Ao menos 10 mulheres foram vítimas de feminicídio no Rio Grande do Sul em novembro deste ano. O mês foi o segundo em 2024 com maior número de assassinatos desse tipo — em janeiro tinham sido 12. No comparativo com o mesmo período do ano passado, houve aumento dos casos. Em novembro de 2023, tinham morrido seis vítimas, o que representa acréscimo de 66,6%.
Os crimes aconteceram em oito municípios, sendo em Porto Alegre o maior número de registros, com três casos. Os indicadores de violência contra a mulher foram divulgados na quinta-feira (12) pela Secretaria da Segurança Pública (SSP) do Estado, no Palácio Piratini. O governo estadual reconhece que o combate aos feminicídios segue como o maior desafio nessa área.
Medidas foram adotadas nos últimos anos, com intuito de tentar conter esse tipo de crime no RS. Entre elas, está a instalação de tornozeleira eletrônica em agressores, além de outras, como a Patrulha Maria da Penha, da Brigada Militar, que monitora as mulheres vítimas de violência.
Um dos gargalos ainda é conseguir que as vítimas busquem ajuda antes que a violência atinja o ápice, resultando num feminicídio. Das 10 mulheres mortas em novembro, somente uma delas tinha medida protetiva de urgência em vigor e outra chegou a ter esse tipo de proteção judicial, mas não estava mais vigente. A maior parte das vítimas assassinadas nesse contexto em novembro no Estado não havia registrado ocorrência contra o agressor.
Quando se analisa o período de janeiro a novembro, no entanto, no comparativo com o ano passado, há menos casos no acumulado. Foram 77 em 2023 e 65 neste ano.
Estatística corrigida
Nas estatísticas divulgadas pela SSP, apareciam 11 feminicídios consumados, no entanto, segundo a Polícia Civil, um dos registros em Cruz Alta, na verdade, trata-se de um caso no qual a vítima não morreu. A mulher foi atacada pelo ex-companheiro com uma faca em casa. Após ferir o rosto dela, o homem tirou a própria vida.
Inicialmente, o autor foi identificado como vítima no registro policial, pois ambos os fatos, suicídio e feminicídio tentado, constaram na mesma ocorrência. Posteriormente, o registro de tentativa de feminicídio foi corrigido pela polícia, e o homem passou a constar como autor do fato (o suicídio foi registrado numa nova ocorrência). No entanto, a morte já havia sido contabilizada na estatística estadual. Os dados são atualizados periodicamente pela secretaria e os indicadores devem ser corrigidos.
O número de casos de tentativa de feminicídio mais do que dobrou em novembro no RS. Foram 28 registros de crimes desse tipo nos quais as vítimas sobreviveram — no mesmo período do ano passado no Estado, tinham sido 12.
Linha do tempo
Dia 1º – Canoas
Edilene Silveira Sartori, 38 anos, desapareceu no dia 1º e teve o corpo encontrado enterrado no pátio de casa dias depois. Segundo a polícia, a mulher foi assassinada com golpes de pesos de academia e mais de 15 facadas. O namorado dela, Edson Luiz de Jesus, 41, foi preso preventivamente. Segundo a delegada Angélica Giovanella, as amigas procuraram a polícia no dia 3 de novembro, para informar o desaparecimento. O suspeito do crime também foi ao local e disse ter procurado Edilene em unidades de pronto atendimento e hospitais da região. Conforme a polícia, não havia registro de ocorrência de violência doméstica, nem pedido de medida protetiva pela vítima. Edilene deixou três filhos, de outro relacionamento.
Dia 9 – Imbé
Daiane Flores Souza Gomes, 40 anos, foi morta a tiros pelo ex-companheiro na praia de Imbé, no Litoral Norte. A vítima estava morando com a mãe, no balneário de Albatroz, desde que se separou de Lenoir José Gomes, 61, policial militar da reserva. Na tarde de sábado, acompanhado do filho do casal, ele teria ido até a residência para conversar com a ex-mulher. Em determinado momento, enquanto a vítima estava no banheiro, o homem foi atrás dela e efetuou disparos de arma de fogo. A mulher morreu no local e, em seguida, ele se suicidou. Conforme a polícia, a vítima não havia feito nenhuma registro anterior e não havia solicitado medida protetiva contra o ex-companheiro.
Dia 10 – Monte Alegre dos Campos
Evelin Silva da Silveira, 20 anos, foi encontrada morta às margens da Estrada Geral, em Monte Alegre dos Campos. O corpo foi localizado por volta de 21h. A mulher foi assassinada com um disparo de arma de fogo. O suspeito do crime, que era namorado da vítima, foi preso quatro dias depois, de forma preventiva. O homem de 23 anos foi encontrado em Vacaria, na Serra. Segundo o delegado Vitor Fernando Boff, o casal se relacionava havia cerca de três anos e não havia registro de violência doméstica. Os dois teriam ido a uma festa antes do crime. A suspeita da polícia é de que o homem não aceitou a decisão da vítima de terminar o relacionamento.
Dia 13 – Cruz Alta
Jéssica Alf Pereira, 33 anos, foi encontrada morta por volta das 15h dentro da residência onde vivia, em Cruz Alta, no noroeste gaúcho. A casa está localizada na Rua Aloi Olders, no bairro Abegay. A vítima estava grávida de oito a nove semanas, segundo a polícia. O namorado dela inicialmente procurou os policiais para relatar o desaparecimento de Jéssica.
O homem alegou que homens armados teriam invadido a casa onde os dois estavam para cobrar dívidas de drogas. Ele disse que conseguiu escapar, mas a namorada não. Ao ir até a casa da vítima, a Brigada Militar encontrou o corpo da mulher. Segundo a Polícia Civil, ao ser interrogado novamente, o namorado acabou confessando que ele mesmo havia matado a mulher. A vítima não tinha medida protetiva e nem registro de ocorrência contra o homem.
Dia 15 – Porto Alegre
Eliane Alves da Rosa Orestes, 35 anos, foi morta a facadas na Avenida Professor Oscar Pereira, próximo da Avenida Niterói, no bairro Medianeira, na zona sul da Capital. O companheiro dela foi preso em flagrante pelo crime, portando uma faca. Durante a noite, moradores das proximidades ouviram uma discussão na rua. A Brigada Militar foi chamada e, quando chegou ao local, encontrou a vítima caída sobre a calçada. Segundo os policiais, a mulher apresentava perfurações na altura do peito. Tanto a vítima, como o suspeito do crime, viviam em situação de rua. Segundo a Polícia Civil, ela já havia registrado ocorrências contra o homem e obtido medida protetiva de urgência, que, no entanto, não estava mais em vigor.
Dia 18 – Rio Grande
Suelen Fontoura Figueiredo, 41 anos, teve 60% do corpo queimado pelo namorado, em Rio Grande, no sul do RS. O crime ocorreu no dia 18 de novembro, no bairro São João. O homem teria usado álcool para atear fogo à vítima. Ele foi preso de forma preventiva pelo crime. Segundo a polícia, o homem, de 59 anos, possui antecedentes por lesão corporal. A vítima, de 41 anos, não tinha ocorrência registrada contra o companheiro e nem pedido de medida protetiva. A Brigada Militar foi acionada, após populares verem a mulher pedindo socorro na rua. Aos policiais, a vítima relatou que o responsável pelas queimaduras seria o seu namorado. A mulher permaneceu internada por alguns dias, mas não resistiu aos ferimentos.
Dia 21 – Porto Alegre
Clarissa Nunes Gonçalves, 46 anos, ficou sozinha por alguns instantes no bar do qual ela era dona, no bairro Costa e Silva, na zona norte de Porto Alegre. O curto tempo bastou para que o ex-companheiro, de 55 anos, ingressasse no local e a alvejasse com dois tiros. Testemunhas ouviram os disparos e viram o homem saindo do local de moto. O filho do casal, de 27 anos, ouviu os estampidos e desceu as escadas, quando deparou com a mãe sem vida.
O casal estava separado desde fevereiro. Antes de matá-la, o ex já tinha atingido a vítima com um tiro de raspão. O homem fugiu após esse episódio e Clarissa obteve medida protetiva em 6 de setembro. A residência da mulher passou a ser monitorada pela Patrulha Maria da Penha da BM. Em 13 de novembro, ela teria informado que o homem não havia a importunado mais. Após o crime, o ex tentou suicídio e foi hospitalizado.
Dia 24 – Porto Alegre
Stefani Prestes Pehl, 18 anos, foi morta no bairro Farrapos, zona norte de Porto Alegre. Ela foi atingida por um tiro no ombro, na Rua Battistino Anele, por volta das 18 horas e morreu no local. O autor do disparo, conforme a polícia, foi namorado da vítima, um adolescente, que foi apreendido. Ele foi encaminhado à Delegacia da Criança e do Adolescente (Deca) e autuado por ato infracional análogo ao crime de feminicídio e tráfico de drogas, pois foram encontradas porções de cocaína e maconha. O caso foi encaminhado ao Ministério Público. A arma do crime, um revólver calibre 38, foi apreendida. Em seu depoimento, o adolescente permaneceu em silêncio.
Dia 25 – Tapejara
Ana Maria Venâncio Baretta, 24 anos, foi morta a facadas em Tapejara, no norte do Estado. O companheiro dela, de 30 anos, foi preso no mesmo dia do crime. Segundo a polícia, a vítima morava havia pouco mais de um ano no município. Ela e o suspeito estariam separados, mas ele teria dito que foi para Tapejara a pedido da ex-companheira, para ajudar a cuidar dos dois filhos do casal, de seis e oito anos. Durante a madrugada, por volta das 2 horas, os dois teriam discutido e o homem teria atingido Ana com golpes de faca no peito e no pescoço. Segundo a polícia, o homem confessou o crime após ser capturado.
Dia 26 – Três de Maio
Thalia Alessandra dos Santos Assunção, 18 anos, morreu após ser atingida por um disparo de arma de fogo no peito, no bairro Santa Maria, em Três de Maio. O companheiro da vítima foi preso no local. Segundo a polícia, o suspeito alegou que os dois estavam discutindo e que uma arma – uma pistola de calibre 380 – teria disparado acidentalmente e atingido Thalia. Na casa onde aconteceu o crime, viviam ainda dois filhos da vítima. As crianças estavam na escola quando a mãe foi morta.
Como pedir ajuda
Brigada Militar – 190
- Se a violência estiver acontecendo, a vítima ou qualquer outra pessoa deve ligar imediatamente para o 190. O atendimento é 24 horas em todo o Estado.
Polícia Civil
- Se a violência já aconteceu, a vítima deverá ir, preferencialmente à Delegacia da Mulher, onde houver, ou a qualquer Delegacia de Polícia para fazer o boletim de ocorrência e solicitar as medidas protetivas.
- Em Porto Alegre, a Delegacia da Mulher na Rua Professor Freitas e Castro, junto ao Palácio da Polícia, no bairro Azenha. Os telefones são (51) 3288-2173 ou 3288-2327 ou 3288-2172 ou 197 (emergências).
- As ocorrências também podem ser registradas em outras delegacias. Há DPs especializadas no Estado. Confira a lista neste link.
Delegacia Online
- É possível registrar o fato pela Delegacia Online, sem ter que ir até a delegacia, o que também facilita a solicitação de medidas protetivas de urgência.
Central de Atendimento à Mulher 24 Horas – Disque 180
- Recebe denúncias ou relatos de violência contra a mulher, reclamações sobre os serviços de rede, orienta sobre direitos e acerca dos locais onde a vítima pode receber atendimento. A denúncia será investigada e a vítima receberá atendimento necessário, inclusive medidas protetivas, se for o caso. A denúncia pode ser anônima. A Central funciona diariamente, 24 horas, e pode ser acionada de qualquer lugar do Brasil.
Defensoria Pública – Disque 0800-644-5556
- Para orientação quanto aos seus direitos e deveres, a vítima poderá procurar a Defensoria Pública, na sua cidade ou, se for o caso, consultar advogado(a).
Centros de Referência de Atendimento à Mulher
- Espaços de acolhimento/atendimento psicológico e social, orientação e encaminhamento jurídico à mulher em situação de violência.