Antes de sair de casa, você checa se está com os documentos e percebe que sua carteira não está na bolsa. Procura em meia dúzia de lugares e conclui: foi roubada. RRRR! Sai de casa atrasado e sem dinheiro. Pega o carro, encontra um enorme congestionamento e, para piorar, um motorista fecha sua frente. RRRRRRR!!! Se não bastasse, outro bate na sua traseira, xinga você e se recusa a pagar o conserto. RRRRRRRRRRRRRRR!!!!!! Como um dia assim pode começar bem sem fazer de sua cabeça uma panela de pressão?
Contar até 10, respirar fundo e manter a calma seriam atitudes prudentes, mas... manter a calma é difícil. Já que a paciência, assim como o tempo, é um elemento em vias de extinção, que tal aproveitar essa reportagem para refletir sobre o impacto que a raiva (sua e a dos outros) está trazendo para o seu dia a dia?
Considerada pelos psicólogos uma emoção natural ou inata, como a alegria ou o medo, a raiva é uma causa do comportamento e pode variar de leve irritação à fúria ou violência. É sentida após injustiça, bloqueio e restrição. Por exemplo, a interrupção de uma atividade ou um objetivo. Ou como uma reação à estimulo aversivo, a uma calúnia ou até insulto e indignação moral, ataque, perda ou ameaça. Segundo a psicóloga Ana Paula Dozza, da Associação Brasileira de Psicossomática, nem sempre essas causas estão claras, mas podem estar implícitas ou mesmo relacionadas a um evento do passado:
- A raiva é resistente ao controle humano. Pode ser destrutiva quando não encontra expressão apropriada. Passa a perder a objetividade e a prudência, causando danos a si próprio e aos outros.
Mas antes de sair por aí tentando se comportar como um Buda é preciso ter em mente que a raiva tem a sua função, e precisa ser extravasada. Conforme Ana Paula, reprimir a irritação podem ser a origem de muitos problemas de saúde, já que a raiva ativa o sistema nervoso simpático e põe o corpo em estado de alerta. Se, em decorrência de estresse no trabalho, por exemplo, você não conseguir ficar zen, medidas automáticas do sistema nervoso e processos hormonais são ativados. Como resposta, o corpo fica tenso e sofre distúrbios cardiovasculares, inclusive com hipertensão arterial, enfraquecendo o sistema imunológico.
Então, a questão não é ter ou não ter raiva, mas como administrá-la. Eliminar esse sentimento e seus prejuízos, segundo os psicólogos Les Carter e Frank Minirth, é um propósito que não pode ser alcançado apenas pelo ponto de vista racional. Em seu recente livro O Manual da Raiva, os autores apontam que o caminho é governar a estabilidade emocional pelo cultivo de valores saudáveis. Uma situação comum trazida pela raiva, segundo eles, é cair nas armadilhas da fúria, como tristeza constante e depressão.
- Por sermos imperfeitos em um mundo imperfeito, é certo que vamos encontrar essa emoção com alguma regularidade. Conforme passamos a conhecer e entender o seu processo, o controle sobre ela se torna simples - afirmam.
Terapia pacífica no saco de pancadas
Uma das principais maneiras de extravasar energias negativas e revertê-las em algo bom é o esporte. Lutar contra um saco de pancadas, por exemplo, é uma demonstração de como a agressividade pode ser extravasada. Embora a técnica e a força sejam elementos que pesam no mundo das lutas, o que mais vale é autoconfiança, coragem, respeito. Mensagens como essas são a essência das aulas de taekwondo do professor Leandro Nery, na academia Action Marcial Arts, em Porto Alegre. Segundo ele, muitos alunos procuram na modalidade uma forma de autodefesa e autoconhecimento, mas acabam aprendendo uma filosofia de vida:
- Quem é agressivo com os outros é por que não tem domínio da própria força. Age assim porque lhe falta confiança, respeito e coragem, valores que procuramos disseminar aqui.
Em um ambiente totalmente voltado para a disciplina, Nery explica que há espaço para quem quer ser agressivo com o outro. Ao contrário: ele explica que a arte marcial tem influência do ioga por causa da respiração, e está mais voltada a formar cidadãos autoconfiantes do que campeões individualistas e frustrados.
Irmão de Leandro, Leonardo Nery tornou-se mestre na arte marcial e há anos dissemina sua filosofia nos Estados Unidos. Segundo ele, o trunfo da luta é ensinar o indivíduo a transformar o pensamento negativo em positivo e orientar a si mesmo diante de situações difíceis:
- A luta ajuda a liberar a raiva em um saco de pancada e evita que a pessoa redirecione para outros focos, como o alcool e as drogas.
Segundo Leandro, há dois tipos de raiva mais comuns: a súbita (que surge quando alguém xinga e você perde o controle)e a periódica (que é permanente, e deve ser condicionada através de programa de treinamento). Em suas diversas manifestações, a raiva aparece como um alarme, que sinaliza algo a ser trabalhado internamente:
- Nessas horas, é preciso fazer exercício de respiração profunda, dar uma caminhada, mudar a linha de pensamento. Ela deve ser dominada, e não deve dominar você _ diz o mestre.
A arte como alicerce do corpo e da alma
QUE RRRRRRAIVA!
Domine seus sentimentos antes que eles prejudiquem você
Como a raiva pode afetar a sua saúde e o que fazer para não perder o controle
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