
Incluída na investigação da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) sobre as alterações no cheiro e no sabor da água em Porto Alegre, que perduram por quase dois meses, a Cettraliq, empresa privada de tratamento de resíduos localizada no bairro Navegantes que despeja o resultado do processo na rede pluvial, não é apenas mais uma, na visão da secretária do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Ana Pellini. Por ser a única habilitada a fazer esse tipo de serviço na Capital, a atuação da companhia é considerada necessária pelo órgão, "sob pena de criar um problema maior":
– Temos uma certa dependência. A Cettraliq trata efluentes de muitas empresas pequenas. Ficamos muito em cima deles, mas temos um olhar especial, porque precisamos que façam esse trabalho – diz a titular do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
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Segundo Ana Pellini, a companhia autorizada a despejar parte dos efluentes tratados na casa de bombas da Trensurb, onde foi encontrada grande quantidade de uma bactéria que pode ter relação com as mudanças na qualidade da água, deverá aprimorar o tratamento de resíduos a partir da semana que vem. A pedido da Fepam, terá de utilizar um filtro de ozônio no fim do processo para eliminar possíveis bactérias que possam estar chegando à rede pluvial.
A medida, conforme o órgão, foi tomada por "precaução", uma vez que os resultados das análises encomendadas a um laboratório paulista que podem indicar se há relação entre a atividade da empresa e as alterações na água só devem ficar prontas na segunda-feira. Caso os resultados mostrem que a empresa, que já foi autuada pela Fepam em pelo menos duas oportunidades, tem relação com o problema no abastecimento, a Cettraliq será multada e receberá as sanções cabíveis, segundo a secretária.
Localizada a cerca de dois quilômetros de um ponto de captação de água do Guaíba, a companhia trata efluentes líquidos de mais de 1,5 mil clientes – entre metalúrgicas, curtumes, universidades, fábrica de tintas, revendedoras de combustíveis e indústrias química, farmacêutica e calçadista –, entrou na rota de investigações sobre o problema da água na Capital. Desde o começo das investigações, no mês passado, foi a primeira vez que a Fepam admitiu abertamente estar investigando a empresa.
Filtro de ozônio pode amenizar problema
Embora seja uma alternativa mais aprimorada ao tratamento convencional, já que possui capacidade de degradar moléculas mais resistentes, o filtro de ozônio não é um elemento obrigatório para companhias que realizam esse tipo de serviço. Para especialistas, se bem empregado, ele pode ser uma saída para eliminar bactérias que possam estar influenciando na qualidade da água.
– O ozonizador tem capacidade de dissolver bastante compostos químicos e micro-organismos. Algum tipo de melhoria deve apresentar – disse o pesquisador Fernando Spilki, professor da Feevale.
Spilki explica que, apesar de não ser a configuração ideal, o fato de poucas empresas realizarem tratamento de efluentes, condicionando os órgãos de fiscalização a insistirem em saídas diplomáticas, é comum no Brasil. A professora de gerenciamento de efluentes líquidos industriais da UFRGS Liliana Féris não considera a situação problemática, desde que o local seja monitorado "de perto" pelo poder público.
– Essa empresa tem um tratamento que pode não estar sendo 100% eficiente, mas o impacto do descarte direto causaria muito mais problemas. É uma questão difícil. Tem que cumprir a legislação, e a do RS é mais restritiva do que muitas do Brasil. Isso dá um certo alento – diz.
Procurado pela reportagem, o Ministério Público, que abriu inquérito civil para acompanhar as ações do poder público em relação às alterações na água, não quis comentar as declarações da secretária. No começo da semana, o órgão informou que, além da Cettraliq, outras companhias que lançam resíduos no Guaíba poderão ser avaliadas. Segundo a Secretaria Municipal do Meio Ambiente, o número passa dos 300.