Familiares de vítimas da Boate Kiss protestaram contra a decisão do Tribunal de Justiça, que reduziu as penas dos condenados pela tragédia. A mudança jurídica ocorreu nesta terça-feira (26), após os desembargadores julgarem recursos das defesas dos quatros réus do processo.
Os advogados queriam a anulação do júri do caso, o que não foi concedido pelo tribunal. Em caso negativo, solicitavam tempo de condenação menor, o que foi acatado pelos desembargadores (veja abaixo como ficaram as novas penas).
O grupo de familiares se deslocou de Santa Maria, no centro do Estado, para acompanhar a sessão durante a manhã, em Porto Alegre.
No início da tarde, após a decisão, os familiares organizaram uma manifestação com narizes de palhaço em frente ao tribunal.
— Sinto cansaço e revolta, mas não vou desistir de lutar. Vamos até o último suspiro. Foi injusto reduzir as penas — disse Maria Aparecida Neves, 66 anos, que vestia uma camiseta com a foto do filho, Augusto Cézar Neves, 19 anos, que morreu no incêndio ocorrido em janeiro de 2013.
O presidente da Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), Flávio Silva, afirmou que o grupo não acreditava em uma anulação do júri. No entanto, a redução da pena dos condenados foi inesperada:
— Essa decisão é inaceitável. Mataram 242 filhos nossos e tiveram suas penas reduzidas. É a história que se repete: a polícia prende, o juiz solta. E, nesse caso, o júri condenou e o tribunal amenizou a pena. É muito triste — desabafou.
Segundo Silva, o grupo quer levar o assunto para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em busca de um aumento nas penas dos quatro condenados:
— Nossa associação vai continuar lutando, trabalhando para reverter essa situação, até a última instância. Há um cansaço em cima de nós, que tivemos nossos filhos assassinados. Temos de resistir, buscar vontade para lutar por mais alguns anos — pontuou o presidente.
Quais são as novas penas
- Elissandro Callegaro Spohr (sócio da boate): 12 anos (antes condenado a 22 anos e seis meses)
- Mauro Londero Hoffmann (sócio da boate): 12 anos (antes 19 anos e seis meses)
- Marcelo de Jesus dos Santos (músico): 11 anos (antes 18 anos)
- Luciano Bonilha Leão (auxiliar da banda): 11 anos (antes 18 anos)
Como foi a sessão
O julgamento ocorreu na 1ª Câmara Especial Criminal do Tribunal de Justiça, a segunda instância da Justiça gaúcha.
A relatora, desembargadora Rosane Wanner da Silva Bordasch, deu parcial provimento aos recursos das defesas e recalculou a dosimetria das penas estabelecidas no júri popular, realizado em dezembro de 2021.
Ela também recusou a tese defensiva de que a decisão dos jurados foi contrária às provas dos autos.
O voto da relatora foi acompanhado pelos desembargadores Luiz Antônio Alves Capra e Viviane de Faria Miranda. A sessão foi conduzida pelo desembargador Luciano André Losekann, presidente da Câmara. Cabe recurso da decisão.
Contrapontos
Defesa de Elissandro Callegaro Spohr
"O Escritório Jader Marques Advocacia, responsável pela defesa de Elissandro Callegaro Spohr, recebeu com serenidade a decisão da 1ª Câmara Especial Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Respeitamos o entendimento dos desembargadores e registramos que a decisão corrige, em parte, o excesso anteriormente fixado. A defesa seguirá atenta às próximas etapas processuais, atuando sempre com fundamento técnico e confiando nas instituições. Reiteramos, sobretudo, nossa solidariedade às famílias de vítimas da tragédia da Boate Kiss, conscientes da dimensão humana desse caso que marcou a história do país.
Porto Alegre, 26 de agosto de 2025
Jader Marques Advocacia"
Defesa de Luciano Bonilha
"A defesa de Luciano Bonilha Leão sai parcialmente satisfeita com o julgamento ocorrido na data de hoje, queríamos outro júri porém já ficamos satisfeitos com a redução da pena que colocará Luciano em um regime mais brando porém a defesa reafirma: Luciano é inocente!"
Defesa de Mauro Hoffmann
"Após o julgamento dos recursos ocorrido nesta terça-feira, no TJRS, o Escritório Cipriani, Seligman de Menezes e Puerari Advogados, que representa Mauro Hoffmann no processo referente ao incêndio na Boate Kiss, segue convicto da inexistência de dolo eventual e da mais absoluta necessidade de um novo Júri Popular.
Com relação à redução das penas, entendemos que, com essa decisão, estabeleceu-se, enfim, uma pena adequada, proporcional e que respeita as boas práticas jurisprudenciais sobre o tema, mas ainda injusta, pois Mauro não praticou fato doloso.
Desde o início desse longo e doloroso processo, ao sustentar que não se tratava de um caso de dolo eventual, propusemos, inclusive, uma medida alternativa que geraria penas próximas, o que faria com que esse processo já tivesse se encerrado há muito tempo, sem a necessidade de um julgamento tão difícil para todos os envolvidos e tão oneroso para os cofres públicos.
Nossa prioridade, agora, é comunicar nosso cliente da decisão e encaminhar os devidos recursos de liberdade, considerando-se que já há cumprimento de pena por tempo suficiente para a progressão de regime.
Depois, vamos aguardar o acórdão completo para decidir quais rumos serão tomados. Não descartamos a possibilidade de recurso ao STJ e de embargos no TJRS."
Defesa de Marcelo de Jesus dos Santos
"A defesa de Marcelo manifesta-se após o Julgamento do Recurso de Apelação o qual readequou a pena para 11 anos de reclusão em regime fechado.
A defesa aguardará que seja disponibilizada a decisão da 1ª câmara criminal especial para solicitar a progressão ao regime semiaberto de Marcelo ao juiz da Execução de Santa Maria o qual é competente pela execução penal.
Salienta-se que Marcelo já está preso há 2 anos 6 meses 7 dias, pois sempre trabalhou, estudou, realizou cursos e leituras, implementando o tempo exigido por lei para poder usufruir do regime mais ameno."
Ministério Público
Já o Ministério Público vai analisar o processo para definir se apresentará recurso.

