
Marta Pinheiro Ribeiro, 55 anos, maneja com destreza e precisão a navalha enquanto barbeia o rosto de um cliente. Com uniforme branco, a profissional executa o serviço instalada junto a uma das seis poltronas estofadas na cor azul-marinho do Salão Fígaro, na Rua General Câmara, no Centro Histórico de Porto Alegre.
Trata-se de uma tradicional barbearia com mais de 70 anos de existência. Marta é a única barbeira do espaço de 24 metros quadrados compartilhado com quatro colegas homens.
— Quando eu comecei, já faz 22 anos, tinha bastante preconceito. Os homens chegavam e diziam "ah, não quero fazer com ela". Falavam na minha cara assim. Mas agora, como estou há muitos anos, isso diminuiu muito. Porque conheceram o meu trabalho. Raramente acontece (o preconceito), mas ainda acontece — afirma Marta, que criou dois filhos com o dinheiro conquistado em meio às tesouradas.
Conforme a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo, a Capital conta com o registro de 8.439 empresas com serviços de barbearia, bem como de cabeleireiro, manicure e pedicure em geral. Dessas, 7.218 estão inscritas como Microempreendedores Individuais (MEIs). Não há dados sobre quantas barbeiras estariam em atividade.
O começo
Natural de Santa Rosa, na Região Noroeste, Marta vive desde criança na Capital. Começou no ofício tendo um salão feminino. Com o nascimento da filha precisou parar de atuar por algum tempo. Quando apareceu uma vaga no Salão Fígaro, ela candidatou-se e foi aceita. Na época, a irmã dela também trabalhava no local, mas saiu em 2023.
— Os colegas que me ensinaram a fazer barba. Eu não sabia, só sabia cortar cabelo — recorda.
Fichas numeradas para atendimento estão penduradas na parede perto da porta de entrada do salão. Nos balcões junto aos espelhos estão os aparelhos de cortar cabelo e aparar barba, navalhas, tesouras e outros itens utilizados para o trabalho. Como fica situado em um ponto movimentado, o vaivém de clientes é intenso. O corte custa R$ 35, e a barba sai por R$ 30.
A barbeira conta que os cortes de cabelo ainda lideram a maioria dos pedidos. Porém, como usar barba está na moda, Marta percebe o crescimento de gente preocupada em aparar e modelar os pelos do rosto. Em relação à receptividade dos clientes, ela não tem queixas, apenas elogios:
— Tenho clientes antigos que vai criando uma amizade. Clientes que eram crianças e agora são adultos. Agora faço a barba deles, antes só cortava o cabelo.
Orgulho do salão
Marta mostra-se orgulhosa por poder trabalhar em um salão tão conhecido e tradicional. Questionada sobre cenas inusitadas que já testemunhou, ela compartilha uma das mais comuns:
— Às vezes, o cliente vem cortar o cabelo e o chefe chama. A pessoa sai com o cabelo de qualquer jeito e depois volta para terminar o corte.
O encontro entre amigos que cortam o cabelo no mesmo local, mas até então não sabiam disso, também é outra situação frequente. Conforme a barbeira, que tornou-se sócia do salão há três anos, o público mais fiel é composto por pessoas mais idosas e por gente que trabalha nas imediações.
Marta entra no campos das relações interpessoais quando reflete sobre as necessidades para atuar nesse meio.
— Não tem curso para a gente aprender a tratar o cliente. Isso não existe. E é isso o que tu aprendes com o tempo: como se portar e tratar o cliente. Ter uma relação de confiança — ensina.
Tenho clientes antigos que vai criando uma amizade. Clientes que eram crianças e agora são adultos. Agora faço a barba deles, antes só cortava o cabelo.
MARTA PINHEIRO RIBEIRO
Barbeira
Marta afirma que jamais foi desrespeitada por algum cliente e dá um conselho para quem está começando na profissão.
— Eu vejo nas outras barbearias que eles (barbeiros) largam todo mundo igual, com aquele corte baixo, topetão lá em cima e aquela barba comprida. Acho que é preciso saber o que o cliente quer, e não o que tu achas que está na moda — conclui.
Elogios de colegas e clientes
O barbeiro Dione Luis Fontoura, 53, é o outro sócio do salão. Há 37 anos no ofício, ele interpreta o cenário com mais mulheres como uma evolução tranquila.
— Passamos mais tempo junto com os colegas do que com a própria família. Temos um ambiente bom — analisa.
Para Fontoura, a tendência é a ampliação de mulheres nas barbearias.
— O profissional que se capacita só tem a ganhar — diz.
No dia em que Zero Hora acompanhou Marta em ação, o comerciante Everton Mendes, 66, fez a barba com ela.
— Antigamente, era só homem que frequentava um barbeiro, ou só homem que cortava. Hoje, tu tens o sexo feminino cortando e usando também — observa Mendes.
E, após o resultado do serviço, não poupa elogios a barbeira:
— A Marta tem as mãos maravilhosas. Me fez até dormir.




