
Milhares de ações movidas na Justiça de São Paulo pelo advogado Daniel Nardon foram sinalizadas com suspeita de "repetição da ação" no momento da distribuição para as varas que julgariam o processo. Essa medida ocorria de forma automática, no primeiro evento dos processos.
O sistema também indicava às partes qual era o outro processo semelhante, para que o magistrado fizesse o confronto das informações. A depender do entendimento, o juiz poderia dar prosseguimento à nova ação ou unificar com a anterior.
Nardon é suspeito de liderar um grupo que cometia fraudes em empréstimos contra clientes. Na quinta-feira (8), foi alvo da Operação Malus Doctor, da Polícia Civil, e desde então está foragido.
A consulta pública pelo número da OAB do advogado indica que existem ao menos mil ações em São Paulo. Diversos processos chegaram a ser protocolados no dia 7 de maio, um dia antes da operação. Com a suspensão do registro na OAB e os alertas emitidos, alguns processos começaram a ser suspensos até que os autores indiquem um novo advogado com procuração feita em cartório.
Procurado, o Tribunal de Justiça de São Paulo disse que não é possível informar quantas ações foram suspensas, pois são informações que constam dentro de cada um dos processos.
Além disso, Zero Hora apurou que, em sentença no ano passado, um juiz da comarca de Taubaté (SP) já havia encaminhado ofício ao Núcleo de Monitoramento de Perfil de Demandas (Numopede), que monitora ações judiciais "em razão da evidenciada prática de advocacia predatória".
No Rio Grande do Sul, o Numopede monitorava pelo menos desde 2022 ações movidas por Nardon, e o sistema do Tribunal de Justiça (TJRS) também apontou indícios de irregularidades por repetição de processos.
Justiça gaúcha orienta suspensão de ações
No Rio Grande do Sul, duas notas do Tribunal de Justiça e da corregedoria-geral orientam magistrados a suspenderem as ações com envolvimento de Nardon, inclusive aquelas que ele transferiu para outros advogados. Somente uma advogada teve 96 mil processos passados para seu nome.
A orientação também indica que novos advogados só sejam cadastrados caso seja emitida nova procuração assinada com firma reconhecida ou verificada pelo portal Gov.br.
Como funcionaria o esquema
A operação da Polícia Civil mirou um grupo de advogados suspeitos de fraudar ações judiciais e lesar clientes por meio da contratação de empréstimos bancários. A polícia identificou até agora 55 vítimas, mas estima-se que cerca de 10 mil pessoas tenham sido lesadas. Os alvos eram, em sua maioria, servidores públicos e aposentados. A movimentação é calculada em R$ 50 milhões.
De acordo com a investigação, procurações judiciais eram fraudadas pelos suspeitos, que contratavam empréstimos em nome de clientes, sem que as vítimas soubessem. O escritório de advocacia captava clientes prometendo questionar, na Justiça, o juro de empréstimos.
Contudo, em vez de receber o valor de eventuais indenizações, os clientes recebiam o valor decorrente de um novo empréstimo, enquanto o escritório ficava com o dinheiro obtido no processo judicial.
Os suspeitos captavam clientes por meio de associações de defesa do consumidor, sendo uma delas coordenada pela irmã de Nardon.