
Na infância, brincar é mais do que passatempo. É direito e necessidade vital para o desenvolvimento motor, cognitivo e emocional.
O brinquedo não é apenas um objeto. Oferece experiências que vão ajudar a criança a compreender o mundo, a interagir com os outros e até a lidar com frustrações.
Porém, diante da avalanche de opções nas prateleiras e nas propagandas digitais, o que realmente importa na hora de decidir o presente?
Para orientar na escolha dos pais para o Dia das Crianças, Zero Hora conversou com especialistas e reuniu dicas que ajudam a avaliar segurança, faixa etária, estímulo ao desenvolvimento e diversão.
Confira as dicas:
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Como escolher o melhor brinquedo para as crianças

O pediatra José Paulo Vasconcellos Ferreira, presidente da Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul, lembra que a brincadeira é a atividade essencial da infância.
— A profissão da criança é brincar. Então, a função da criança, seja de um ano, dois, três, quatro ou até 10 anos, é brincar. E a melhor coisa da brincadeira é a interação. A criança que não interage não se desenvolve de maneira adequada — resume.
Segundo ele, mais importante do que o preço ou a sofisticação do brinquedo é a qualidade do tempo que ele promove.
— Se a criança pudesse escolher, ela escolheria brincar com os pais. O problema é que muitos adultos não sabem mais como brincar e acabam substituindo esse momento por presentes, muitas vezes sem necessidade real — completa.
Simplicidade como segredo
Na contramão do apelo consumista, brincadeiras tradicionais como esconde-esconde, pega-pega, amarelinha ou jogar bola são poderosas ferramentas de aprendizado. Esses momentos estimulam habilidades motoras, criatividade e socialização sem demandar grandes investimentos.
— O grande segredo está na simplicidade. Uma bolinha comprada por poucos reais pode gerar inúmeras situações de interação, criatividade e coordenação motora. O essencial é que a criança participe, proponha e crie — reforça Ferreira.
A psicóloga Monica Rezende, do Grupo Mantevida, lembra que o brinquedo é um meio, não um fim em si mesmo.
— O brincar é um espaço de experimentação. A criança repete, erra, acerta, se desafia. Brinquedos simples podem ser tão ou mais potentes do que os caros porque oferecem espaço para imaginação — afirma.
Equilibre desafio e diversão

Ao escolher um brinquedo, é essencial avaliar o quanto ele desafia a criança de maneira adequada à idade. Jogos de encaixe, quebra-cabeças, blocos e tabuleiros, por exemplo, ensinam paciência e estimulam a atenção.
— O brinquedo ideal é aquele que estimula sem ser impossível. Ele deve trazer desafios compatíveis com a idade, permitindo que a criança se sinta motivada, mas sem gerar sensação de incapacidade. O equilíbrio entre desafio e diversão é essencial — explica Monica.
Ela lembra ainda que a indicação de idade na caixa deve ser observada, mas que o olhar dos pais também é fundamental.
— Cada criança tem seu ritmo de desenvolvimento. Não adianta forçar algo que ainda não faz sentido para ela — reforça.
O que está em alta hoje
Apesar do crescimento dos eletrônicos, brinquedos clássicos seguem no topo das recomendações dos especialistas. Blocos de montar, massinhas, bonecos, fantasias, jogos de tabuleiro e materiais de arte são os mais citados.
Há também uma valorização de produtos sustentáveis, feitos com madeira certificada ou materiais recicláveis.
— Poucos brinquedos de boa durabilidade podem ser mais vantajosos do que dezenas de opções descartáveis. Muitas vezes, um brinquedo simples pode ser explorado de inúmeras maneiras e estimular ainda mais a criatividade — destaca Monica.
Brinquedos e inclusão
No caso de crianças com necessidades especiais, adaptar a experiência é a chave. Ferreira explica que a brincadeira deve respeitar os limites físicos ou cognitivos, mas nunca deixar de estimular.
— Se a criança é cadeirante ou tem déficit visual, por exemplo, existem brinquedos que exploram o tato, a audição ou promovem a socialização em ambientes adaptados. O mais importante é estimular a criatividade dentro das condições daquela criança — reforça.
Ele destaca que, muitas vezes, recursos simples — como texturas diferentes, sons ou cores fortes — já fazem toda a diferença. A interação com professores e terapeutas pode ampliar as opções de forma segura.
LEGO como aliado no desenvolvimento

Entre as opções de brinquedos educativos, o LEGO aparece como um dos mais completos. Os blocos de montar estimulam coordenação motora fina, percepção espacial e raciocínio lógico, já que a criança precisa planejar, seguir etapas e organizar o pensamento para concluir uma construção.
Além disso, quando usado em grupo, favorece a socialização, a divisão de tarefas e a criatividade coletiva.
Outro diferencial do LEGO é a versatilidade. Enquanto alguns conjuntos vêm com instruções detalhadas para montar cenários, veículos ou personagens, há linhas voltadas à criação livre, que permitem que a criança dê vida às próprias ideias.
Essa liberdade de inventar ajuda a desenvolver autonomia, resolução de problemas e até regulação emocional, já que a montagem exige paciência e persistência.
Vale lembrar que o LEGO também conquistou espaço entre adolescentes e adultos. Muitos pais voltam a brincar junto com os filhos, seja por nostalgia, seja como forma de relaxamento.
Importante: respeitar a faixa etária indicada na embalagem garante tanto a segurança quanto a diversão.
Impacto das telas
Outro aspecto que tem gerado preocupação entre especialistas é o tempo que as crianças passam diante de telas, como celulares e tablets, muitas vezes desde a primeira infância.
Os profissionais alertam que a exposição precoce pode limitar oportunidades de interação, criatividade e desenvolvimento motor. Para Ferreira, a diferença entre atividades digitais e brincadeiras presenciais é evidente.
— A tela é em duas dimensões e coloca a criança apenas como receptora. Ela não cria, não interage. Por isso, disparado, o maior benefício que podemos oferecer é reduzir esse tempo e estimular atividades ao ar livre — defende.

Ao contrário do que se pensa, restringir o uso de eletrônicos não significa privar a criança, mas sim garantir que ela viva experiências mais ricas. Substituir algumas horas de tela por jogos de tabuleiro, massinha, blocos de montar ou atividades coletivas traz efeitos positivos para o desenvolvimento.
— Eletrônicos não substituem as brincadeiras tradicionais. Os eletrônicos podem complementar, mas o brincar tradicional continua sendo insubstituível para o desenvolvimento motor, social e imaginativo. O ideal é equilibrar os dois mundos — complementa Monica.
Consumo, frustração e limites
Se por um lado o mercado oferece lançamentos constantes, por outro os pais sentem a pressão de atender a todos os pedidos dos filhos. Segundo Ferreira, é justamente nesse contexto que se torna essencial estabelecer limites claros.
— Os pais têm medo de frustrar os filhos. Só que dizer "não" faz parte da educação. Quando damos tudo, ensinamos que o mundo não tem limites. E o mundo vai cobrar isso mais tarde. Ensinar sobre finitude e recursos é tão importante quanto brincar — explica.
Monica acrescenta ainda que o diálogo e o reconhecimento do que já existe em casa também são fundamentais para o aprendizado.
— Conversar sobre desejos, mostrar alternativas e valorizar o que já existe em casa ajuda a criança a compreender melhor suas necessidades. O essencial é o vínculo criado na brincadeira, não o preço do brinquedo — exemplifica.
Os pais têm medo de frustrar os filhos. Só que dizer "não" faz parte da educação. Quando damos tudo, ensinamos que o mundo não tem limites. E o mundo vai cobrar isso mais tarde.
JOSÉ PAULO VASCONCELLOS FERREIRA
Presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria do Rio Grande do Sul (SBP-RS)
Experiências que ficam na memória

Mais do que o brinquedo em si, o que marca a infância são as memórias criadas em torno da brincadeira. Ferreira costuma lembrar disso ao conversar com famílias e destacar o valor da experiência compartilhada.
— Quando perguntamos a um adulto sobre a infância, dificilmente ele lembra do brinquedo em si, mas sim da experiência. Brincar na rua, montar um jogo de tabuleiro com amigos, passar horas criando histórias é o que realmente fica na memória — relata o pediatra.
Monica reforça a mesma percepção e acrescenta que a presença ativa dos pais potencializa esses benefícios.
— Brincar juntos fortalece o vínculo afetivo, melhora a comunicação e cria memórias positivas. O brinquedo é um meio, mas o mais importante é a presença e a interação entre pais e filhos — conclui.
No fim das contas, o melhor presente não está dentro de uma caixa. O que crianças realmente querem — e precisam — é de tempo, presença e interação.
— A maior mensagem que podemos dar aos pais é que brinquem com seus filhos. Brinquedos são importantes, mas nada substitui a experiência de estar junto, de rir, de se sujar, de inventar. É isso que marca a infância e constrói um desenvolvimento saudável — resume Ferreira.
Passo a passo para escolher o melhor brinquedo
- Entenda a função do brinquedo: lembre-se que ele é um meio para aprendizagem, diversão e interação, não apenas um objeto de consumo
- Observe a idade recomendada: siga a faixa etária indicada na embalagem, mas leve em conta o ritmo individual da criança
- Priorize a simplicidade e a interação: brinquedos simples, que permitam criação e socialização, costumam ser mais eficazes que os sofisticados
- Avalie o desafio: o brinquedo deve estimular sem ser impossível, incentivando paciência, concentração e raciocínio
- Considere segurança: verifique materiais, tamanho das peças e normas de segurança, especialmente para crianças pequenas
- Prefira brinquedos duráveis e versáteis: produtos que podem ser usados de várias maneiras rendem mais aprendizado e diversão a longo prazo
- Equilibre diversão e aprendizado: escolha brinquedos que promovam criatividade, coordenação motora, atenção e interação social
- Inclua brinquedos adaptados, se necessário: para crianças com necessidades especiais, busque opções que explorem tato, audição ou cores, respeitando limites físicos e cognitivos
- Reduza a presença das telas: opte por brinquedos que estimulem a participação ativa da criança, evitando produtos que transformem a criança em mera espectadora
- Considere o LEGO e blocos de montar: eles são educativos, estimulam coordenação, raciocínio lógico, planejamento e trabalho em grupo, com opções para todas as idades
- Verifique custo-benefício real: mais importante que a quantidade ou preço é o quanto o brinquedo promove aprendizado, diversão e vínculo com a criança
Perguntas frequentes (FAQ) sobre como escolher o melhor brinquedo
Qual é a função do brinquedo na infância?
O brinquedo é um meio para aprendizagem, diversão e interação. Ele ajuda a criança a desenvolver habilidades motoras, cognitivas e sociais, além de criar memórias afetivas importantes.
Como saber se um brinquedo é adequado para a idade da criança?
Verifique a faixa etária indicada na embalagem, mas também observe o ritmo individual da criança. Cada criança tem seu próprio desenvolvimento e nem sempre um brinquedo indicado na caixa é adequado ao seu estágio.
Brinquedos simples podem ser mais eficientes que os sofisticados?
Sim. Brinquedos simples, que permitem interação, criação e socialização, muitas vezes promovem mais aprendizado do que eletrônicos caros ou brinquedos muito complexos.
Como equilibrar desafio e diversão ao escolher um brinquedo?
O ideal é que o brinquedo estimule a criança sem gerar frustração. Ele deve permitir que ela se sinta motivada a tentar, aprender e repetir, de acordo com suas capacidades.
Quais cuidados de segurança devo observar?
Confira materiais, acabamento, presença de peças pequenas (especialmente para menores de três anos) e selos de certificação, como o do Inmetro. A segurança deve ser prioridade absoluta.
Vale mais a pena comprar muitos brinquedos ou poucos de qualidade?
Poucos brinquedos duráveis e versáteis costumam ser mais vantajosos. Eles permitem múltiplas formas de uso, incentivam criatividade e reduzem o consumo excessivo e o descarte rápido.
Como lidar com o apelo dos eletrônicos?
Prefira brinquedos que promovam interação, movimento e imaginação ativa. Jogos digitais e tablets podem complementar, mas não substituem brincadeiras que envolvam socialização, criatividade e coordenação motora.
O LEGO é uma boa opção? Por quê?
Sim. Os blocos de montar estimulam coordenação motora fina, percepção espacial, raciocínio lógico, planejamento e criatividade. Além disso, podem ser usados em grupo, favorecendo socialização e divisão de tarefas.
Como escolher brinquedos inclusivos para crianças com necessidades especiais?
Opte por brinquedos que respeitem limites físicos, cognitivos ou sensoriais da criança. Recursos simples, como texturas, cores e sons, aliados à orientação de professores e terapeutas, aumentam as possibilidades de brincar de forma segura e estimulante.
Como garantir que o brinquedo contribua para o vínculo entre pais e filhos?
O mais importante não é o brinquedo em si, mas o tempo e a presença dos adultos. Brincar junto fortalece a relação, melhora comunicação e cria memórias positivas.
É possível oferecer bons brinquedos sem gastar muito?
Sim. Brinquedos simples, blocos, massinha, jogos caseiros e atividades ao ar livre podem oferecer grande aprendizado e diversão sem alto custo.
Como lidar com desejos constantes por lançamentos e novidades?
Ensine sobre consumo consciente, valorize o que a criança já tem e ofereça alternativas. É importante mostrar limites e finitude de recursos, ajudando a criança a compreender necessidades versus desejos.














