
Durante anos, o omeprazol foi visto como um aliado cotidiano contra a azia e a queimação. O pequeno comprimido, tomado logo pela manhã, parecia inofensivo e, para muitos, virou hábito.
Mas o entendimento mudou. Hoje, especialistas reforçam que, embora eficaz, ele não deve ser usado de forma contínua sem acompanhamento.
Segundo o gastroenterologista Jerônimo De Conto Oliveira, professor da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), o omeprazol e outros fármacos da mesma classe — conhecidos como inibidores da bomba de prótons (IBPs) — têm papel importante, mas precisam de critério.
— Esses medicamentos reduzem a produção de ácido do estômago e são úteis no tratamento do refluxo gastroesofágico, da dispepsia e das úlceras gástricas ou duodenais. O problema é que muitas pessoas seguem tomando por tempo indeterminado, mesmo quando os sintomas já passaram — explica o médico, que atua na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre.
De acordo com Oliveira, os IBPs, entre eles omeprazol, pantoprazol, esomeprazol e lansoprazol, foram uma revolução no tratamento das doenças do estômago. Ainda assim, o uso prolongado deve ser exceção, não regra.
— O omeprazol é bastante seguro, mas o uso contínuo sem indicação médica não é recomendado. Para quem precisa dele pontualmente, o ideal é usar por um período de um a três meses, dependendo do caso — afirma.
Segundo o médico, apenas uma parcela restrita de pacientes tem indicação de uso prolongado, como refluxo grave, esôfago de Barrett ou já sofreu complicações por úlcera.
Essas situações exigem acompanhamento constante, já que a suspensão indevida pode agravar o quadro e causar inflamações ou estreitamentos no esôfago.
Por que o remédio virou alvo de debate?
A revisão sobre o uso do omeprazol não é algo recente, lembra Jerônimo De Conto Oliveira. Segundo ele, a discussão começou há cerca de 10 anos, quando um estudo sugeriu possível associação entre o uso prolongado dos chamados “prazóis” e casos de demência.
— Na época, o tema ganhou muita repercussão e fez os médicos voltarem a revisar as indicações de uso — recorda o gastroenterologista.
Desde então, novas pesquisas mostram que o consumo contínuo pode interferir na absorção de micronutrientes como ferro, cálcio e vitamina B12.
— Hoje se aceita que o uso prolongado pode reduzir um pouco a absorção desses nutrientes. No caso da B12, o impacto é mais perceptível. Já o ferro e o cálcio só costumam ser afetados em pessoas que já têm deficiência prévia — explica Oliveira.
Mesmo assim, ele reforça que os possíveis efeitos adversos não anulam os benefícios do medicamento.
É importante dizer que, para a maioria dos pacientes, o benefício ainda supera o risco
JERÔNIMO DE CONTO OLIVEIRA
Gastroenterologista
Cuidados ao interromper o uso
Parar o omeprazol de forma abrupta, alerta o médico, pode gerar o chamado "efeito rebote": quando o corpo reage produzindo mais ácido do que antes.
— O estômago percebe a falta de ácido e estimula a produção por meio de um hormônio chamado gastrina. Se o remédio é interrompido de uma hora para outra, o ácido volta com força total por alguns dias — explica.
Para evitar o desconforto, ele recomenda duas estratégias: redução gradual da dose e o uso de antiácidos comuns, como hidróxido de magnésio ou de alumínio, nos dias seguintes à suspensão.
— Quem toma 20 miligramas (mg) duas vezes ao dia pode, passar a tomar uma vez ao dia. Depois, dia sim, dia não, até parar. Isso ajuda o corpo a se reequilibrar — orienta.
Para pessoas com sintomas leves ou esporádicos de azia, há opções mais simples e seguras.
— Em casos ocasionais, antiácidos de base de magnésio e alumínio funcionam bem. O próprio omeprazol pode ser usado de forma intermitente, apenas quando há maior risco de sintomas — explica o especialista.
Quando hábitos fazem diferença
Embora o remédio seja indispensável em alguns quadros, mudanças de rotina podem reduzir ou até eliminar a necessidade de usá-lo. Oliveira explica que pequenas atitudes no dia a dia já trazem alívio significativo.
— Evitar deitar logo após comer, reduzir alimentos gordurosos, deixar um intervalo de duas horas entre a última refeição e o sono e comer em menor volume são medidas simples que ajudam muito — orienta.
Segundo ele, observar o que desperta os sintomas também é fundamental.
— Café, chocolate e até o chimarrão podem causar azia em algumas pessoas, então vale identificar os gatilhos e ajustar o consumo — acrescenta o especialista.
O médico lembra ainda que o uso frequente de anti-inflamatórios, comuns para dores musculares e articulares, é uma das principais causas de lesões gástricas e motivo recorrente para o uso dos IBPs, como o omeprazol.
— Muitas vezes, a pessoa começa a tomar o anti-inflamatório e precisa do omeprazol para proteger o estômago. Se eliminarmos o uso abusivo do primeiro, talvez não precisemos tanto do segundo — observa.





