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Fernando Corrêa
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Leonardo Azevedo
Henrique Tramontina
e de te amar assim,
muito e amiúde
é que um dia em teu
corpo de repente
hei de morrer de amar
mais do que pude.
Vinícius de Moraes
Soneto do Amor Total (1951).
Na literatura, na música e no imaginário popular, amor é doença do coração que mata por excesso de vontade do outro. No mundo real, o que mata é ódio, discriminação e intolerância. Enquanto o futuro se anuncia com tendências tão diversas quanto sexo com robôs e famílias poliamorosas, um brasileiro sofre violência por hora por ser homossexual. Uma em cada cinco brasileiras já foi vítima de violência doméstica. Pensar o futuro do amor é pensar o futuro da civilização.
– Estamos em um momento de afirmar a tolerância como princípio. É o principal desafio, especialmente de quem trabalha com a Justiça: não deixar crescer as áreas de intolerância – aponta a juíza e escritora Andréa Pachá.
Por vezes, a Justiça e a lei institucionalizam a discriminação e a violência. Chegamos a 2015, e homossexualidade ainda é crime em mais de 60 países. Mulheres iemenitas precisam de autorização do marido para sair de casa; sauditas e marroquinas são responsabilizadas pelo próprio estupro.
A legislação, sozinha, não constrói respeito e cidadania. É preciso educar para a diferença. No Brasil que em 2006 sancionou a Lei Maria da Penha e em 2013 autorizou o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, crimes de ódio contra mulheres e homossexuais não parecem sensibilizar os setores mais conservadores da sociedade. Tacham de privilégio a concessão de direitos fundamentais a minorias.
– Além das amarras legais, temos de superar as amarras sociais – sintetiza o psicólogo Angelo Brandelli Costa, pesquisador da UFRGS e do Hospital de Clínicas, e por duas vezes consultor da ONU nas áreas LGBT e saúde.
A internet tem tornado cristalino o preconceito, facilitado pelo anonimato. A ONG SaferNet Brasil divulgou, no fim do ano passado, o aumento de 300% a 600% entre 2013 e 2014 no registro de crimes de ódio na rede, em sua maioria ligados à apologia à violência e à discriminação. Não é possível que se confunda liberdade de expressão com liberdade para agredir o próximo.
– O primeiro passo é que o discurso do ódio já é visto como negativo. Na Idade Média, fazia parte de ser uma pessoa. Hoje em dia já vemos que não é proveitoso para ninguém. Quem odeia é o primeiro a sofrer – afirma Clóvis Vitor Gedrat, professor de Filosofia da Unisinos.
Amemos mais uns aos outros, como amamos a nós mesmos.
EM TERMOS
poliamor
Movimento de pessoas que mantêm relações poligâmicas consensuais, hétero, homo ou bissexuais.
lovebots
Robôs do amor, capazes de emocionar-se e de seduzir, são aposta ousada de caras-metades do futuro.
família do futuro
Novas técnicas de reprodução, pais homossexuais, migração e pluriculturalismo devem ampliar o que se entende por “família”.
:: DE TRÁS PRA FRENTE
Cartum previu controle de natalidade como o que ocorre na China
Estados dos EUA proibiam casamento inter-racial no século 20
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A sociedade sempre se dividiu na hora de democratizar o amor. Era medo do divórcio, repulsa às relações inter-raciais, pavor da homossexualidade. Enquanto superamos aos poucos as avaliações equivocadas do passado, descobrimos que o presente é bem melhor do que previram os futurólogos pessimistas.
1987
A feminista americana Barbara Ehrenreich escreveu uma série de previsões sobre o futuro dos relacionamentos para a revista Omni de janeiro de 1987. “O sexo continuará estando no centro do palco nos próximos 20 anos”; “o sexo heterossexual será menos centrado na interação genital”; “pessoas passarão longos períodos de tempo fora de casamentos ou relações duradouras”; “nossas noções do que é sexualmente normal serão arcaicas em 20 anos”.
1982
Em 1982, Stephanie Mansfield projetou, em uma coluna bem-humorada no jornal The Washington Post, que relacionamentos entre humanos e robôs seriam comuns nos anos 2000. Cientistas identificavam na sociedade de consumo o fundamento da demanda pelos amantes androides: “Adquirimos pessoas como se adquiríssemos eletrodomésticos”.
1973
Em 1973, quatro anos antes de ser legalizado no Brasil, o divórcio era enquadrado pelos opositores entre os “valores comunistas”. “Qualquer tentativa de introdução da dissolução do vínculo matrimonial, que é o sustentáculo da família, e esteio da pátria, é pura subversão da ordem”, disse
à época o deputado
Jorge Arbage.
1970
Albert Ellis, no livro Prophecy for the Year 2000, de 1970, escreveu que casais do século 21 concordariam em ter relacionamentos extraconjugais eventuais, em vez de mantê-los às escondidas.
1960
Nos anos 1960, a antropóloga Margaret Mead previu que ciência e superpopulação levariam a um futuro em que as famílias seriam submetidas a controle de natalidade — como ocorre na China desde 1979.
1928
Em que pese não ter sido proibido como nos EUA, o casamento inter-racial era visto com maus olhos no Brasil ainda mais racista de um século atrás. Monteiro Lobato, em carta de 1928, dizia que “a mestiçagem destrói a capacidade construtiva”. Segundo o escritor, “era a vingança terrível do negro contra o português”.
1923
Em 1923, a feminista americana Mary Garrett Bay anteviu que, em 2022, graças ao acesso à educação, mulheres teriam seu papel de donas de casa atenuado e poderiam até exercer cargos políticos como a presidência.
1907
Com a instituição do casamento civil no Brasil, em 1890, passou-se a cogitar a adoção do divórcio. Em 1907, um leitor “previu o pior” no jornal gaúcho Echo do Sul: “Que interesse poderá sentir uma esposa pela família à qual não tem certeza de estar sempre ligada?”.
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