
O ex-presidente Jair Bolsonaro negou que tenha tentado fugir do país e descumprido medidas cautelares. A explicação foi entregue pela defesa ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes na noite de sexta-feira (22).
A medida atendeu a determinação de Moraes que, na quarta (20), deu prazo de 48 horas para a manifestação. A decisão de Moraes ocorreu após a Polícia Federal (PF) indiciar o ex-presidente e o filho Eduardo Bolsonaro (PL-SP), deputado federal que está nos Estados Unidos.
Foram atribuídos aos dois os crimes de coação no curso do processo e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
Os delitos teriam sido cometidos porque eles teriam atuado para interferir na ação penal que trata da trama golpista, na qual o ex-presidente é réu e será julgado em setembro.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) terá o mesmo período de 48 horas para se manifestar sobre os apontamentos da PF e as justificativas apresentadas pela defesa do ex-presidente. De acordo com o Estadão, membros da PGR afirmam que o prazo deverá contar a partir de segunda-feira (25).
A decisão sobre as medidas a serem adotadas contra Bolsonaro ficará com Moraes. Na peça apresentada nesta sexta, a defesa pediu a reconsideração da decisão que determinou sua prisão domiciliar em 4 de agosto. Além da prisão domiciliar, Bolsonaro está usando tornozeleira eletrônica desde o dia 18 de julho.
Quais os próximos passos
Após a manifestação da PGR, Moraes poderá decidir sobre a manutenção ou não das atuais medidas cautelares contra Bolsonaro. O ex-presidente pode, por exemplo, ser retirado da prisão domiciliar e ir para o regime fechado, conforme o colunista de Zero Hora Humberto Trezzi.
A decisão seria baseada no risco de fuga e a tentativa de interferir na ação penal da trama golpista, cujo julgamento começa em 2 de setembro.
O ex-presidente poderia ser levado para três locais:
- Quartel, por capitão da reserva do Exército
- Ala dos vulneráveis no presídio da Papuda, em Brasília — local destinado a presos ilustres ou que sofrem algum tipo de ameaça
- Cela da Polícia Federal
Confira ponto a ponto da defesa de Bolsonaro
Com base na petição apresentada, os advogados de Jair Bolsonaro utilizaram os seguintes argumentos para defendê-lo das alegações da PF:
Inexistência de plano de fuga
A defesa argumenta que um rascunho de pedido de asilo político, direcionado ao presidente da Argentina, Javier Milei, datado de fevereiro de 2024 e encontrado em seu celular, não pode ser considerado um indício de um plano de fuga. Eles ressaltam que o documento é antigo, não se materializou e que o ex-presidente obedeceu a todas as ordens judiciais, incluindo a proibição de viajar para o exterior.
Ausência de contato com Braga Netto
Os advogados afirmam que Bolsonaro apenas recebeu uma mensagem de texto (SMS) de um número atribuído ao general Walter Souza Braga Netto, mas não houve resposta, telefonema ou qualquer outra forma de interação.
Portanto, argumentam que o simples recebimento de uma mensagem, sem qualquer reação, não configura quebra da proibição de contato.
Legalidade da conversa com advogado americano
As mensagens trocadas com o advogado norte-americano Martin de Luca são, segundo a defesa, anteriores às medidas cautelares. Além disso, não havia proibição de contato com o advogado, que não é investigado, e a conversa tratava de aconselhamento jurídico para uma nota pública, o que não configuraria uma atividade ilegal.
Uso permitido do WhatsApp
A defesa sustenta que Jair Bolsonaro nunca foi proibido de usar o WhatsApp para se comunicar ou se manifestar, pois as restrições se aplicavam a redes sociais. Eles diferenciam o WhatsApp, um aplicativo de mensagens privadas, das redes sociais, que possuem algoritmos e um design para a construção de relações virtuais públicas.
Conversas com o filho antes da proibição
As conversas do ex-presidente com seu filho Eduardo Bolsonaro ocorreram antes da decisão judicial que proibiu o contato entre eles, segundo os advogados. A defesa enfatiza que o diálogo foi encerrado assim que a proibição foi imposta, o que demonstraria obediência às ordens da Suprema Corte.
Acusação de "Lawfare"
A defesa classifica o relatório da Polícia Federal como uma "peça política" e uma "manifestação de lawfare", que seria o uso estratégico de processos legais para intimidar um oponente. Eles alegam que o objetivo do relatório é desmoralizar o ex-presidente, expondo sua vida privada e acusando-o de fatos graves, porém descabidos, como a divulgação de conversas privadas que não teriam relevância para a investigação.
Veja a íntegra da resposta da defesa de Jair Bolsonaro
Risco de fuga
O relatório da PF aponta que foi encontrado um documento no celular do ex-presidente com um pedido de asilo político ao presidente da Argentina, Javier Milei.

O documento de 33 páginas foi modificação em fevereiro de 2024 pela última vez.
Transferência de recursos
Entre os principais elementos probatórios citados pela PF estão as transferências de recursos realizadas por Jair Bolsonaro a Eduardo Bolsonaro, que vive nos Estados Unidos desde fevereiro.
O parlamentar tem se reunido com integrantes do governo Trump com o objetivo de promover sanções contra autoridades brasileiras. Segundo o relatório, o ex-presidente teria atuado para "apoiar financeiramente as ações do parlamentar licenciado no Exterior".
Troca de mensagens
O relatório da PF menciona ainda mensagens trocadas entre Jair Bolsonaro, Eduardo Bolsonaro e o pastor Silas Malafaia, também investigado. Em uma das mensagens, o deputado relata reuniões e informa, em julho, que a aplicação da “Lei Magnitsky contra Moraes está muito próxima”.
A Lei Magnitsky prevê sanções econômicas, como o bloqueio de contas bancárias e bens vinculados ao sistema financeiro norte-americano.
Em outra mensagem, Eduardo Bolsonaro afirma que, caso fosse aprovada no Congresso uma “anistia light”, o apoio do governo Trump ao ex-presidente seria retirado. O deputado referia-se à possibilidade de aprovação de um projeto de anistia que contemplasse apenas os executores dos atos golpistas de 8 de janeiro, excluindo o ex-presidente e outros acusados de serem os organizadores.
O relatório da PF conclui que “os investigados atuaram com consciência e vontade no intuito de convencer autoridades governamentais estrangeiras para aplicar sanções contra o Brasil e autoridades nacionais constituídas, de forma a satisfazer interesses pessoais ilícitos, qual seja, garantir a impunidade decorrente de uma eventual condenação criminal”.
Também foram identificadas mensagens entre Jair Bolsonaro e o advogado Martin De Luca, representante da empresa Rumble e da Trump Media & Technology Group em um processo judicial nos Estados Unidos contra o ministro Alexandre de Moraes. O ex-presidente solicita orientação para redigir uma mensagem sobre tarifas impostas ao Brasil pelo governo Trump. De Luca também teria enviado a Bolsonaro uma petição complementar apresentada no referido processo, ainda em tramitação.
Segundo a PF, o diálogo entre Bolsonaro e De Luca “demonstra que o ex-presidente atua de forma subordinada a interesses de agentes estrangeiros, em alinhamento previamente condicionado ao atendimento de pretensões dissociadas do interesse nacional, direcionadas a vulnerar a independência dos poderes constituídos, especialmente o Poder Judiciário, por meio de atos de coação ao seu órgão de cúpula, e à soberania nacional”.



