Éverton Greef, 34 anos, deitou-se no banco do carro durante o intervalo do trabalho em São José do Sul, no Vale do Caí. Sob a sombra de uma árvore, pôs o pé para fora enquanto mexia no celular, à espera da hora de visitar o próximo cliente.
— Não vejo nada que represente risco aqui. É bom descansar tranquilo, sem se preocupar com a segurança — relatou Greef, que mora em Teutônia, na mesma região.
A percepção de segurança é comum entre os moradores da cidade de 2,2 mil habitantes. Os registros oficiais corroboram: São José do Sul é um dos 15 municípios gaúchos sem casos de homicídios, feminicídios e latrocínios desde 2002. O levantamento foi feito por Zero Hora a partir de dados da Secretaria da Segurança Pública, que começou a compilação e divulgação dos dados naquele ano (veja abaixo quais são os outros 14).
Localizado a 82 quilômetros de Porto Alegre, o município de São José do Sul foi criado em 1996 e tem origem ligada à colonização alemã no Estado. A economia tem como base a produção de aves, suínos, bovinos, ovinos, leite e frutas cítricas. O principal acesso é pela BR-470.
No início da tarde de terça-feira (13), as concunhadas Maria Beatriz Griebeler, 70 anos, e Irani Maria Griebeler, 69, tomavam chimarrão em frente ao comércio da família. Questionadas, elas tiveram dificuldade de relatar problemas relacionados à segurança.
— Moro há mais de 50 anos aqui e não lembro de nenhum (crime grave). Pode haver algum furto, mas é resolvido, não fica se agravando — disse Maria Beatriz.
Morador de São José do Sul há três anos, Jorlei Hudson, 50, estava dentro do carro, em frente ao posto de saúde, por volta do meio-dia. Mexia no celular enquanto esperava o retorno do filho.
— Aqui é um paraíso. Um lugar exemplar para morar — resumiu o auxiliar de produção que antes residia em Ampére, no Paraná.
São José do Sul não possui Secretaria Municipal de Segurança. O tema é tratado em conjunto por outras pastas da administração. Segundo a prefeita Juliane Bender, o senso de comunidade é decisivo para o baixo número de ocorrências.
— Somos uma cidade pequena, onde todos se conhecem e há uma relação próxima entre vizinhos. Quando algo diferente acontece, chegam pessoas novas, as pessoas se falam, comentam. Não precisamos estar trancados entre grades — explica a prefeita.
Segundo ela, a prefeitura investirá R$ 120 mil para ampliar o monitoramento por câmeras no município. O processo está em fase de estudo.
Ter menos habitantes não significa que crimes não aconteçam. Há 63 municípios com população inferior à de São José do Sul que registraram ao menos um homicídio, latrocínio ou feminicídio no período analisado pela reportagem.

Atenção coletiva à segurança
Silvania Cristina Weschen, 52 anos, mantém viva a lembrança de uma onda de furtos em propriedades da região em 2018. A situação motivou uma reunião entre moradores e autoridades. Uma das iniciativas foi a criação de grupos de WhatsApp para monitorar situações suspeitas. A professora criou um deles, que tem a participação de brigadianos.
— Não é um grupo para dar “bom dia”, “boa noite”, apenas para usar quando necessário. Sempre que alguém daqui vê algo estranho, um carro rondando, pessoas estranhas indo e voltando, já colocam essa informação no grupo, e todos ficam atentos. A Brigada Militar costuma vir logo em seguida, temos comunicação direta com eles — conta Silvania.

Cinco ocorrências de crimes registradas no ano
Neste ano, não foram registrados boletins de ocorrência de crimes como furto, furto de veículo, roubo, abigeato, delitos relacionados a armas e munições, além de tráfico e posse de entorpecentes.
A quantidade de ocorrências informadas à polícia pode ser contada nos dedos de uma das mãos: um roubo de veículo e quatro casos de estelionato.
— É extremamente positivo não precisar atuar rotineiramente em crimes como latrocínios, homicídios e feminicídios. Isso permite que a Brigada Militar concentre esforços em ações preventivas, no policiamento comunitário e na aproximação com a população. Os principais ganhos são a qualidade de vida e a sensação de segurança — disse o capitão Allan Marques, do 5º Batalhão de Polícia Militar (5º BPM), responsável pelo policiamento em São José do Sul.
O município também registra poucos casos de violência contra a mulher. Segundo dados da SSP, houve uma tentativa de feminicídio em 2021. Em 2025, há três registros de ameaças.
— Fazemos um trabalho com a nossa Secretaria da Saúde e o Cras (Centro de Referência de Assistência Social) para fortalecer o vínculo da mulher com o município, para que ela busque ajuda quando precisar. Hoje temos brigadianas, que faz a mulher se sentir mais segura para informar qualquer situação anormal dentro de casa — acrescenta a prefeita.
Outros municípios da lista
Além de São José do Sul, outros 14 municípios não registraram homicídios, latrocínios e feminicídios desde 2002, segundo os dados da SSP. O número representa 3% dos 497 municípios gaúchos.
Cinco deles estão no Norte: Barra do Rio Azul, Engenho Velho, Lagoa dos Três Cantos, Nova Boa Vista e Vila Lângaro. O Vale do Caí tem mais dois representantes: Alto Feliz e Maratá. Integram a lista Canudos do Vale e Travesseiro, no Vale do Taquari, Linha Nova e Montauri, na Serra, Boa Vista do Incra e Bozano, no Noroeste; e Presidente Lucena, no Vale do Sinos.
A lista compreende locais com pequena população. Engenho Velho é o com menor número de habitantes: 1.296. Presidente Lucena é o mais populoso, com 3.077, segundo dados do Censo Demográfico 2022.
População dos 15 municípios (Censo 2022):
- Alto Feliz (Vale do Caí): 3.072
- Barra do Rio Azul (Norte): 1.696
- Boa Vista do Incra (Noroeste): 2.271
- Bozano (Noroeste): 2.151
- Canudos do Vale (Vale do Taquari): 1.656
- Engenho Velho (Norte): 1.296
- Lagoa dos Três Cantos (Norte): 1.738
- Linha Nova (Serra) 1.683
- Maratá (Vale do Caí): 2.470
- Montauri (Serra): 1.499
- Nova Boa Vista (Norte): 2.042
- Presidente Lucena (Vale do Sinos): 3.077
- São José do Sul (Vale do Caí): 2.285
- Travesseiro (Vale do Taquari): 2.152
- Vila Lângaro (Norte): 2.079