
O registro de uma ocorrência policial por um estelionato simples e um prejuízo de R$ 44,57, em 4 de agosto de 2024, levou à descoberta de um esquema nacional de um golpe virtual, com movimentações que podem chegar a R$ 20 milhões. Na ocasião, uma vítima foi atraída por uma campanha publicitária que prometia um "kit antirrugas grátis", supostamente recomendado pela modelo Gisele Bündchen. Ela pagou aos criminosos R$ 44,57 cobrados como "taxa de frete."
A Polícia Civil deflagrou nesta quarta-feira (1º) a Operação Modo Selva. O objetivo é desarticular uma organização criminosa especializada em fraudes eletrônicas, as quais utilizava "deepfakes" (síntese de imagens e sons humanos, baseadas em inteligência artificial) de celebridades para anunciar falsos produtos de beleza de marcas famosas.
Foram cumpridas 26 ordens judiciais, incluindo, sete prisões preventivas e nove mandados de busca e apreensão em cinco Estados: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Pernambuco, São Paulo e Bahia. Até o momento, quatro pessoas foram presas. No RS, um homem de 22 anos foi preso em Canoas, na Região Metropolitana. A ofensiva é coordenada pela Delegacia de Polícia de Investigação Cibernéticas Especiais (DICESP-DERCC).
— Durante a investigação se identificou uma organização criminosa atuante em todo Brasil especializada na prática de estelionatos virtuais e lavagem de dinheiro, que se valia das redes sociais para impulsionar as falsas campanhas, atingindo assim, um maior número de vítimas — explica o delegado Eibert Moreira Neto, diretor do Departamento Estadual de Repressão aos Crimes Cibernéticos.

A organização movimentou pelo menos R$ 20 milhões, com parte dos recursos vindo de uma plataforma falsa de apostas (bets), clonada a partir de sites regulamentados.
Também foi executado o sequestro e indisponibilidade de 10 veículos, bloqueio de 21 ativos — investimentos ou aplicações —, contas bancárias e carteiras de criptoativos, em valores que podem chegar a R$ 210 milhões.
Responsável pela investigação, o delegado Filipe Borges Bringhenti destaca o trabalho integrado entre polícia e Ministério Público, além da importância da sensibilidade do Judiciário diante da massificação dos golpes desta natureza. Ele menciona que os delitos têm escancarado a repercussão do prejuízo social e às vítimas:
Os criminosos, geralmente são muito jovens e sem registros criminais. São atraídos pela promessa de uma vida luxuosa. Alguns podem estar expandindo as ações para fora do território nacional, inclusive. Por não ser um crime violento, eles têm a falsa ideia de impunidade, que esses crimes não levam à prisão. Nosso trabalho está aí para mostrar que há, sim, sérias responsabilizações
FILIPE BORGES BRINGHENTI
Delegado responsável pela investigação

Como funcionava o esquema
A Polícia Civil revelou um modus operandi sofisticado, que combinava tecnologia avançada com métodos tradicionais de lavagem de dinheiro. O esquema operava em quatro fases:
Criação de conteúdo fraudulento: utilizando deepfake, os criminosos produziam vídeos falsos com celebridades como Gisele Bündchen, promovendo produtos inexistentes.
Divulgação massiva: os vídeos eram espalhados por perfis falsos nas redes sociais. Um dos principais usava o nome fictício “Dra. Bianca Oliveira”, com dados falsos e conexão via VPN americana para ocultar a localização dos golpistas.
Captura das vítimas: interessados eram direcionados a sites fraudulentos, onde forneciam dados pessoais e realizavam pagamentos via Pix.
Lavagem de dinheiro: os valores eram distribuídos por empresas fantasmas e contas de “laranjas”.

Os personagens do esquema
A investigação identificou uma estrutura hierárquica bem definida, com cada integrante desempenhando funções específicas:
Líder do esquema: responsável pela criação dos deepfakes e pelo desenvolvimento de toda a estrutura técnica dos golpes.
Operador financeiro: responsável pela articulação financeira, controlava múltiplas contas bancárias e coordenava a movimentação dos valores obtidos com os golpes.
Facilitador de pagamentos: controlava o processamento das transações fraudulentas.
Influenciadora do crime: impulsionava os golpes e promovia jogos de azar ilegais. Funcionava como uma "multiplicadora" do alcance criminoso - quando os golpistas criavam conteúdo fraudulento, simplesmente a marcavam nas publicações para que aparecessem em seu perfil, atingindo dezenas de milhares de pessoas.
Ostentação
A ostentação era parte do estilo de vida dos investigados. A polícia identificou veículos como Porsche Cayenne S, Range Rover Velar, BMW 430i e motocicletas BMW.
Tecnologia do crime
O grupo usava VPNs internacionais, e-mails criptografados, dispositivos compartilhados e técnicas para burlar sistemas de verificação bancária (KYC).
Vítimas invisíveis e subnotificações
A maioria das vítimas não registrava ocorrência. Por envolver valores baixos — entre R$ 20 e R$ 100 — muitos preferiam “engolir o prejuízo”, conforme a polícia. Ainda de acordo com a polícia o grupo explorava a vulnerabilidades de pessoas idosas e com menor conhecimento digital.
Conforme a polícia, os suspeitos devem responder pelos delitos de estelionato com fraude eletrônica, organização criminosa, lavagem de dinheiro e contravenção penal (jogo de azar).
Fique atento
- Desconfie de promoções "imperdíveis" protagonizadas por celebridades;
- Verifique sempre a autenticidade dos perfis que divulgam ofertas;
- Pesquise a reputação da empresa em sites como Reclame Aqui antes de comprar;
- Nunca forneça dados pessoais ou realize pagamentos sem confirmar a legitimidade da oferta;
- Denuncie imediatamente qualquer suspeita de golpe, mesmo que o valor seja baixo.
Mais informações: DICESP/DERCC
Contato: (51) 3288-9818
E-mail: dercc@pc.rs.gov.br




