
O desembargador e presidente do Conselho de Comunicação do Tribunal de Justiça do RS, Antônio Vinícius Amaro da Silveira, afirmou que o Núcleo de Monitoramento do Perfil de Demandas monitorava pelo menos desde 2022 ações movidas pelo advogado Daniel Nardon, investigado pela Polícia Civil suspeito de contratar empréstimos fraudulentos e praticar a chamada "advocacia predatória".
Segundo o desembargador, o Tribunal possui uma ferramenta para avaliação de riscos e que sinaliza indícios de fraudes nos chamados processos repetitivos. Essas ações, ao serem distribuídas às varas, recebem uma espécie de "etiqueta", que sinalizam possibilidade de ser advocacia predatória.
— Eu sei de casos mais antigos, inclusive eu como juiz tive experiências negativas com esse mesmo escritório. E também agora, na jurisdição, segue acontecendo e são inúmeras as diligências que se determina perante à Ordem dos Advogados do Brasil — afirmou o magistrado.
Amaro ainda disse que em janeiro do ano passado a OAB havia pedido informações para instruir processos administrativos contra o advogado Daniel Nardon. Conforme apurado por Zero Hora, por mais de uma vez juízes de primeiro grau perceberam suspeita de advocacia predatória nos processos e negaram ações. Existem casos de 132 processos movidos em nome de apenas uma pessoa.
Ganho com honorários
Outras situações que chamam atenção são processos com valores irrisórios, de R$ 16,02, por exemplo. Todos com pedido de assistência jurídica gratuita, o que lesa também os cofres do Judiciário.
— O que o advogado normalmente busca com essas ações não são os R$ 16, por óbvio. Sim o ônus de sucumbencial que decorre. O banco, invariavelmente é condenado, se procedente a ação, a pagar honorários. E é aí que parte a premissa do enriquecimento do escritório — explicou Amaro. Em alguns casos observados pela reportagem, os honorários de sucumbência eram entre R$ 1,8 mil a R$ 2 mil, o que gerava ganhos expressivos com a quantidade de ações movidas.
Alertas enviados
Além dos próprios alertas internos do Judiciário, o advogado Diogo Teixeira — que representa parte das vítimas — havia expedido ofícios ao núcleo de demandas e ao setor de inteligência do TJ alertando sobre a prática abusiva.
Um desses documentos, encaminhado em novembro de 2024, lista uma série de casos suspeitos. Ele afirma ter encaminhado também informações à Justiça Federal. A reportagem apurou que o Tribunal de Justiça de São Paulo também abriu expedientes para monitorar as ações no Estado.
Além de lesar as vítimas, a advocacia predatória ainda provoca sobrecarga no sistema do Judiciário, o que pode provocar atraso em processos legítimos.
— Por vezes, o advogado, e não falo apenas este, mas existem alguns, que ao invés de propor uma ação para discutir vários itens de uma relação, entram com várias ações para discutir um item em cada. Isso realmente onera e muito o Judiciário, causando valência de ações que acabam sobrecarregando e prejudicando as demais ações de um conteúdo mais sólido — completou Amaro da Silveira.
A orientação do desembargador é que as pessoas assinem procurações apenas com devidos fins, dando poderes limitados ao advogado, com descrição da ação a ser movida.
Operação "Malus Doctor"
A Polícia Civil estima que 10 mil pessoas foram lesadas por um suposto golpe promovido por advogados no Rio Grande do Sul. De acordo com a investigação, procurações judiciais eram fraudadas pelos suspeitos, que contratavam empréstimos em nome de clientes, sem que as vítimas soubessem. Estima-se que o grupo tenha movimentado R$ 50 milhões.