Virginia é uma das mais importantes escritoras do século 20.

"Ser livre e gentil comigo mesma". A meta para 2025 parece ter saído de um post do Instagram ou do Facebook, certo? Não deixa de ser verdade, porque o texto viralizou. Só que o registro foi escrito há 94 anos, por uma das escritoras mais brilhantes (e revolucionárias) do século 20: Virginia Woolf.

Em 2 de janeiro de 1931, a autora britânica destacou em seu diário (ela teve muitos, mais tarde transformados em livro) as resoluções de Ano-Novo. 

Além de estabelecer como prioridade o autocuidado (tão falado hoje em dia), ela decidiu que não se irritaria mais com nada, "pela garantia de que nada vale a irritação" (no texto original, há aqui uma pequena referência à funcionária Nelly, fiel escudeira que cuidava da casa da escritora...).

Ao final, arrematou:

"Às vezes ler, às vezes não ler. Sair, sim — mas ficar em casa apesar de ser convidada. Quanto a roupas, comprar boas.”

Impossível não se identificar. 

Ao mesmo tempo, chega a ser desconcertante pensar que metas pessoais registradas nove décadas atrás possam soar tão atuais e ainda fazer sentido em pleno século 21. A inteligência artificial já está moldando nossas vidas, mas os desejos de uma inglesa nascida em 1882 são parecidos com os meus (talvez até com os seus, ao menos em parte).

Virginia, é claro, não era um tipo comum. Tinha autonomia e independência financeira e se orgulhava disso. Costumava dizer que “uma mulher precisa ter dinheiro e um quarto só seu se quiser escrever ficção”. Ela tinha. E também tinha coragem. Desafiava julgamentos morais e cultuava as liberdades (intelectuais, sexuais, femininas).

Não por menos, foi uma das precursoras do feminismo, no sentido de apontar as condições desiguais entre os gêneros e as injustiças da época. Sua voz de vanguarda atravessou o tempo e, mesmo 83 anos após sua morte, cá está. É possível que um card com uma das frases dela tenha aparecido nos stories para você.

Virginia tinha razão. 

O melhor talvez seja nem mesmo ter resoluções (“para não ser amarrada a elas”, escreveu a autora), mas, na era em que vivemos, não fará mal olhar mais para dentro em 2025. 

É isso: olhar para si e para os seus mais do que para as redes sociais e suas vidas perfeitas, onde a grama é mais verde provavelmente por ser fake (li isso em algum lugar e achei genial). 

Que neste novo ano a gente se dê uma trégua.  

Às vezes ler, às vezes não ler. Sair, sim — mas ficar em casa apesar de ser convidada. Quanto a roupas, comprar boas. De preferência, de marcas locais.

Na íntegra

O que a escritora britânica registrou  em seu diário no dia 2 de janeiro de 1931:

“Aqui estão minhas resoluções para os próximos três meses.

Não ter nenhuma. Para não ser amarrada a elas. 

Ser livre e gentil comigo mesma, e não levar isso a festas (no sentido de "causar", provocar): sentar-me em particular lendo no estúdio.

Fazer um bom trabalho em As Ondas (romance experimental que ela lançaria em 1931, explorando os fluxos de consciência dos personagens, uma inovação à época)

Parar de me irritar pela garantia de que nada vale a irritação (referindo-se à empregada doméstica Nelly)

Às vezes ler, às vezes não ler. 

Sair, sim — mas ficar em casa apesar de ser convidada.

Quanto a roupas, comprar boas.” 

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